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E a Mata Atlântica?

Autor original: Marcelo Medeiros

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De 28 a 30 de novembro, aconteceu, em São Paulo, um seminário para avaliar os resultados do projeto “Quem faz o que pela Mata Atlântica”, que relacionou quantitativamente o que foi feito pela preservação desse bioma nos últimos dez anos. O evento foi organizado pela Rede de ONGs da Mata Atlântica, pelo Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, pelo WWF-Brasil e pelo ISA (Instituto Socioambiental) e pretendeu discutir também leis ambientais. A Mata Atlântica vem sendo destruída desde a colonização e conta hoje com apenas 8% de seu território original. Porém o trabalho de recuperação está começando a se intensificar e o volume de recursos investidos, a aumentar. Na década de 90, foram gastos R$ 320 milhões na conservação da mata, concentrados nos últimos três anos.


Os resultados do seminário estarão disponíveis no site www.mataatlantica.org.br a partir do início de 2002 e serão distribuídos, em um catálogo, a entidades e pessoas interessadas no tema. Num dos intervalos do evento, a Rets conversou com o coordenador do Programa Mata Atlântica do ISA, João Paulo Capobianco. Ele falou sobre a situação e a importância da Mata Atlântica hoje e antecipou alguns resultados do seminário.


Rets: Qual é a situação atual da Mata Atlântica? Que resultados têm trazido as campanhas de preservação e reflorestamento?


Capobianco: A situação atual apresenta o problema do grau histórico de desmatamento da Mata Atlântica, que sempre foi muito elevado. Temos hoje menos de 8% da área original, o que é um valor absurdo. Por outro lado, há um trabalho de reversão que diminui o ritmo de desmatamento. Ainda assim, nenhum desmatamento é aceitável , mas estamos melhorando. Quanto à situação da mata, há áreas com uma biodiversidade muito grande, superior à Amazônia. Além disso, a Mata Atlântica é responsável hoje pelo abastecimento de água de 80% da população brasileira, concentrada mais na região sudeste. Um exemplo são as represas de Billings e Guarapiranga, em São Paulo, que são as duas maiores represas do mundo em área urbana.


Rets: Quais são as principais dificuldades enfrentadas na preservação da Mata Atlântica?


Capobianco: O principal problema é a cultura de desmatamento introduzida em 1500. O problema cultural faz com que a sociedade, apesar de muitas vezes se estressar com o desmatamento e se interessar pelo assunto, fique surpresa quando se fale em desmatamento zero. Além da questão cultural, o aspecto econômico também é importante. A especulação imobiliária e a agroindústria agem como vetores de dificuldade de preservação.


Rets: “Quem faz o quê”? Onde estão concentrados os investimentos e ações pela Mata Atlântica? Quais são as áreas carentes de investimentos? Quantas e quais são as organizações envolvidas nesses projetos?


Capobianco: Na verdade o seminário é a apresentação de uma primeira etapa de levantamento, que não conseguiu reunir todos os resultados, apesar do número excelente de apresentações. Levantamos um total de 578 entidades executoras, 437 parceiras e 263 financiadoras. A década de 90 apresentou um volume de R$ 320 milhões investidos nessa área, com crescimento ao longo dos anos, principalmente nos últimos três - devido ao crescimento da consciência ecológica de toda a população. Algo que constatamos foi a participação expressiva do setor privado como o Unibanco Ecológico e  O Boticário. Os investimentos estão concentrados no Rio e São Paulo, além da região Sul. Há uma forte carência no Nordeste e no sul do Centro-Oeste, mas acho que os recursos não devem ser redirecionados. Deve haver um aumento do volume de recursos voltados para as regiões mais carentes e não uma redistribuição dos já existentes.


Rets: Quais são os principais projetos de preservação e desenvolvimento da Mata Atlântica?


Capobianco: Nós ainda estamos discutindo isso. É difícil dizer, pois o seminário se baseou no levatamento de dados quantitativos e não qualitativos. Durante o seminário discutiremos direções para um próximo levantamento qualitativo, quando poderemos dizer com certeza quais foram os melhores projetos.


Rets: Que políticas públicas estão sendo desenvolvidas para a preservação desse bioma? Para onde devem apontar as futuras políticas?


Capobianco: O trabalho do governo aponta para as áreas de legislação. Tem havido uma normatização de regras pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente e a Lei da Mata Atlântica, que tramita há 10 anos no Congresso, tem possibilidade de ser aprovada a curto prazo. A idéia é aprimorar a aplicação das leis também. As políticas públicas devem apontar, em primeiro lugar, para o desmatamento zero e a recuperação da área desmatada. O objetivo é recuperar de 30 a 35% da área original e já existem diretrizes apontando para isso.


Rets: Como a destruição da Mata Atlântica afeta a população?


Capobianco: Em várias áreas: no abastecimento de água, no clima, na erosão do solo, na eliminação do controle biológico de pragas e até mesmo no lazer das pessoas.


Rets: Como a população pode ajudar para a conservação da Mata?


Capobianco: Em primeiro lugar, no combate ao desmatamento. Depois é necessário perceber a conservação do meio ambiente como prioridade: internalizar a questão e colocá-la como prioritária. Assim, as pessoas devem votar em candidatos envolvidos com questões ecológicas. Tudo passa pela questão política. E há também a população nativa de áreas onde ainda há Mata Atlântica - que deve ser conscientizada para não agredir o meio ambiente.


Rets: Quais são as novidades apresentadas no Seminário?


Capobianco: Entre outras coisas, o Seminário discutiu leis, mas o que foi apresentado de novo foi o valor expressivo de dinheiro investido, que apesar de longe do ideal, foi uma surpresa. Outro ponto que verificamos foi a participação do setor privado, que contribuiu com 15% do valor total e apresenta enorme potencial de crescimento.


Rets: Essa é a primeira iniciativa de monitoramento de ações sobre a Mata Atlântica. Esse monitoramento terá continuidade? Seguirá no mesmo formato?


Capobianco: O objetivo é tornar o programa permanente. Tentaremos manter o mesmo formato e a cada ano escolher um tipo de projeto a ser avaliado qualitativamente.

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