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Revolução e patentes

Autor original: Graciela Baroni Selaimen

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Hernani Dimantas

Hernani Dimantas*


A Nike fabrica seus produtos na Indonésia, China, e sei lá mais onde. Mas a marca e a patente do produto são revertidas automaticamente para os Estados Unidos. Qualquer radinho de pilha japonês, por mais mixuruca que seja, contém, pelo menos, 60% de patentes americanas. E assim os Estados Unidos, e outros países considerados do Primeiro Mundo, continuam crescendo e se desenvolvendo.


Os americanos são bons nisso. Investem em tecnologia de ponta e deixam para os pobres mortais, menos abastados, o encargo da industrialização. Eles ficam com a parte boa do negócio. Conseguiram reverter o processo e o trabalho maçante do operário padrão. Estão tranqüilos. Com menos poluição. Menos trabalho físico e menos horas trabalhadas, e com muito mais lazer. Sobra tempo até para contar e recontar os votos da Flórida. A estrutura é perfeita para a manutenção do estilo americano. Os interesses das empresas sobrepujam os dos cidadãos.


Tive a oportunidade de conversar com o Professor Lawrence Lessig a respeito do impacto dos códigos livres na indústria de software. Ele está muito atento aos problemas de patentes e sabe que será muito difícil para a sociedade globalizada enfrentar esse domínio da economia americana. Lessig encara o protecionismo das patentes de forma pessimista e acredita que seu detentores vão fazer o impossível para manter o status quo.


A batalha contra o Napster é prova disto. No começo a imprensa dizia que a RIAA - Recording Industry Association of America - não tinha um caso. Mas as distribuidoras fonográficas bateram forte, saíram para a luta e ganharam. O Napster vai ter que entrar na linha e pagar para funcionar. Não sei o que vai acontecer com o Freenet, o Gnutella e demais produtos que usam a tecnologia ponto a ponto. O contra ataque das gravadoras será violento. Os seus advogados não brincam em serviço.


O Brasil, algum tempo atrás, tentou patentear a diversidade da Floresta Amazônica. Não conseguimos driblar as feras do Primeiro Mundo. Não vão pagar nossos direitos legítimos de exploração da flora e da fauna. Mas pagaremos para ter os últimos lançamentos da indústria farmacêutica, mesmo quando os recursos biológicos utilizados forem provenientes da própria Amazônia. A Internet, através do poder das conversações, está apenas escancarando esse falso contrato. As patentes são o calcanhar de Aquiles da globalização. Definitivamente, ser refém de patentes internacionais não é solução viável para um desenvolvimento sustentado. Não se trata de uma batalha contra a Microsoft ou contra qualquer outra empresa. Devemos encarar que o gargalo está mais em cima.


Sempre defendi a institucionalização dos códigos livres. No entanto, a minha posição está focada nos mercados. As pessoas estão conversando, e criando produtos para os mercados. Essa tendência está correndo numa velocidade fantástica. Em nove anos, o GNU/Linux conquistou 30% dos servidores Web. Softwares compatíveis com esse sistema operacional estão sendo criados. E todos esses produtos livres têm copyleft. Não estão sujeitos à lei das patentes. Podem ser copiados, transformados e redistribuídos, desde que seus códigos-fonte retornem aos mercados.


Portanto, através dos códigos livres, o Brasil tem possibilidade real de criar produtos e serviços com uma tecnologia disponível para todos. Da mesma forma que a diversidade vegetal das nossas florestas serve de base para o desenvolvimento da medicina, podemos nos valer da diversidade tecnológica para desenvolver os nossos sistemas informáticos. Criptografia made in Brasil para atender as demandas do comércio eletrônico. Instituições públicas com servidores rodando em Linux. Educação com softwares livres, pois quem aprende a trabalhar com esses produtos vai achar ridículo voltar ao Windows.


Mas não estamos parados e esperando. Empresas como a Conectiva têm implementado muito bem o projeto dos códigos livres. É preciso mais apoio político. Na França e na China, todas as instituições governamentais estão de mãos dadas com a comunidade hacker. Enfrentando o poder das patentes americanas. Estamos num mundo globalizado e que, cada vez mais, estreita os relacionamentos entre pessoas, governos e empresas. Trabalhar juntos, recriar os mercados, e devolver para a comunidade é mais do que uma questão estratégica. A humanidade vale bem mais do que patentes, e deixar as coisas rolarem à moda americana não é um bom negócio. Queremos, apenas, ser felizes, e diversificadamente brasileiros.


*Hernani Dimantas (hernani@javali.com.br) é consultor em Privacidade e Marketing, editor da e-Zine Marketing Hacker, consultor da Javali Soluções Web e MFN Comunicação.


Este artigo foi publicado na Revista Nova- e.

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