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Jongo da Serrinha pede passagem

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Novidades do Terceiro Setor

Quem tem um sonho não dança, dizia Cazuza. E, se tivesse conhecido o trabalho da ONG Associação Grupo Cultural Jongo da Serrinha, que completou um ano de vida no dia 24 de junho, o poeta veria que dançando – e cantando – se realizam sonhos. O lançamento do Projeto Cultural Jongo da Serrinha é a materialização de um deles. A partir do dia 2 de agosto, cem jovens da comunidade terão a chance de aprender, estudar e abrir novos horizontes.


A ONG é coordenada por Marcos André Carvalho, jornalista e músico que há sete anos trabalha com o Grupo Cultural, na comunidade da Serrinha, em Madureira. Com o tempo, surgiram a necessidade e a vontade de fazer mais do que divulgar o ritmo do jongo. Os próprios moradores desejavam um trabalho que afastasse das ruas as crianças e os jovens, combatesse a exclusão social e a violência.


Avaliada pela Unesco como uma das organizações não governamentais de melhor desempenho no trabalho de arte-educação com jovens de baixa renda, a entidade conseguiu um lugar para realizar suas atividades, no alto do morro. O prédio foi construído há poucos anos, durante o projeto Favela-Bairro, mas estava abandonado. "A Prefeitura quis fazer um projeto especial para a favela, que seria transformada em pólo cultural. Só que os espaços, depois de prontos, ficaram abandonados", diz Marcos. "Fizeram um teleférico que foi destruído e o prédio destinado a atividades de profissionalização de jovens estava abandonado e depredado. Então solicitamos à Secretaria Municipal de Habitação que nos cedesse o prédio para montar o centro cultural".


O termo de gestão foi assinado em 24 de junho, mesmo dia do aniversário da associação. O local vai sediar a Escola de Jongo, que obteve financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A verba já está liberada e deve ser repassada em breve pela Prefeitura. "No dia 2 de agosto, vamos começar as atividades", anima-se Marcos.


De segunda a sábado, de 7 às 18 horas, haverá aulas de jongo, ritmo e dança de orixás, capoeira angola e teatro (com um grupo de atores da Casa de Cultura Laura Alvim). O objetivo é educar e preparar jovens profissionais para o mercado artístico.


Mais adiante, serão implantados cursos de dança de salão, cavaquinho e violão. Também será feito um acompanhamento escolar, que é uma reivindicação dos moradores. Esses projetos, porém, ainda dependem de novo financiamento.


Além do BID e da Secretaria Municipal de Habitação, a associação tem como parceiros a Unesco, a Fase/Saap, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, a Associação de Moradores da Serrinha e a Escola de Samba Império Serrano.


A voz do morro sou eu mesmo


Marcos se entusiasma ao falar do trabalho. O grupo foi criado há 35 anos e reúne desde crianças até senhores de 80 anos. A Serrinha talvez seja o último foco de resistência do jongo, ritmo que veio de Angola para o Rio trazido pelos escravos e que se assemelha ao coco nordestino. "Havia núcleos de jongo em vários morros, mas a tradição foi se perdendo e só ficou o da Serrinha", conta Marcos. A favela é hoje um núcleo de preservação das tradições do jongo, da umbanda e do samba de raiz.


E não à toa. Madureira é um lugar único: a maior parte da população é negra e há três escolas de samba no bairro, entre elas o Império Serrano e a Portela.


O ritmo sobrevive graças à tradição oral: os mais velhos ensinam as canções às gerações seguintes. Mas a tradição vai ganhar em breve uma forcinha. Em agosto será lançado o CD Jongo da Serrinha. Ele virá acompanhado de um livro de 60 páginas, escrito pelo próprio Marcos, contando a história do ritmo no Brasil e reproduzindo as letras das canções que estarão no disco. "Eram músicas que estavam desaparecendo com a morte dos idosos", lamenta.


O projeto contou com o apoio do Museu da Imagem e do Som (MIS) e da Funarte. A tiragem inicial será de 3 mil cópias.


Só falta reunir a Zona Norte à Zona Sul


O recém-inaugurado centro cultural já abriga uma exposição permanente que reúne fotos de moradores e artistas da comunidade. A idéia é criar ainda um acervo de música e tradições populares. Marcos afirma: "Queremos que as pessoas tenham acesso ao folclore. Hoje o samba de raiz, por exemplo, está muito mais ao alcance dos universitários. Pretendemos trazê-lo para as comunidades".


Ele conta que as apresentações do grupo na Serrinha estão criando um cenário curioso: na base da favela, o estacionamento fica lotado de carros de gente vinda da Zona Sul. São os brancos subindo o morro para ver o jongo.


"Qualquer pessoa que tenha um sentimento de orgulho pelo país se sensibiliza com essas manifestações da cultura popular", diz Marcos. "Madureira viveu momentos de muita violência e a comunidade começou a perder um pouco da auto-estima, mas o jongo tem servido para os moradores recuperarem esse sentimento".


Mais informações sobre a Associação Grupo Cultural Jongo da Serrinha podem ser obtidas na Rua Visconde de Paranaguá, 37-A, em Santa Teresa, Rio de Janeiro, ou pelos telefones (21) 3852-0053, 3852-0043 e 9649-3823.

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