Autor original: Felipe Frisch
Seção original: Serviços de interesse para o terceiro setor
Organizações não-governamentais, se não são auto-sustentáveis, dependem de captar recursos. Isso é tautologia: ninguém discute. Mas a captação depende de uma série de variáveis, a começar pela vontade dos doadores. São questões como essa – assim como as diferenças entre o universo das doações aqui e no exterior – que o pesquisador Custódio Pereira levanta na recém-lançada publicação “Fund Raising (Captação de Recursos): conhecendo melhor por que as pessoas contribuem” (Editora Mackenzie, R$ 30), uma pesquisa que deu origem à sua dissertação de mestrado.
A presença do nome em inglês logo no título já ilustra a significativa diferença entre Brasil e Estados Unidos, por exemplo. “Fund Raising tem um sentido muito mais amplo, que não trata apenas de captar dinheiro, e fala especialmente para o terceiro setor”, explica Custódio, diretor financeiro do Instituto Presbiteriano Mackenzie e presidente da Associação Brasileira dos Captadores de Recursos (ABCR). Mesmo levando-se em conta a disparidade entre as situações econômicas dos dois países, as discrepâncias são enormes: nos EUA são arrecadados anualmente cerca de US$ 203,4 bilhões (dados de 2001). No Brasil, segundo pesquisa citada no livro - realizada pelo Iser e pela universidade americana John Hopkins em 1999 -, todo o terceiro setor movimenta 12 bilhões, em reais (o que equivale a aproximadamente US$ 5,2 bilhões).
O nível das doações é inversamente proporcional à necessidade da doação em cada país. A surpresa é maior quando pergunta-se quem são os doadores. Nos EUA, 75% das doações (US$ 152,07 bilhões) vêm de pessoas físicas, e aqui a proporção é comparável: 68%. Ou seja, os incentivos fiscais – pouco significativos no caso brasileiro e essenciais para empresas – são importantes, mas questões culturais são as que especialmente fazem o perfil de doação de cada sociedade.
– O motivo para as pessoas passarem a doar não é ter ou não incentivo governamental. Esse pode ser apenas um fator para alguém doar menos ou mais. Um exemplo que eu cito no livro é o The Hunger Site, o Site da Fome. Depois dos EUA, o Brasil foi o país que mais doou. Isso graças à criatividade da proposta [é só dar um clique para fazer uma doação, que será patrocinada por uma das empresas parceiras]. A pessoa doa porque se sensibiliza e quer participar do momento de glória. Ninguém gosta de se aliar a causas fracassadas – afirma Custódio.
No Brasil, segundo a publicação, figuram entre as prioridades dos doadores questões ligadas às crianças, à fome e à desnutrição. Quanto às carências do próprio terceiro setor de informações sobre captação de recursos, o pesquisador considera como principais: a ausência de bibliografia, pesquisas e profissionais especializados e – especificamente no caso brasileiro – “pelo fato de o setor ser mais recente aqui do que no resto do mundo”, explica.
– Acaba-se muitas vezes captando dinheiro sério para causas não sérias, e isso contamina outras iniciativas – revela Custódio, deixando escapar o principal motivo que leva pessoas e instituições a não fazer doações. "Muitas pessoas acham que as instituições no Brasil não são sérias, ou são mal administradas", conclui o pesquisador, que espera estar dando uma contribuição para que o país inverta a relação entre os investimentos feitos pelos empresários em segurança patrimonial (R$ 4 bilhões anuais) e o que é gasto por eles em filantropia – R$ 5 mil por mês, em média, no somatório de todo o país.
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