Autor original: Flavia Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Cerca de 2,9 milhões de crianças entre 5 e 14 anos dedicam seu tempo ao trabalho no campo ou na cidade. Mais da metade deste contingente está no meio rural. Um dos instrumentos criados para mudar essa situação é o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), que destina uma bolsa mensal no valor de R$25 para que as famílias mantenham seus filhos na escola. O problema é que a bolsa só é válida até os 15 anos, idade em que o jovem deveria estar concluindo o ensino fundamental. Na prática, isso dificilmente acontece: as crianças do campo, por exemplo, costumam iniciar os estudos tardiamente, a partir dos 9 anos e não conseguem concluir o ensino fundamental aos 15.
O principal espaço de discussão do Peti é o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, formado por membros do governo, centrais sindicais, ongs e Ministério Público. No último encontro, realizado em outubro, em Salvador, o fórum debateu a necessidade de aumentar o limite de idade da bolsa oferecida pelo Peti para 17 anos, para que os jovens possam concluir os estudos antes de retornarem ao trabalho. O assunto, que começou a ser discutido em Salvador, também vinha sendo motivo de reuniões da Comissão Tripartite, composta por representantes dos trabalhadores, governo e empresários.
"A maioria dos membros do fórum acredita que a idade deve ser estendida. No entanto, a Secretaria de Estado e Ação Social não pensa da mesma forma. Esperamos que esse comportamento possa mudar a partir de constatações atuais, como por exemplo, o fato de que na região do sisal existem mais de 5 mil crianças fora do programa. Além disso, na produção da cana-de-açúcar, em Pernambuco, 21 mil crianças não receberão mais o auxílio a partir de dezembro", explica o assessor de políticas sociais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Luiz Gonzaga de Araújo. Segundo Maria da Graça Amorim, secretária de política social do Contag, o governo exclui as crianças do programa justamente no momento em que estão mais suscetíveis ao envolvimento com drogas, álcool e prostituição.
Um dos impasses encontrados nas reuniões da Comissão Tripartite é o fato de os empresários não concordarem com a inclusão, entre as piores formas de trabalho infantil, do plantio de cana-de-açúcar e de fumo e da colheita de laranja. "Todas as formas de trabalho rural são danosas para crianças, pelo manuseio e contato com defensivos agrícolas e mesmo o trabalho pesado que envolvem. No caso da colheita da laranja, os meninos e meninas perdem as impressões digitais e têm problemas respiratórios", afirma Luiz Gonzaga.
Na segunda-feira passada, dia 6, durante uma reunião em Brasília, foram suspensos temporariamente os trabalhos da Comissão Tripartite.O motivo foi a impossibilidade de superar o impasse criado pelos representantes dos patrões. Uma alternativa para manter o assunto em pauta foi a formação de um grupo de trabalho constituído por representantes dos trabalhadores, do patronato e do Ministério do Trabalho para estudar o impacto destas atividades sobre a saúde dos trabalhadores, em especial sobre as crianças. A idéia foi do próprio Luiz Gonzaga. Segundo ele, "o patronato está irredutível e não havia como avançar senão criando o grupo de trabalho, que vai oferecer subsídios para a decisão da Comissão"
O Peti foi criado em 1996, a partir de uma série de discussões sobre os problemas identificados nas carvoarias do Mato Grosso do Sul, sisal na Bahia e cana-de-açúcar em Pernambuco. Atualmente, o programa está presente em 27 estados brasileiros.
"O Peti por si não constitui o principal instrumento para a erradicação do trabalho infantil. Outras políticas como reforma agrária e o crédito para a agricultura familiar também precisam ser efetivados pelo governo", conclui Luiz Gonzaga.
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