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Lideranças para obter mudanças

Autor original: Daniela Muzi

Seção original: Novidades do Terceiro Setor

"Com nossos pés ainda frescos por pisarem nas areias de um novo século, vamos fazer uma promessa sagrada de dar às crianças que vão nascer em nosso mundo a saúde e a nutrição, a educação e a proteção às quais elas têm direito". Quem faz o apelo é Carol Bellamy, diretora executiva do Unicef, no texto de abertura do relatório Situação Mundial da Infância 2002 – cujo tema é " Liderança". Esta declaração resume a posição do Unicef, que não mostra desânimo em tentar alcançar as metas estabelecidas na Cúpula Mundial pela Criança, em 1990, apesar do fracasso da grande maioria dos países em relação a 27 metas traçadas, até o momento. A recém-lançada edição do relatório traz exemplos de lideranças que deram certo e aponta quais caminhos devem ser seguidos para garantir saúde e educação às crianças.

O relatório mostra que algumas promessas foram quebradas. Não houve nenhuma mudança na taxa de mortalidade materna, que deveria ter sido reduzida pela metade. 515 mil mulheres morrem por ano devido a complicações decorrentes de gravidez ou parto em todo o mundo, principalmente nos países africanos ao Sul do Saara e na Ásia Meridional. O principal motivo das mortes é a falta de assistência por profissionais especializados. A meta de universalizar o acesso à água potável e ao saneamento básico também ficou longe de ser atingida: houve apenas um aumento de três e cinco pontos percentuais, respectivamente, no acesso a esses recursos. Cerca de 1,1 bilhão de pessoas ainda não possuem água própria para consumo e mais de 2 bilhões não têm acesso a saneamento básico. O relatório chama a atenção ainda para um retrocesso ocorrido nos últimos dez anos: a pandemia de HIV/Aids em alguns países africanos, que ocasionou o aumento da taxa de mortalidade infantil.

Algumas metas ainda estão longe de serem atingidas: do objetivo de reduzir em 33% a taxa de mortalidade infantil e de menores de 5 anos, apenas 14% foram alcançados, o que significa 3 milhões de mortes infantis a menos. Isso só foi possível graças aos avanços na área de imunização – que fizeram aumentar o acesso das crianças às vacinas. A meta de diminuir em 50% as taxas de subnutrição severa e moderada em menores de 5 anos também parece muito distante: na verdade, o número de crianças subnutridas diminuiu apenas 17%: nos países em desenvolvimento, caiu de 177 milhões para 149 milhões. Mas nem tudo são fracassos. Um avanço importante foi o aumento do número de matrículas de meninas no ensino fundamental, o que significa uma diferença menor entre gêneros. "Esse é um problema grave em muitos países do mundo", comenta Florence Bauer, oficial de Informação do Unicef. "A taxa de matrícula entre os meninos é maior porque as famílias, quando têm poucos recursos para manter seus filhos na escola, optam por matricular os meninos e deixar as meninas ajudando nas tarefas domésticas".

Segundo Florence, os bons resultados obtidos na área da infância e da juventude dependeram de parcerias, principalmente, entre governo e sociedade civil: "A legislação brasileira, a partir da Constituição Federal, é toda baseada na importância das parcerias e por isso é considerada tão avançada. Não é à toa que o relatório do Unicef neste ano tão importante, quando aconteceria a Sessão Especial sobre a Criança, é sobre lideranças", explica Florence. Em relação ao não cumprimento das metas estabelecidas pela Cúpula Mundial das Crianças, a representante do Unicef reconhece que seria necessário um esforço maior na redução das taxas de mortalidade materna e no acesso permanente das crianças e suas famílias à água potável.

"Esses são temas fundamentais para o bem-estar dessas crianças e de suas famílias, porque as afetam em seu dia-a-dia. Imagine como vive uma família em que uma mulher perdeu a vida pelo simples fato de que estava grávida e não recebeu a atenção que merecia e precisava. Ou imagine ainda as milhões de pessoas atingidas por doenças crônicas, por não terem acesso permanente à água potável ou a serviços de saneamento básico em suas casas. Nesses casos, mais especificamente, acho que é preciso haver mais investimentos de recursos, de pessoal, de vontade de realizar", ressalta Florence.

Promovendo mudanças

O relatório sobre a Situação Mundial da Infância 2002 destaca o quanto as ações – incluindo aí as realizadas por governos, líderes comunitários ou organizações não-governamentais – foram decisivas para que os países alcançassem os avanços destacados pelo relatório nas áreas de educação, saúde, desenvolvimento local, entre outras. No documento do Unicef estão relatados exemplos de ações que contribuíram e vêm contribuindo para melhorar a qualidade de vida de crianças no mundo todo.

"Esses são exemplos de visão e criatividade", elogia Florence. "Pode-se destacar a garantia de educação primária gratuita em Malauí; a abolição de taxas nos hospitais e postos de saúde e o fim da cobrança de taxas para a matrícula na educação básica na Venezuela; companhias farmacêuticas que começaram a demonstrar senso de responsabilidade social na crise do HIV/Aids; uma companhia de telefones em Bangladesh que doa US$ 2 ao Unicef a cada telefone celular vendido e muitos outros".

A vez do Brasil

O Brasil foi citado três vezes no relatório sobre a situação da infância no mundo. No texto principal do documento, o programa do governo brasileiro para o atendimento aos portadores do vírus HIV é lembrado como um modelo para outros países do mundo porque dá acesso a todos os portadores, incondicionalmente, aos medicamentos mais avançados de controle da ação do vírus. O relatório faz elogios ao governo brasileiro por sustentar o programa, mesmo durante a crise econômica enfrentada em 1999.

Na opinião de Florence, a melhor surpresa para o Brasil está nos textos laterais do relatório. "Apenas o Brasil, entre os países relatados, teve citados três líderes que trabalham pelos interesses da criança. Dessa vez, gente da sociedade civil, que não tem grandes orçamentos nas mãos, mas tem a firme decisão de ajudar a promover os direitos das crianças e adolescentes", comemora. São eles: Padre Julio, destacado por seu trabalho com as crianças portadoras do HIV na Casa Vida Lancelotti; o empresário Oded Grajew, fundador da Fundação Abrinq pelos Diretos das Crianças e do Instituto Ethos; e o jornalista Âmbar de Barros, responsável pelo surgimento da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi).

Os interessados em obter o relatório devem enviar mensagem para o correio eletrônico brasilia@unicef.org.br, solicitando a publicação.

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