Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
Anunciado no último dia 26 como vencedor do prêmio da Fundação Ruben Berta, o Projeto Axé atende hoje 1.547 crianças e adolescentes de 5 a 21 anos, em Salvador. Procurando manter um ambiente educativo para as populações de baixa renda, em especial as crianças e os adolescentes que vivem nas ruas da cidade, o trabalho tem o propósito de torná-los capazes de estruturar um projeto de vida, sendo sujeitos do seu próprio desenvolvimento pessoal e social.
Tudo começou em 1990, quando Cesare de Florio La Rocca, diretor-presidente do Projeto Axé, era então representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em Brasília, e participava do processo de redemocratização do país. Com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), constatou-se a necessidade de concretização de projetos para os excluídos. Com apoio do Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua (MNMMR) e do Terra Nuova, uma organização não-governamental italiana, o projeto buscou, inicialmente, aprofundar o conhecimento sobre a realidade de crianças e adolescentes que viviam nas ruas de Salvador. A partir daí, o Axé formou educadores e iniciou o processo de educação de rua, buscando a inserção e o acompanhamento dessas crianças e adolescentes no núcleo familiar, na escola, e na comunidade.
No Axé, a prática pedagógica se baseia na arte como instrumento para a educação, além de utilizar a psicanálise. “Quando um menino de rua dizia ao educador ´não tenho nada a perder’, resolvemos rever a nossa metodologia e passamos a acrescentar outras referências teóricas, como Freud e Lacan, às que já utilizávamos, como Paulo Freire e Jean Piaget”, conta Rocca. O projeto adotou, assim, a “pedagogia do desejo”, uma metodologia que consiste em técnicas específicas de motivação para devolver a esses meninos a capacidade de sonhar e estimular neles o desejo de tornar-se cidadãos. “Incentivando a criança a assistir a espetáculos e participar de atividades culturais, queremos que ela substitua o discurso ´não tenho nada a perder’ por ´e por que não eu também?’”, explica Rocca. A idéia é que, por meio de diferentes linguagens e manifestações artísticas, o processo educativo forneça aos jovens os instrumentos adequados para a construção da sua cidadania e para que eles batalhem pelo seu lugar na sociedade. Faz parte desse processo o estímulo ao autoconhecimento, à expressão e à criatividade, o acesso às artes e à cultura universal e a compreensão da ética e da estética.
O Axé trabalha em interação permanente com outras organizações da área social, divulgando a sua metodologia e formando educadores. A proposta do Axé é uma referência para instituições que trabalham com educação de rua no Brasil e em outros países.
O diretor do Projeto Axé, que já atendeu cerca de 9 mil crianças em 10 anos de atividade, considera o prêmio da Fundação Ruben Berta, além de um auxílio financeiro – R$ 10 mil em dinheiro –, o reconhecimento de um esforço constante realizado no projeto. Fizeram parte da comissão julgadora do prêmio nomes como Oded Grajew (Instituto Ethos), Hélio Mattar (Akatu), Rodrigo Baggio (CDI) e Marcus Fuchs (Andi).
Segundo Rocca, as dificuldades ainda são muitas. Além da captação de recursos, ele acredita que há pouca participação da sociedade brasileira. “A sociedade ainda não está muito conscientizada. As pessoas acham que a solução para os problemas sociais está exclusivamente nas mãos do governo ou de quem tem isso como missão”, diz. Também não é nada fácil tocar um projeto social no atual contexto, em que o país se encontra em crise. “Se, daqui para frente, conseguirmos manter a qualidade do nosso trabalho, estaremos satisfeitos”, afirma.
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