Você está aqui

Fabricando Sorrisos

Autor original: Daniela Muzi

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor








Era um vez um menino. Seu nome pode ser João. Ele tinha 14 anos e morava na cidade de Jijoca, interior do Ceará. João tinha lábio leporino – uma deformidade facial que faz com o lábio se separe. A fenda no lábio de João era de aproximadamente cinco centímetros – é só fazer o sinal de paz e amor com os dedos e colocar em frente ao lábio superior: a distância entre os dois dedos era o espaço aberto dos lábios de João. Por conta disso, João não saía de casa, não brincava com as outras crianças, não ia para escola, não falava com quase ninguém. Ficava o dia todo preso dentro de um quartinho, pois a sua mãe tinha vergonha de que as pessoas o vissem. Como o banheiro do lugar onde morava era comunitário, ele só podia usá-lo à noite, quando sua mãe permitia que ele saísse. João tinha que ficar o dia todo se controlando até chegar a hora de ir ao banheiro. Isso lhe causou vários problemas. Um dia, um vendedor de gás de Jijoca, indignado com a situação do menino, o seqüestrou e o levou para o hospital. Na época, estava na cidade a equipe de médicos da Operation Smile, uma ONG de atuação internacional em 28 países que cuida de crianças com deformidades faciais. E eles operaram o João.


Nesta ocasião, o dentista e ortodontista Marco Antônio Botelho era apenas o tradutor dos médicos da ONG americana e traduziu a triste história que o entregador de gás contava sobre o menino João. Nesse dia, Marco Antônio prometeu para si mesmo que, enquanto pudesse, ajudaria as crianças que sofrem dessas deformidades.


A Operation Smile atuava no Ceará desde 1996, mas, devido a um desentendimento burocrático em 2000, deixou de visitar o estado e passou a atender as crianças de Natal. Foi a oportunidade de Marco Antônio Botelho fundar a ONG Oficina do Sorriso e continuar a assistir as outras 15 mil pessoas do Ceará que, assim como João, sofrem com deformidades faciais.


No dia 26 de maio deste ano, foi fundada a Oficina do Sorriso. Um projeto que visa ao atendimento de crianças de até 12 anos com deformidades faciais congênitas ou não – a ONG também atende crianças vítimas de acidentes, queimaduras etc. – por meio de ações que proporcionem melhor qualidade de vida no aspecto físico, social e psicológico. Para isso a ONG conta com 46 voluntários, entre eles psicólogos, dentistas, fonaudiólogos, fisioterapeutas, terapeuta ocupacional, médicos, artistas plásticos e advogados.


“A nossa ONG é como um oficina de carro mesmo. A criança que chega até aqui passa por um revisão completa. Além de cuidarmos da parte externa da criança, cuidamos do seu interior, do emocional. As crianças que possuem fissura palatal (isto é: têm o céu da boca aberto) sofrem graves problemas com a ingestão de alimentos. Por causa dessa abertura na boca, a comida muitas vezes entra em outros canais, como o nariz ou o ouvido, causando otite ou desnutrição”.


A Oficina do Sorriso, que funciona na própria clínica do Dr. Marco Botelho, atende somente as pessoas carentes. As consultas são realizadas aos sábados e a prioridade é realizar as cirurgias em crianças de até 6 anos. Marco Antônio justifica: “Quanto antes operarmos essa crianças, menos ela irão sofrer e mais rapidamente terão uma vida normal”.


As crianças com deformidades faciais são verdadeiras vítimas sociais. Segundo Marco Antônio, elas sofrem rejeição de todos os lados: dos pais, dos colegas da escola, das pessoas na rua. “O pai de um menino que nós atendemos aqui na Oficina veio me agradecer emocionado, dizendo que eu era a primeira pessoa a apertar a mão do filho dele”, relembra Marco.


Segundo Marco Antônio, os hospitais públicos do Brasil não conseguem atender todas essas crianças. As cirurgias de fissuras labial e/ou palatal são consideradas cirurgias eletivas, ou seja, não são emergenciais, pois os pacientes não correm risco de vida. “Realmente, os pacientes não sofrem risco de vida: eles não têm vida!”, reclama Marco Antônio.


Mas tudo isso ainda é só o começo. A Oficina do Sorriso, que completa um mês no próximo dia 26, já selecionou 12 pacientes que serão operados. O objetivo é atender 10 crianças por mês. No total, 120 crianças por ano, o mesmo número de crianças operadas pela Operation Smile. “O nosso objetivo maior é fazer essas crianças sorrirem e poderem ser bem recebidas na sociedade”.


A Oficina do Sorriso fica na Avenida dos Expedicionários, 392, em Benfica, Fortaleza, Ceará. Mais informações pelo telefone (85) 281-9101, pelo fax (85) 281-2324 ou pelo correio eletrônico oficinadosorriso@zipmail.com


Mais novidades


Os sorrisos não vão parar por aí. No dia 30 de agosto serão inaugurados o Centro de Pesquisa Dr. Bill Magee – com estudos e pesquisas na áreas de odontologia, fonoaudiologia, nutrição, fisioterapia, terapia ocupacional e psicologia, entre outras – e o Cento de Crescimento Facial James McNamara. O primeiro centro de estudos dos padrões brasileiros de crescimento facial.


“Todos os estudos já realizados são com os padrões americanos. Através desse estudo – inédito no Brasil –, será possível identificar padrões de anormalidade nas crianças com antecedência e diagnosticá-los com rapidez", explica Marco Antônio, que também é mestrando em Crescimento Facial na Universidade de Michigan.

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer