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O mesmo compromisso, dez anos depois

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets






Em 1992, reunidos no Rio de Janeiro, chefes de estado, líderes e dirigentes de organizações não-governamentais de todo o mundo participaram de um momento único e acertaram compromissos comuns em torno de um documento que ficou conhecido como Agenda 21. Nele foram registradas propostas por um mundo, senão ideal, mais justo. O respeito ao meio ambiente, o desenvolvimento econômico responsável, a preocupação com os recursos naturais e com o próprio ser humano: tudo isso se materializou em um ideário a ser seguido. Como reforço ao compromisso, estabeleceu-se uma data para sua revisão. Pois a hora está chegando. Em setembro do próximo ano, as atenções do mundo convergem para Joanesburgo, na África do Sul, onde se realiza a Conferência Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, também chamada de Rio + 10, justamente porque se presta à retomada dos acordos feitos no Rio, dez anos antes.

O Brasil vem fazendo alguns movimentos de preparação para o evento, com participação do governo e da sociedade civil. Em outubro, representantes de organizações do terceiro setor se reuniram no Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para Desenvolvimento e Meio Ambiente, para definir suas estratégias de ação para a conferência. Lideranças de mulheres também estiveram reunidas recentemente para discutir questões de gênero que possam ser levadas a Joanesburgo. Em janeiro próximo, novamente o Rio de Janeiro será sede de outra prévia da grande conferência: durante uma semana, no Evento Mundial sobre Clima e Energia, serão debatidos recursos renováveis, alternativas energéticas e estratégias de desenvolvimento sustentável que contribuam com a redução das emissões de dióxido de carbono na atmosfera.

Em todas as atividades preparatórias e preliminares, propostas vêm surgindo. Uma delas voltou com força, e com a iniciativa do governo federal: propor a troca de parte da dívida dos países em desenvolvimento por projetos de preservação do meio ambiente. A idéia foi aprovada no Fórum Regional de Ministros do Meio Ambiente da América Latina e Caribe, que contou com a participação de quase 40 ministros de Estado. Para eles, os recursos das nações industrializadas não são suficientes para gerar o desenvolvimento sustentável dos países do terceiro mundo.

Mário Mantovani, diretor da SOS Mata Atlântica, lembra que essa proposta remonta à própria Rio-92 e recebeu, na época, um bom apoio das organizações do terceiro setor. Porém Pedro Graça Aranha, coordenador de Biodiversidade da entidade ambientalista Os Verdes, prefere ficar com um pé atrás: "Hoje tem muita gente que acha fantástico trocar a dívida por bônus ambientais, mas não há ainda um consenso entre as organizações", afirma.

Embora admita que nesses quase dez anos que se passaram houve uma evolução de conceitos e uma maior exposição dos temas relacionados ao meio ambiente, Mantovani acha que o governo ainda está longe de atender as recomendações da Agenda 21 – "Isso ainda está muito cru". No entanto, diz ele ninguém jamais havia falado sobre sustentabilidade, até 1992.

Recentemente, as ONGs ambientalistas da América Latina e do Caribe fizeram mais um Prepcom, um Encontro Preparatório para a Rio + 10. Na ocasião, solicitaram às autoridades que permitissem ao terceiro setor fazer o acompanhamento da implementação de políticas públicas. O problema todo, diz Pedro Aranha, é justamente esse: as propostas não se traduzem em políticas públicas. "A gente faz muito pelo meio ambiente, avança nos documentos, como o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Acontece que a Organização Mundial do Comércio sempre acaba barrando. Você chama a sociedade para discutir? É porque eles só querem aumentar o comércio, privilegiar a produção", protesta Pedro, que coordenou o Fórum Brasileiro de ONGs. Em relação à Conferência Mundial, Pedro percebe progressos em questões como a da Mata Atlântica (incluída no Programa Geral de Proteção). "O processo é lento", lamenta, "mas tem evoluído. A gente está atrasado em relação à Agenda 21, é verdade, mais isso já faz muito tempo, vem de longe! A ótica das organizações não pode ser essa", diz. O Fórum Brasileiro pretende promover consultas regulares até junho ou julho de 2002, quando será realizado um grande encontro preparatório para Joanesburgo. Um desses eventos será às vésperas do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, nos dias 28 a 30 de janeiro. ONGs brasileiras, latino-americanas e caribenhas estarão juntas para continuar o debate. "Queremos fazer um contraponto à Cúpula das Américas", que será no mesmo período, em Nova York.

Mantovani acredita que a Rio + 10 terá um efeito catalisador. Será o momento de não apenas discutir as questões ambientais, mas de aproximar as pessoas. "Com isso, a gente vai chegando cada vez mais perto da realidade", comenta. "Agora, por exemplo, os países que não se envolveram anteriormente poderão participar. E não há mais exclusivamente as questões ambientais. Teremos também as questões sociais e de gênero".

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