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Os donos da Nova Economia

Autor original: Maurício Jun Handa

Seção original: Artigos de opinião

Emir Sader*


Uma das maiores lições do século XX, com os massacres das duas grandes guerras e com a bomba de Hiroshima e Nagasaki, é que o papel da tecnologia depende de quem a use e para que. Por si só, ela não é boa ou má.


Não se deveria portanto ter ilusões sobre as grandes transformações sociais que as novas tecnologias da comunicação poderiam introduzir nas nossas sociedades. Tudo depende de quem se apropria delas. A invenção da luz elétrica, por exemplo, não significou imediatamente bem estar para a população (até hoje 20% da população rural brasileira, por exemplo, não tem luz elétrica). Significou introdução da jornada noturna de trabalho e não dava para pôr a culpa em Thomas Edison, mas em que se apropriou da tecnologia e a usou para maximizar seus lucros.


No caso dessas novas tecnologias, menos de dez corporações gigantes transmitem dois mil programas de televisão para a América Latina através de 130 canais por mais de 25 satélites de comunicação, a um preço irrecusável para uma empresa privada. Mais de dez mil operadoras de sistemas a cabo de fibras óticas no continente distribuem esses sinais, oferecidos como pacotes de entre 40 e 50 canais de 24 horas. Isso tudo faz parte de um mercado global operado pelas novas tecnologias da informação.


Esse sistema é extremamente concentrado na emissão; os países da periferia do capitalismo, que representam 85% da população do mundo, só têm acesso a 15% dos meios de informação e a 6% das linhas telefônicas. Já os países do centro do capitalismo, que constituem 15% da população mundial, reúnem 70% do Produto Interno bruto global e 90% dos bens e serviços de informação. Além disso, operam as mais importantes redes integradas de sistemas digitais, contam com os maiores bancos e bases de dados e organizam os sistemas de transmissão celular do futuro. Tudo isso, num marco de acelerada integração financeira no campo das comunicações.


As condições técnicas para uma grande revolução educacional parecem dadas. Porém, os que a necessitam não coincidem com os que detêm grandes fortunas, para consumir os novos e sofisticados produtos. Assim, na periferia capitalista existem um bilhão e duzentos milhões de analfabetos e um bilhão e quinhentos milhões de sub-escolarizados, isto é, praticamente um em cada três pessoas no mundo, mesmo que tivesse condições de ter acesso às novas tecnologias, não estariam preparada para fazê-lo. O mesmo aconteceria com os 900 milhões de desempregados e o um bilhão abaixo da linha da pobreza.


Adeus ao desenvolvimento


Enquanto isso, os governos da periferia do capitalismo abandonam qualquer tipo de projeto de desenvolvimento, de pesquisa, de revolução educacional dos nossos povos, entregando nossos estados a um processo de profunda financeirização. Renuncia-se a que possamos usufruir conquistas tecnológicas fruto da criação dos técnicos, baseados na experiência dos trabalhadores e não na especulação financeira, que corrói nossas sociedades por dentro, impedindo-nos do acesso à tecnologia e ao progresso.


* Cientista político, professor da USP e da UFRJ.







A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.





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