Você está aqui

Pesquisa do Iser revela estatísticas da solidariedade do brasileiro

Autor original: Felipe Frisch

Seção original: Novidades do Terceiro Setor






Às vésperas do Ano Internacional do Voluntariado, uma pesquisa coordenada pela antropóloga Leilah Landim e pela socióloga Maria Celi Scalon revela algumas surpresas: 50% da população brasileira faz algum tipo de doação (de bens ou dinheiro) para instituições, enquanto são 22,6% os que doam parte do seu tempo para ações voluntárias, seja dentro de instituições ou em atuação independente.


O resultado completo da pesquisa está no livro lançado no último dia 14, "Doações e trabalho voluntário no Brasil". Realizado durante o ano de 98, o projeto é continuação de um trabalho mais amplo desenvolvido pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser), sobre Filantropia e Cidadania no Brasil, e tem o objetivo de conhecer o universo da ação social privada no país. Além disso, faz parte de uma iniciativa da Universidade Johns Hopkins (Baltimore, EUA), que pretende comparar os resultados obtidos aqui com os de outros países. Os dados foram colhidos pelo Ibope, através de um questionário baseado no modelo da universidade americana.


A pesquisa leva em conta indivíduos acima dos 18 anos e moradores de cidades com mais de 10 mil habitantes. Ou seja, esses 50% da população que têm por hábito doar algum tipo de bem material, correspondem a 44,2 milhões de pessoas - o equivalente à população da África do Sul. Desses, 29% doam apenas bens - alimentos em grande parte -, enquanto os 21% restantes chegam a somar cerca de R$ 1,703 bilhões em volume de doações, com uma média individual de R$ 158 ao ano. Note-se que esses números levam em conta as doações feitas a entidades. Se forem levadas em conta as doações feitas diretamente a pessoas, sem passar pelas instituições, o número chega a quase 70 milhões de indivíduos que fazem doações.


- Não dá para dizer se isto é muito ou pouco. Em outros países, em média 28% da população está envolvida em trabalho voluntário, enquanto aqui a média é de 22%, mas em contextos completamente diferentes. Se você pensar que na sociedade brasileira não há incentivo fiscal, e que, da parcela da população com renda familiar de até um salário mínimo, 8% fazem algum tipo de doação, os dados são surpreendentes - explica uma das coordenadoras da pesquisa, Leilah Landim, que lembra também que é a primeira vez que uma pesquisa com este foco é realizada em âmbito nacional no Brasil.


Da população com renda familiar entre um e dois salários, 13% doam dinheiro para instituições. E a surpresa, neste caso, fica por conta dos valores doados: em média, 3,6% da renda mensal desta população. Proporcionalmente, este segmento doa muito mais do que aqueles que recebem acima de 20 salários. Para estes, a parcela doada não ultrapassa 0,8% da sua renda. Em termos absolutos, 65% das doações brasileiras são de menos de R$ 100 anuais, das quais 41% são de menos de R$ 20, enquanto as doações acima de R$ 500 somam apenas 4%. Em suma: quem ganha menos doa mais.


Quanto à forma da pesquisa, Leilah esclarece que a estrutura do questionário foi baseada em questões abertas como "para qual instituição", "quantas horas", "que bens" e "quanto dinheiro foi doado no último ano", além de idade, escolaridade, religião, sexo e renda. Depois, os organizadores trataram de classificar cada ítem, para estabelecer os valores em percentuais. O objetivo é traçar o perfil do doador e quais as variáveis que influem na propensão dos indivíduos a doar.


- Tomamos todo o cuidado para deixar a pergunta aberta. Por exemplo, nós não perguntamos se a pessoa "faz trabalho voluntário". Muitas vezes, a pessoa faz, mas não o identifica como tal - revela Leilah, considerando as inúmeras ações de assistência, ou ligadas a práticas religiosas, que as pessoas desenvolvem cotidianamente sem se intitularem "voluntárias".


De um modo geral, a obra constata a sobrevivência de uma "cultura estatizante" no Brasil, que deixa pouco espaço para o reconhecimento de uma ação privada com finalidade pública. Ou seja, se por um lado, é importante que as pessoas atuem, por outro, o Estado deve fazer a sua parte. E isso não é negativo, lembra Leilah:


- Eu veria de forma muito negativa se essa pesquisa, e a atuação de voluntários e de gente doando bens, levasse as pessoas a pensarem que estão substituindo políticas públicas. A pesquisa tem que ser vista pela lógica da política social. Precisamos estimular a cidadania e os direitos, que não podem esperar o Estado atuar sozinho. A idéia é "dar com uma mão e cobrar o Estado com a outra", como o Betinho dizia na Campanha contra a Fome e a Miséria pela Vida - conclui.


Contatos:


Iser - Instituto de Estudos da Religião
http://www.iser.org.br

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer