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Dengue e Qualidade de Vida

Autor original: Graciela Baroni Selaimen

Seção original: Artigos de opinião

Sérgio de Mattos Fonseca*


Masculino ou feminino, o mosquito transmite a(o) dengue inconsciente da celeuma que vem provocando a sua suave picada. Autoridades revezam-se em anúncios e pronunciamentos oficiais, ora buscando tranqüilizar a população, ora culpando-a por deixar acumular água e facilitando a incubação dos futuros mosquitos. A população cada vez mais convive com a ignorância e a desinformação, assiste atônita o aumento da epidemia (agora com o vírus tipo III, aquele contra o qual o nosso organismo não possui defesas) - igualmente como está a cidadania em relação às políticas de saúde pública e meio ambiente: indefesa.


O principal indicador mundial de qualidade de vida: o Índice de Desenvolvimento Humano, ou IDH - M restringindo-se aos municípios, resulta apenas do conjunto de três expressões:



  • a longevidade medida pela expectativa de vida ao nascer;

  • os níveis educacionais, medidos pela combinação da taxa de analfabetismo da população de 15 anos e mais, com peso 2/3, e do número médio de anos de estudo da população de 25 anos e mais, com peso 1/3;

  • a renda medida pela RFPC - renda familiar per capita média ajustada - expressa em salários mínimos de setembro de 1991.

Não inclui assim quaisquer variáveis ambientais, certamente relevantes para o desenvolvimento humano e das demais espécies, uma vez que longevidade, nível educacional e de rendimento, certamente não serão expressos por indicador ou números confiáveis sem que sejam refletidos na qualidade do ambiente urbano e natural. Ao constatar a diminuição do espelho d'água das lagoas, através do aterramento e disposição de esgotos em suas margens, do desmatamento das encostas e dos parques estaduais e municipais, certamente observa-se que esses ambientes não contribuiriam positivamente para o IDH de qualquer município. Está longe de expressar qualidade de vida um índice que não incorpora qualquer variável ambiental, como se o desenvolvimento da espécie humana possa ser avaliado independente da biodiversidade em seus ecossistemas, natural ou urbano.


Certamente a transformação de nossas lagoas em depósitos de esgotos a céu aberto e a especulação imobiliária provocando o desmatamento na mata atlântica, contribuem muito mais para a proliferação de uma epidemia de dengue no estado do Rio de Janeiro, do que a água acumulada em pneus, vasos de plantas, ou em barcos de pescadores, como sugerem as autoridades e campanhas governamentais, desviando o foco da questão principal. É nos rios, lagoas, valões e esgotos a céu aberto, na mata atlântica derrubada que proliferam em grande quantidade as larvas dos mosquitos, por obra das alterações antrópicas nos ecossistemas. Espargir veneno no ambiente é um paliativo imediatista que pode contribuir ao contrário, com o agravamento da situação, poluindo mais ainda e estendendo a morte aos predadores naturais do mosquito.


A solução efetiva vem a médio e longo prazo com a renaturalização dos ecossistemas impactados, recompondo os manguezais da orla das lagoas, reflorestando as áreas de mata atlântica destruídas e, principalmente, implantando um sistema eficaz de tratamento terciário de esgoto e demais efluentes, diminuindo ou minimizando o impacto das atividades antrópicas no meio ambiente, na busca de uma melhor qualidade e relacionamento entre as atuais gerações e os ecossistemas.


* Sérgio de Mattos Fonseca, mestrando do Programa de Pós - Graduação em Ciência Ambiental da Universidade Federal Fluminense, diretor da APREC Ecossistemas Costeiros, Professor Convidado da Universidade Cândido Mendes e da IBMEC Business School, especialista em Valoração Econômica - Ecológica de Impactos Ambientais e de Ecossistemas Costeiros Tropicais, com diversos artigos publicados. aprec@nitnet.com.br

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