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Na saúde e na doença

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets

O Al-Anon existe no Brasil há 36 anos. O Nar-Anon, há 17. Os dois programas se dedicam a atender parentes e amigos de alcóolatras e dependentes químicos. Embora pareçam ramificações dos Alcóolicos Anônimos e dos Narcóticos Anônimos e sigam exatamente os mesmos moldes, não existe qualquer vínculo formal. É praxe, contudo, a indicação de uns pelos outros a quem os procura.

Essas iniciativas tiveram origem a partir da percepção de que, assim como há dependentes de álcool e drogas, amigos e membros das famílias acabam tornando-se obcecados por vigiá-los e controlá-los. Mergulham, por assim dizer, no mesmo poço sem fundo e acabam sendo usados, sem perceberem. O entendimento de que os jovens precisam de um apoio especial fez nascer ainda uma subdivisão voltada especificamente para eles dentro dos dois programas. O Alateen e o Narateen tratam das relações e experiências dos adolescentes com os dependentes químicos e alcóolatras.

”Não adianta brigar”

A constatação de que o alcoolismo é uma doença de toda a família já foi feita pela própria Organização Mundial de Saúde. “O familiar se esquece da própria vida e passa a prestar atenção apenas ao que o outro está fazendo”, diz uma das integrantes do Al-Anon, que já soma 1.200 grupos em todo o país. “A gente não tem que pensar nas responsabilidades do alcóolico, mas na nossa própria vida”, aconselha. Ela conta que entrou para o grupo há 20 anos, aflita com a situação do marido e da irmã. Os dois já pararam de beber, mas ela continua freqüentando as reuniões. “Eu me angustiava muito. Estava mais doente do que eles. Minha irmã, na época, tinha filhos pequenos. E eles me ligavam pra dizer que ela estava começando a beber. Normalmente, eu corria pra lá e ela me pedia pra comprar bebida. Mas resolvi deixar de fazer isso. Foi então que ela viu que não tinha mais apoio e resolveu também procurar ajuda”.

Hoje ela continua comparecendo às reuniões e dedica parte do seu tempo ao trabalho voluntário na organização. E acredita que estaria internada, se não tivesse procurado ajuda. E admite: “Eu estava mais doente do que eles”.

Reunidas para trocar experiências, resguardadas pelo anonimato e pela solidariedade de companheiros com as mesmas dores, as pessoas conseguem mudar suas vidas e, de alguma forma, ajudam os próprios dependentes.

“Não adianta brigar com uma pessoa que está doente”, constata uma participante do Nar-Anon. Ela aderiu ao grupo por causa do filho, que começou a se drogar aos 18 anos, chegou a ser internado e teve algumas recaídas. No convívio com um dependente químico, a família começa a mudar suas próprias atitudes, faz cobranças e punições. E, claro, dificilmente consegue resultados. “Você acaba ficando meio paranóico”, diz ela. “Mas nada disso adianta. Ele só vai notar e refletir se a gente começar a mudar de atitude em relação a ele, se tentar compreender o problema e conversar. É por aí que a gente pode fazer a pessoa mudar de comportamento”.

Diferentemente do álcool, que é socialmente aceito, a droga traz consigo um medo a mais: o de um envolvimento com o crime. “A primeira reação da família é de medo da polícia ou do traficante”, diz ela. Com o decorrer das reuniões, os medos dão lugar à esperança. Com o tempo, as pessoas passam a cuidar mais de si. Não abandonam os seus filhos, irmãos, companheiros ou amigos à própria sorte, mas recomeçam a viver suas vidas e, assim, permitem que o dependente assuma suas próprias responsabilidades.

Sofrendo com a vergonha e a culpa – “Onde foi que eu errei? O que foi que eu fiz?” –, parentes e amigos descobrem, aliviados, que existem pessoas na mesma situação. É como diz uma das integrantes do Nar-Anon: “Comecei em 1988, por causa do meu filho. Hoje ele não tem mais o problema, mas eu continuo a vir aqui porque me sinto bem e sei que posso ajudar”.

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