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Ambientalistas x Ruralistas : um combate em defesa do Código Florestal Brasileiro

Autor original: Graciela Baroni Selaimen

Seção original: Artigos de opinião

O Deputado Moacir Micheletto do PMDB-PR, um dos representantes da bancada Ruralista no Congresso Nacional, divulgou uma nova proposta de alteração do Código Florestal Brasileiro (Lei n° 4771/65). A lógica que consubstancia seu Projeto de Lei se opõe aos interesses do movimento ambientalista nacional e, também, aos avanços de nossa legislação ambiental, comprometendo institutos jurídicos fundamentais à defesa dos interesses nacionais.


Oportunamente, o SOS Florestas lançou uma forte campanha de mobilização envolvendo entidades de interesse público e privado, entidades da sociedade civil em geral e ONGs envolvidas com a temática no sentido de combater a iniciativa do Deputado Micheletto. Para tal, realizou, em Nota Técnica, uma análise inicial do Projeto de Lei, apontando seus pontos negativos segundo os as seguintes tópicos:
















1- Alterações nas regras sobre Reserva Legal


- inclui as áreas que não possuem vegetação no cálculo do percentual da reserva legal;


- reduz o percentual de Reserva Legal no cerrado Amazônico de 35% para 20%;


- não estabelece o mínimo para a redução da reserva legal mediante a realização de Zoneamento Ecológico-econômico;


- permite o cômputo total de florestas exótico-homogêneas para cumprimento da obrigatoriedade de reserva legal;


- dispensa de obrigatoriedade de recuperação de reserva legal para os proprietários que devastaram suas propriedades em nome da atividade econômica;


- propõe a desobrigação de recuperação de reserva legal na hipótese de doação de áreas para terras indígenas;


- dispensa as pequenas propriedades rurais de recomposição da reserva legal;


- permite a compensação da reserva legal em outro Estado da Federação;


- permite novos dematamentos em propriedades que tenham áreas desmatadas, degradadas ou subutilizadas


2- Desmantamento de vegetação em área de Preservação Permanente


- permite a supressão de vegetação de mangues e matas ciliares para a implantação de atividades de aquicultura em geral;


- independente do tipo e atividade e de seu impacto ambiental, concede prazo de 5 anos para a regularização das atividades que hoje são situadas ilegalmente em área de preservação permanente.


3- Áreas de Preservação Permanente e Áreas Urbanas


- permite a supressão de vegetação de preservação permanente em área urbana, segundo intervenção indicada pelo Plano Diretor do município, sem respeito aos limites dispostos no Código Florestal .


4- Áreas de Preservação Permanente em reservatórios de “não considerados de porte”.


- supressão de Área de Preservação Permanente nos reservatórios particulares.


Além da ameaça a importantes conquistas jurídicas, este confronto de posições nos faz perceber que mais uma vez interesses  privados caracterizados pela ausência de uma visão macroambiente sadia e, ainda, pela resistência de valores  político-ecnonômicos menores voltam a ameaçar os interesses nacionais voltados para a proteção ambiental, a eqüidade social e eficiência econômica.


Freqüentemente, tomamos conhecimento de agressões ao meio ambiente e do desperdício de recursos naturais. Paira uma inquietação geral em torno da devastação da flora e suas conseqüências, somado a necessidade de se criar novas alternativas de desenvolvimento econômico. O desejo é de que o desenvolvimento e a conservação do meio ambiente venham a se constituir em um conceito unificado de prosperidade, que determine uma cisão com o antigo padrão de crescimento econômico, harmonizando o direito ao desenvolvimento com  o direito a usufruir de um meio ambiente saudável.


Neste caminho, a grande maioria dos países tem promulgado leis que assegurem uma política pública voltada a conservação, preservação e a recuperação do meio ambiente degradado. Aqui no Brasil a Constituição Federal, em seu art. 225, III,  determina que o Poder Público possa instituir unidades de conservação e Áreas de Preservação Permanente e, no § 4°,  criou um regime jurídico especial de proteção para determinadas regiões do território nacional, entre elas a Floresta Amazônica Brasileira.  A Constituição Federal lança mão do conceito jurídico de Patrimônio Nacional, conceito este ainda pouco definido, mas que pode ser interpretado, por  analogia, da mesma forma que o conceito de Patrimônio Público e Social, contido na Lei da Ação Popular ( Lei 4717/65).


Já o Código Florestal se apresenta como o diploma legal voltado exclusivamente para a proteção legal das florestas brasileiras.  Em linhas gerais, conceitua e determina o regime Jurídico das Florestas, diferencia  e qualifica biomas e cria o regime jurídico das Áreas de Preservação Permanente: proteção dos recursos hídricos, proteção de encostas elevações, proteção de restingas, áreas de proteção permanente em regiões urbanas e as Áreas de Proteção Permanente por ato Poder Público que trata, alem de outras temáticas, das terras indígenas.


Outro instituto jurídico de extrema relevância para a compreensão deste painel legal é o conceito de Reserva Florestal Legal.  Trata-se do espaço territorial protegido segundo o art. 225, § 1°, III, da Constituição Federal. Desta maneira, cabe ao Poder Público definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus patrimônio ambiental a serem legalmente protegidos. A Reserva Legal é protegida  não só pela Constituição Federal, mas também  por lei ordinária, como no caso do art. 16 e do art. 44  do Código Florestal, quando incidem sobre o domínio privado. A C. F. determina que é de competência da União legislar sobre Reserva Legal, cabendo aos Estados legislar suplementarmente (art. 24, caput, VI), bem como definiu que a competência para executar a legislação também é Federal. A Reserva Legal tem como características a inalterabilidade de destinação, limitação de uso, gratuidade de constituição, averbação em registro de imóveis, medição, demarcação e delimitação obrigatórias e isenção de Imposto Territorial Rural. Ainda: são duas as medidas judiciais protetoras da Reserva Florestal Legal: a ação civil pública e a ação popular.


Já outro aspecto jurídico de relevância alçado pelo Código Florestal e pela Constituição Federal é aquele que trata das limitações decorrentes da condição de Bem de Interesse Comum. O Código Florestal, em seu art. 1° afirma que “as florestas e demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade para as terras que revestem, são bens de interesse comum a todas os habitantes do País(...)”. Já a C. F. determina em seu art. 170 – “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III- função social da propriedade; (...) VI- defesa do meio ambiente (...)”.


Por força destes itens constitucionais, O Código Florestal toma uma caráter mais agudo em assuntos lhe sejam concernentes, estabelecendo, por exemplo, atividades consideradas de interesse público, tais como: - limitação de pastoreio e atividades agrícola em áreas determinadas; - limitação na exploração de recursos naturais; - erradicação de pragas e doenças; - entre outras.


Aí está uma séria zona de conflito!


Um recurso fundamental na solução desses reais conflitos é zoneamento ecológico-econômico –ZEE. Trata-se de um instrumento governamental de gestão de território, que ordena e compatibiliza a relação do homem com a natureza, segundo critérios ecológicos, como a fragilidade natural à erosão, qualidade do solo, preservação da diversidade biológica, entre outros, e segundo critérios socioeconômicos, como as potencialidades de desenvolvimento social e econômico provenientes de recursos naturais, do acesso a esses recursos e da capacidade econômica existente. Portanto, esse conjunto de critérios, acrescidos dos recursos legislativos disponíveis, podem se configurar em indicadores precisos na delimitação de cenários próprios e adequados de desenvolvimento regional.


Concluindo, depois deste painel sumário de condicionantes legais, cabe-me afirmar que o Projeto de Lei defendido pelo Deputado Moacir Micheletto, à primeira vista,  lida de forma pouco criteriosa com questões jurídicas relativas à ordem constitucional em vigor. Isto se dá, por exemplo,  quando trata de Reserva Florestal Legal,  de terras indígenas e de competências legislativas. Ademais: faz a defesa de teses anacrônicas e predatórias que podem ameaçar as conquistas sociais consagradas na legislação, bem como impedir o implemento de recursos técnicos essenciais à gestão de recursos ambientais, nascidos da integração entre a gestão pública e a atuação legislativa.


*Renata de Carvalho Salles (rsalles@openlink.com.br) é bacharel em Direito e advoga nas áreas tributária, societária, ambiental e do terceiro setor.







A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.

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