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Solidariedade presente

Autor original: Fausto Rêgo

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets





Fim de ano, época de festas, tempo de presentear pessoas queridas. Por que não aproveitar para exercitar a solidariedade? Não têm sido poucas – na verdade, são cada vez mais numerosas – as iniciativas que procuram incentivar o consumo de produtos que tenham valor social. São artigos com apelo comercial, naturalmente, negociados de forma tradicional, mas que trazem consigo um argumento a mais: a garantia de que o dinheiro investido em sua compra será destinado a causas importantes, podendo melhorar a vida de muitas pessoas. Não se trata de caridade, mas de uma troca – é comércio, afinal. Se você estiver disposto a comprar essa idéia, saiba que existem diversas organizações que disponibilizam uma série de ofertas.

O Natal começa aqui


Um dos eventos mais tradicionais do calendário carioca, realizada desde 1961, a Feira da Providência deste ano será inaugurada no dia 6 de dezembro. Sua principal atração sempre foram os estandes com o comércio e a culinária típicos de diversos países e estados. Mas o evento cresceu, e muito. Neste ano, durante quatro dias, o público terá a chance de apreciar – e adquirir – produtos de 40 países e 20 estados brasileiros. Em 2000, a arrecadação líquida foi de R$ 2,4 milhões, com 700 mil visitantes. Toda a receita é repassada para o Banco da Providência. A entidade foi criada em 1959 por Dom Hélder Câmara e mantém quatro creches, três centros profissionalizantes, ambulatório, centro de atendimento a portadores de HIV e vários outros projetos. A superintendente Clarice Linhares informa que a Feira é responsável por 70% do orçamento anual do Banco da Providência e admite que a expectativa é superar o resultado do ano passado. “Nós trabalhávamos com a perspectiva de um crescimento de 30%, mas o racionamento afastou alguns expositores. Mesmo assim, acreditamos que será possível crescer 10%”.


Com o tema “O Natal começa aqui”, a Feira da Providência vai ocupar quatro pavilhões no Riocentro, na Barra da Tijuca. O primeiro deles é dedicado justamente aos produtos natalinos. Como cartão de visitas, um presépio e uma árvore de Natal de dez metros de altura, feita com latinhas de alumínio. Estarão presentes os comerciantes do Saara – uma tradicional região comercial no Centro do Rio –, oferecendo enfeites e adereços a preços baixos. Outra atração, repetindo a experiência do ano passado, será a Mostra Social, reunindo quase 30 organizações não-governamentais. Em seus estandes, elas terão a oportunidade de exibir seu trabalho e vender seus produtos. Clarice chama a atenção: “Tem muita gente fazendo coisas legais, mas as pessoas nem sabem”.


O Pavilhão 2 vai abrigar o Mercado Jovem, com apresentações de bicicross, ginástica e outros esportes, o Museu da Bicicleta e um espaço literário em que as principais editoras vão expor os seus lançamentos.


No terceiro pavilhão estará o Mercado Livre, um grande shopping com lojas de bijuterias, cosméticos, produtos para casa e decoração. E o Pavilhão 4 reunirá as vedetes originais da Feira da Providência: os estandes de estados e países.


A despeito de toda a necessária estrutura profissional exigida por um evento desse porte, dois mil voluntários também estarão trabalhando no evento. Uma prova de que a Feira da Providência não perdeu as suas características. “São pessoas que podem ajudar a captar recursos para quem precisa”, diz Clarice. “O nosso evento é 100% voltado para o social, mas nem estava aproveitando isso. Dessa vez, a campanha publicitária vai enfatizar esse aspecto. Vamos mostrar como são empregados os recursos e o que a Feira nos ajuda a fazer. Acho que a sociedade está mais aberta, mais solidária”.


Brexote


Antes da Feira da Providência, nos dias 22 e 23 de novembro, o Projeto Quixote, que atende crianças em situação de risco social e é vinculado ao Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo, realizou mais uma edição – a quarta – do seu bazar anual de roupas e presentes, o Brexote. Os produtos à venda foram feitos por crianças e adolescentes atendidos e por suas mães. São camisetas pintadas à mão da Agência Quixote Spray Arte e pingentes decorativos da Oficina de Produção – duas iniciativas desenvolvidas pelo projeto. Também foram comercializadas roupas novas e usadas provenientes de doações, além de produtos de entidades parceiras, como a Comunidade Lua Nova. “Apresentamos os produtos do projeto Criando Arte”, diz a psicóloga Raquel Barros, coordenadora da Lua Nova. “São bonecos artesanais (em sua maioria, mãe e filho) que, além de constituírem um importante instrumento terapêutico para a nossa população-alvo – jovens mães adolescentes em situação de risco – também são excelentes presentes de Natal”. Raquel afirma que as vendas significam um estímulo para essas adolescentes. “Além de uma constante reflexão sobre a maternidade, a venda proporciona um brinquedo para outras mães e, para elas, o sentimento de ser  cidadãs capazes”, afirma.


No Brexote deste ano houve mais novidades: uma delas foi o Leilão da Cidadania, onde o público pôde arrematar obras de artistas que colaboram com o Projeto Quixote, como a artista plástica Eneida Brotero e a designer de jóias Fernanda Spilborghs. A outra atração foi o Café do Moinho, com um variado cardápio de doces, salgados e sucos para os visitantes.


Immaculada Lopez, coordenadora do Núcleo de Cultura e Comunicação do Projeto Quixote acredita que é um grande incentivo, para os adolescentes que elaboram os produtos, ver seus trabalhos sendo adquiridos e valorizados elo público. “Também é muito importante perceberem que esse trabalho pode gerar renda e novas perspectivas de vida. Certamente”, analisa, “iniciativas como o Brexote colaboram com o fortalecimento da sua auto-estima e o seu desenvolvimento profissional”. Mesmo após o encerramento do Bazar, os produtos do Projeto Quixote e da Lua Nova continuam à venda, podendo ser adquiridos na sede das duas instituições.


Cartões de Natal


Manda a tradição que o presente de Natal seja acompanhado de um cartão de Boas Festas. Nesse caso, uma das opções podem ser os do Instituto Ronald McDonald, organização criada em 1999, com o objetivo de arrecadar e repassar recursos para entidades beneficentes voltadas para o combate ao câncer infanto-juvenil. São quatro modelos diferentes de cartão, com parte da renda revertida para instituições de todo o país. Os pedidos devem ser feitos por fax ou por correio eletrônico. Empresas interessadas também poderão estampar suas logomarcas nos cartões, com preços especiais para grandes quantidades. O Instituto Ronald McDonald destaca a importância da iniciativa para dar visibilidade ao problema do câncer infantil. “Com os cartões, esperamos que aqueles que os compram estejam contribuindo para propiciar, com dignidade e conforto, o tratamento às crianças e aos adolescentes portadores de câncer no Brasil”, informa Francisco Neves, diretor responsável pelo instituto.


Outra possibilidade são os cartões da organização Papel de Gente. A entidade foi criada em 1994, pela terapeuta Eliana Tiezzi Nascimento – com apoio de artistas, designers e empresários –, como um espaço alternativo para pessoas com transtornos psíquicos como psicoses e neuroses graves. Uma das suas atividades envolve pessoas atendidas pelo projeto na produção e criação de produtos com material reciclado. Entre eles, cartões, álbuns de fotografias, agendas telefônicas, porta-retratos, calendários e cúpulas para abajures. Particularmente, a Papel de Gente está investindo, neste fim de ano, na comercialização de cartões de Natal. São 130 mil, feitos com a técnica japonesa do origami (dobradura). Se todos forem vendidos, a arrecadação será suficiente para a entidade comprar o galpão onde funciona, na Vila Mariana, em São Paulo.

Um outro olhar


E para não esquecer de continuar exercitando a solidariedade na hora de consumir, anote na agenda. Agenda, aliás, que pode ser adquirida na loja virtual do Instituto Socioambiental (ISA) ou em sua sede, em São Paulo. Trata-se de um produto especial, fartamente ilustrado com 50 imagens que mostram o dia-a-dia dos índios Panará. As fotos da agenda intitulada "Olhares das Crianças Panará" foram feitas pelas crianças da aldeia Nãsêpotiti, localizada ao norte do Mato Grosso, na divisa com o Pará. Cada uma recebeu uma máquina fotográfica descartável e as instruções básicas sobre seu funcionamento. A tarefa acabou virando uma grande brincadeira e o resultado foi surpreendente. “Foi uma brincadeira deliciosa”, lembra André Villas-Boas, coordenador do Projeto Xingu, do ISA. “É um trabalho de divulgação da história deles, que superaram adversidades históricas, mas conseguiram se recuperar”.


Os problemas da tribo começaram em 1973, com a construção da rodovia Cuiabá-Santarém. Eles foram expulsos de suas terras, tornaram-se vítimas de epidemias e alcoolismo e chegaram a pedir esmolas para sobreviver. Quase foram dizimados, mas deram a volta por cima e, com o apoio de uma coalizão internacional da qual fez parte a Rain Forest Foundation, conseguiram ter suas terras reconhecidas e ainda deverão ser indenizados por danos morais pela União. Uma parte dos recursos obtidos com a venda das agendas vai pagar os custos de produção. Todo o restante será revertido para a Associação Iakiô, administrada pelos próprios índios Panará, que têm ainda o direito autoral das fotos.

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