Por: Salvador Soler* - Ciente de que Pernambuco é um dos Estados que detém maiores indicadores de mortes violentas, o Unicef reconhece importantes esforços para mudar essa situação por parte do governo do Estado e da sociedade. Não podemos, no entanto, esquecer que a situação é ainda muito grave, e que mais pessoas devem ser envolvidas nesse esforço. Ainda há entre nós uma cultura de tolerância à violência, que se manifesta no comportamento de famílias quando adotam a violência física como meio de educação de seus filhos ou entre grupos de crianças e adolescentes que tentam resolver suas desavenças a socos e pontapés, ou entre torcidas rivais, ou na violência entre crianças ou adolescentes nas escolas, ou ainda nos trotes selvagens em universidades. Toda essa violência pode ter seu deságue final na morte por assassinato, de uma forma indiscriminada, só porque alguém se deixou levar por ira irracional. Para que a cultura de violência não chegue ao seu ápice, com a banalização do assassinato, é preciso trabalhar tão logo ela se manifeste, não deixando que a violência seja aceita nem tolerada de forma que a deixemos passar como se nada houvesse acontecido.Uma forma de engajamento nessa luta é a notificação de violências. Esse sistema é um instrumento legal previsto em lei, cuja finalidade é a proteção da pessoa. O instituto da notificação também está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, especificamente para proteger a integridade de crianças e de adolescentes que estejam sofrendo violência de qualquer tipo, ou mesmo sendo ameaçadas de violência. A notificação é um ato obrigatório do agente público quando percebe que a criança ou o adolescente, que tem diante se si, está sendo vítima de violência. A lei exige inclusive que sejam notificadas suspeitas. A tolerância da lei contra a violência é absolutamente nenhuma.O Unicef realizou, em parceria com o Centro dom Helder Câmara (Cendhec), as prefeituras do Recife, de Jaboatão e Olinda e o governo do Estado, um trabalho cujo título é Saber notificar para bem cuidar, que visa aprimorar o sistema de notificação de violência nesses municípios. Representações dos Conselhos de Direitos e dos Conselhos Tutelares dos também participaram da ação. Como primeiros resultados dessa integração de esforços, duas questões aparecem como pontos a serem superados: a necessidade de fortalecer e expandir as atividades integradas dos diferentes organismos que trabalham tanto a notificação como suas consequências e a garantia da segurança dos que analisam e atuam nos encaminhamentos das notificações de violências. As prefeituras envolvidas estão tomando providências institucionais para solucionar esses entraves de forma que, ao final deste mês, um seminário de estudos permita compartilhar o que foi realizado e seus resultados iniciais. Para que esse esforço institucional produza resultados permanentes é necessário o compromisso dos agentes públicos, seja médico, enfermeiro, agente comunitário de saúde, professor, monitor, entre outros, para evitar que uma criança ou adolescente sofra violência. O relatório mundial sobre o tema, elaborado pelas Nações Unidas em 2005, termina com um apelo geral: nenhuma violência contra uma criança ou adolescente é admissível.A cultura de paz é bem concreta: tem lugar e hora para ser praticada, não depende de programações ou de instituições públicas, depende de cada pessoa ali onde ela está. Por isso, cuidar das crianças e dos adolescentes e combater o nível alto de homicídios implica práticas cotidianas contra a violência - inclusive através da notificação de violências. Dedico este artigo à memória de Alcides do Nascimento Lins, estudante de Biomedicina da UFPE, assassinado no Recife no dia 5 de fevereiro último.*Salvador Soler é coordenador do escritório do Unicef em Recife para os Estados de AL, PB e PE.Fonte: Jornal do Commércio, Página Opinião, publicado em em 17.03.2010Site: http://rsdsgajop.blogspot.com/2010/03/notificar-para-bem-cuidar.html.
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