Autor original: Graciela Baroni Selaimen
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Em novembro de 1996, um grupo de organizações não-governamentais se reuniu para debater questões de interesse comum – o direito à informação, o uso democrático dos meios de comunicação, a liberdade de expressão, entre outros temas ligados à mídia e à comunicação. Do trabalho deste grupo surgiu o manifesto Vozes 21, uma associação informal de ativistas – organizações e indivíduos. Cinco anos depois, em novembro passado, o grupo se reuniu novamente para reavaliar o foco de suas ações, objetivos e fazer um balanço do trabalho realizado. Desta vez, estavam presentes novas organizações que se integraram ao movimento (entre elas, a Rits). Neste encontro foi decidido que o grupo seria reestruturado como uma entidade mais formal – a Plataforma pelo Direito à Comunicação – e nasceu uma nova iniciativa, a campanha C.R.I.S. (Communication Rights in the Information Society). A campanha foi lançada tendo em vista a efetiva participação das ONGs no processo de planejamento do WSIS (World Summit on Information Society), evento realizado pela União Internacional de Telecomunicações – órgão que faz parte do sistema das Nações Unidas. Até dezembro de 2003 – data prevista para o WSIS – há uma série de ações e eventos que farão parte da campanha C.R.I.S., sempre com o objetivo de garantir que questões ligadas aos direitos humanos, especialmente no campo da Comunicação – estejam na pauta do evento e que a participação das ONGs seja ampla.
Nesta entrevista, conversamos com Seán Ó Siochrú, que é um dos membros fundadores da Plataforma pelo Direito à Comunicação. Seán é escritor, pesquisador e ativista em mídia e comunicação. Além de coordenador da Community Media Network em seu país, o irlandês Seán Ó Siochrú também é diretor da Nexus Research Cooperative. Em breve, o pesquisador lançará o livro “Global Media Governance: A Beginner's Guide”, escrito com Bruce Girard, também membro fundador da Plataforma.
Rets - O que é a Plataforma pelo Direito à Comunicação e quando ela foi criada?
Seán Ó Siochrú - A Plataforma foi formada inicialmente em novembro de 1996. O nome original, adotado meio que apressadamente, era “Plataforma para Cooperação pela Democratização da Comunicação”. Nós mudamos este nome em uma reunião recente, que marcou os cinco anos de existência da Plataforma. Estou enviando anexo um arquivo que traz as informações básicas sobre como se tornar um membro desta iniciativa, entre outras (o arquivo está disponível para download no final desta entrevista, em inglês).
A Plataforma foi formada por um grupo de ONGs que estavam a cada dia mais preocupadas com as tendências da mídia e da Comunicação. Nós continuamos a acreditar que as implicações de tendências tais como a concentração da propriedade dos meios de comunicação, a crescente dominância de um modelo puramente comercial, a diminuição do “ethos” e das obrigações do setor público, a dominância da mídia, nos países pobres, por organizações orientadas pelo lucro, a eliminação gradual da regulação nas questões de interesse público etc. são temas que trazem consigo riscos enormes – e geralmente não reconhecidos – para o desenvolvimento cultural, econômico e social. A mídia desempenha um papel muito importante na vida de todos nós e passa por uma intensa dinâmica de mudanças. Ainda assim, em nível global, a regulamentação, a prestação de contas e o controle democrático são virtualmente não-existentes. Nós também estamos extremamente preocupados com a aparente falta de compreensão das ONGs e da sociedade civil em geral a respeito da extensão e das implicações destas mudanças.
Depois de ter dito isso tudo, nós também vemos motivo para otimismo, acreditando na mídia independente e comunitária, na progressiva emersão de coalizões internacionais de mídias, inclusive as voltadas para lobby, e que diversas agências e comissões internacionais estejam desejando tomar uma posição a este respeito.
Rets - Que organizações estão participando da Plataforma? Elas têm um perfil semelhante? É possível que outras organizações venham fazer parte deste grupo?
Seán Ó Siochrú - Atualmente, fazem parte da Plataforma organizações como a ALAI, a AMARC, a APC, a MacBride Round Table, a RITS, a PCC, a WACC, Communities Online, a Panos, Les Penelopes e muitas outras organizações ativas nas questões ligadas à comunicação. O critério básico para se tornar membro é experiência internacional ou envolvimento em temas ligados à mídia, ser uma organização não-lucrativa e não-governamental, estar comprometido com os nossos objetivos e ter o desejo de participar ativamente. Neste momento, estamos finalizando um esboço do protocolo de adesão para os membros já existentes. Depois disso, outros poderão participar. Entretanto, é importante enfatizar que a Plataforma concordou em concentrar todos os esforços na iniciativa da campanha C.R.I.S. (Communication Rights in the Information Society). Qualquer organização pode aderir a esta iniciativa, mesmo sem fazer parte da Plataforma – e a maneira de fazer isso será definida muito em breve.
Rets - Quais são os principais objetivos da Plataforma?
Seán Ó Siochrú - Os objetivos são um tanto quanto genéricos: basicamente, trabalhar pelo Direito à Comunicação e defender e aprofundar um espaço público para o debate e ações no campo da mídia e da comunicação. Reproduzo-os literalmente: Levando-se em conta a contribuição da Comunicação para a democratização da sociedade, nós concordamos em trabalhar para que o Direito à Comunicação seja reconhecido e garantido como fundamental, para assegurar os Direitos Humanos baseados nos princípios da participação genuína, justiça social, pluralidade e diversidade e naqueles que reflitam perspectivas de genêro, culturais e regionais;
a) Levando-se em conta a contribuição da Comunicação para a democratização da sociedade, nós concordamos em trabalhar para que o Direito à Comunicação seja reconhecido e garantido como fundamental, para assegurar os Direitos Humanos baseados nos princípios da participação genuína, justiça social, pluralidade e diversidade e naqueles que reflitam perspectivas de genêro, culturais e regionais;
b) Levando-se em conta a democratização das estruturas de comunicação, instituições e processos, nós enfatizamos a necessidade de defender e aprofundar um espaço público e aberto para o debate e ações que construam uma visão crítica da ética na comunicação, do desenvolvimento de políticas democráticas e do acesso equitativo e efetivo.”
O problema, como era de se esperar, sempre foi como alcançar estes objetivos, tendo em vista o pouco conhecimento que há sobre o assunto e a ausência de apoio financeiro pelas principais fontes de recursos (que são muito tímidas neste tipo de apoio). A maioria dos atores da sociedade civil ainda considera a mídia meramente como um meio para alcançar seus públicos e lamenta o fato de não conseguir uma melhor cobertura ou, talvez (como algumas organizações ambientais que têm sucesso neste sentido), desenvolvem estratégias sofisticadas para conseguir uma “boa” cobertura da mídia e vencer seus opositores, utilizando os mesmos métodos que eles. Infelizmente, estas atitudes ignoram o papel crucial da mídia na dinâmica da globalização neoliberal, impondo seu ordenamento na vida diária e sendo a cada dia mais controlada pelo setor privado por motivos puramente comerciais. A questão não é usar a mídia a seu favor – se você ignorar um contexto mais amplo, no final das contas, o tapete acaba sendo puxado debaixo de seus pés.
Entre outas questões, nós temos trabalhado extensivamente com a UIT (União Internacional de Telecomunicações) para conseguir um status formal para as ONGs (embora com pouco sucesso – a UIT não compreende realmente o que são as ONGs e, erroneamente, se percebe como uma organização técnica, basicamente). Trabalhando muito proximamente com outras iniciativas afins, nós também desenvolvemos a idéia de um Congresso Global sobre Mídia e Comunicação. Esta proposta foi muito bem recebida e ganhou ímpeto quando a Unesco decidiu organizar um Encontro Mundial sobre a Sociedade da Informação (World Summit on the Information Society, ou WSIS) para abranger temas ligados à mídia e à comunicação. Assim, nós decidimos nos focar nesta iniciativa.
De alguma forma, nós percebemos que este evento desempenhará um papel para a mídia e a comunicação - análogo ao que teve a ECO 92 para o meio ambiente, e Beijing para as mulheres. Ele oferece a oportunidade de criar um foco em redor do qual podemos nos organizar. Entretanto, nós também estamos cientes das limitações do WSIS (World Summit on the Information Society), da maneira como ele está sendo concebido. Ao lançarmos a iniciativa do CRIS, nós estamos tendo o cuidado de manter nosso olhar para o quadro como um todo, inclusive sobre a enorme necessidade de educar e mobilizar as organizações em torno do que está acontecendo no campo da mídia e da comunicação – e não pretendemos jogar todas as nossas fichas na mesa do WSIS. (Continua)
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