Autor original: Marcelo Medeiros
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
“ (...) Deve-se entender como violência contra a mulher qualquer ação ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado.” É isso que afirma o Artigo 1º da Convenção para Prevenir, Punir e Eliminar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), assinada pelos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos (OEA), entre eles o Brasil, em 1979.
Na década seguinte, o movimento feminista brasileiro, inserido no momento de abertura política da década de 80, dirigiu seus esforços para eliminar leis discriminatórias, dar visibilidade à discriminação e às formas de violência contra as mulheres por meio de um processo de diálogo com o Estado e com a sociedade. Esse esforço resultou na criação de Conselhos da Mulher, delegacias especializadas, abrigos e centros de orientação jurídica e de apoio psicológico. Em 2000 havia 304 delegacias de atendimento à mulher, cerca de 40 centros na área da saúde para atenção a vítimas de violência sexual e 21 abrigos para vítimas de violência doméstica espalhados pelo país.
A ginecologista Simone Diniz afirma que a legislação brasileira é bastante avançada nessa área, assim como as políticas públicas. “O problema, -diz-, é a distância entre possuir e exercer. Existem programas, mas a efetivação é ruim”. Nesta medida, Diniz defende as organizações da sociedade civil como formas de pressão do governo para a real implementação das estratégias desenhadas. “O terceiro setor tem como função também elaborar ações que o Estado possa incorporar”, esclarece.
Uma dessas iniciativas ganhou o nome de Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, da qual Diniz faz parte. Criado em 1981 na cidade de São Paulo, tinha como objetivo resgatar a saúde como uma questão de direito das mulheres e compreender questões pessoais como políticas. Assim, os primeiros trabalhos foram direcionados à sensibilização de problemas de saúde femininos em sindicatos e associações de moradores localizados na periferia da Capital e em municípios vizinhos. As fundadoras perceberam a necessidade de ampliar o trabalho devido à demanda das mulheres com quem conversavam. Criaram então, em 1985, o Ambulatório de Saúde das Mulheres, que, de acordo com a assistente de projeto do Coletivo, Marta Carvalho, tem como objetivo “promover uma relação prazeirosa e saudável das mulheres com o seu corpo e a sua sexualidade”.
No ambulatório são prestados serviços de ginecologia, obstetrícia e de tratamento psicológico nos casos de violência sexual e doméstica. São realizados também atividades em grupo, oficinas, cursos de formação para usuárias e profissionais de saúde, pesquisas e consultorias, além de assessorias. A intenção é humanizar o atendimento, tornando-o menos agressivo à mulher, pois um dos maiores problemas apontados por Marta é o acesso ao atendimento público de saúde de qualidade. As terapias alternativas empregadas ganharam o nome, de inspiração francesa, de “medicina doce”.
Para divulgar melhor essas idéias e assim facilitar o acesso de qualquer uma à informação de tratamento e prevenção de seus problemas, o Coletivo põe na rede, desde agosto, o informativo Medicina Doce e Saúde da Mulher. Com textos retirados de publicações nacionais e estrangeiras sem lugar na grande mídia sobre diferentes males que atingem as mulheres, o boletim visa também “a autonomia das mulheres em sua busca de uma vida plena e saudável”.
A organização possui ainda um serviço de informação e denúncia via telefone chamado Disque SOS Mulher. Através dele são tiradas dúvidas sobre gravidez e procedimentos de denúncia de violência doméstica e sexual, que, juntamente com o preconceito, são os maiores problemas enfrentados pelas mulheres no Brasil, segundo Simone Diniz.
Metade das mulheres atendidas possuem renda inferior a três salários mínimos e a maioria é composta por estudantes e empregadas domésticas com idade de 20 a 40 anos, sendo que 20% das atendidas são adolescentes. É para esse público que, segundo o Coletivo, devem apontar as novas políticas públicas de saúde feminina. O modelo ideal, segundo Diniz, é baseado na prevenção, “sendo menos complexos e mais resolutivos”.
O Coletivo já lançou um livro chamado “Saúde das Mulheres: a experiência do Coletivo Feminino Sexualidade e Saúde”, além de um Guia de Serviços de Atenção a Mulheres em em Situação de Violência”, já na segunda edição. Ambos podem ser obtidos no Coletivo, que pretende extender seus serviços no próximo ano aos parceiros das atendidas.
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