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Qual é a lição?

Autor original: Graciela Baroni Selaimen

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets

Passada a letargia causada pelo choque, cientistas brasileiros acharam por bem se reunir para trocar as primeiras impressões sobre o evento que abalou o mundo. O Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais fez o primeiro movimento convidando para o debate "Os ataques ao Pentágono e ao World Trade Center - conseqüências políticas e militares".


Realizado na tarde do dia 13, o evento foi aberto ao público e lotou o auditório da COPPE/UFRJ. Na mesa, Luiz Pinguelli Rosa, vice-diretor da COPPE e membro do Movimento Pugwash de Cientistas pela Paz – fundado por Bertrand Russel e Albert Einstein. Além de Pinguelli estavam Domício Proença, especialista em Estudos Estratégicos do Programa de Engenharia de Produção, e Fernando Souza Barros, professor do Instituto de Física da UFRJ e membro da Middle Power Initiative – Movimento pelo Desarmamento Nuclear.


Os três foram unânimes ao afirmar que importa, neste momento, torcer para que o governo norte-americano não sucumba à tentação de usar o seu enorme poderio em uma vingança. Para Domício Proença, "a decisão crucial da administração Bush é não reconhecer o terror como um ato de guerra. O terror é um crime. A guerra só acontece entre Estados. Se abrirmos mão do Estado de Direito, o terror ganhou", avisa o estrategista.


O isolamento deliberado dos Estados Unidos há até quatro dias também é lembrado pelos três pesquisadores. Ao comentar sobre a política da administração Bush, Domício Proença é categórico: "Uma larga parte da política do governo Bush desabou com as torres do World Trade Center. De repente, a administração Bush se viu desesperada, desejando o apoio internacional que há quatro dias desprezava. A política desta administração está em pedaços. Era uma política de distanciamento dos assuntos mundiais. O World Trade Center e o Pentágono revelam a esta administração americana que o mundo é um só."


A pergunta a ser feita a partir de agora é: como será o ambiente de segurança depois desse impacto? Em que mundo nós estaremos nos próximos 25 a 30 anos? Domício afirma que a resposta a esta pergunta depende da reação norte-americana à "bofetada" que foi o ataque terrorista. Ele mostra que, até o momento desta entrevista, a administração americana fez o certo: não fez nada. "Nós nem sequer sabemos quem cometeu o atentado. Há inimigos da vez, para atender uma demanda de paixão das pessoas – de ter uma resposta. Mas não se pode sair topando o jogo de apontar dedos para quem quer que as pessoas queiram que sejam os responsáveis possíveis".


Só uma coisa pode ser pior do que nunca descobrir quem fez este atentado: é escolher um inocente para "pagar o pato". Não se pode esquecer, no afã apaixonado que deseja a retaliação, que já há quase 50 anos a resposta ao terror começa com a afirmação intransigente: tudo será feito dentro da lei. As pessoas deverão ser investigadas, identificadas, perseguidas, acusadas, julgadas e, se culpadas, condenadas, individualmente, como criminosos responsáveis por seqüestros e assassinatos. Esse é o desafio de grandeza, de sabedoria, de visão, diante da administração Bush – não cair na tentação da vingança.


Falando nos aspectos sociais, Pinguelli Rosa não deixa barato. "O que foi demonstrado esta semana é que não basta a força e nem o poderio tecnológico e econômico. É preciso um pacto nesse mundo! Esse mundo está sem pacto, este mundo está sem arbítrio. Não se pode isolar este fenômeno como uma ação de terroristas, isso é uma desilusão da humanidade. É uma polarização entre a imbecilidade neoliberal e a imbecilidade fanática. São dois fanatismos". Pinguelli acha que Bush deve usar a palavra "guerra" em seu sentido retórico: guerra ao terrorismo, assim como às drogas, à imoralidade pública, às desigualdades sociais - uma guerra que só será eficaz com a adesão e o consentimento do restante do mundo. "Só com a força, não há como. É preciso ter um discurso que vá adiante disso e ganhar a adesão do mundo para combater estes episódios. Que não haja este tipo de episódio e outros, como o deboche com a pobreza, com a desigualdade, com as diferenças culturais. Estamos assistindo à impotência dos EUA em levar a cabo o seu próprio projeto – a política neoliberal, o desrespeito com os pobres, com os perdedores. Para estes, nem as batatas, mas suas cascas. As políticas econômicas condenam as populações à fome da maneira mais cínica possível. É preciso mais respeito com isso tudo", afirma.


Pinguelli lembra que "nós não estamos na catástrofe. É possível administrar o que aconteceu. O que é preciso é mudar uma atitude de um mundo indiferente aos problemas dos outros. É urgente que nós, cidadãos do terceiro mundo, cobremos de nossos governantes, posições – para que não haja uma escalada de violência".

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