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Outro jornalismo é possível

Autor original: Marcelo Medeiros

Seção original: Serviços de interesse para o terceiro setor






“Um outro mundo é possível”. Esse é o lema do segundo Fórum Social Mundial (FSM), assim como foi o do primeiro. Para realizar esse outro mundo, são necessárias novas práticas, novas formas de trabalho e de pensamento. Com intuito levar essa idéia adiante no campo da comunicação foi criada, em 2001, a Ciranda da Informação Independente (CIIn). Seu objetivo era mostrar, ao mesmo tempo em que informava, a possibilidade de outro jornalismo. A idéia deu tão certo que este ano será posta em prática novamente.


O FSM abriga ao mesmo tempo palestras, debates e manifestações que acabam formando uma pauta muito extensa para os veículos de comunicação alternativos – geralmente com equipes reduzidas e sem muito dinheiro – cobrirem sozinhos. Porém a Ciranda permite que jornalistas compartilhem suas matérias – obviamente, com os créditos mantidos. Assim o trabalho é facilitado e o público interessado nos acontecimentos do Fórum tem mais informações, análises e fotos do que teria se cada agência fizesse apenas sua cobertura e tivesse que pagar para utilizar a dos outros. A internet se tornou o melhor meio para viabilizar essa proposta, pela facilidade de uso e pela idéia de liberdade nela ainda contida. As linhas editoriais de cada publicação são livres, desde que o jornalista autorize os “cirandeiros” a utilizar o material redigido ou fotografado. Desta forma, as informações da “cooperativa” se tornaram melhores e mais plurais do que a da grande imprensa.


Segundo o jornalista Antônio Martins, coordenador da iniciativa, a cobertura da Ciranda foi ótima. “Apesar de ter sido organizada na véspera do primeiro Fórum Social, ela apresentou a melhor cobertura. A grande imprensa menosprezou o evento, atacou-o por motivos pífios ou tentou folclorizar os acontecimentos. Apesar de não ter sido muito aprofundada, a Ciranda ofereceu um grande volume de informações, que mostraram tudo o que estava acontecendo em Porto Alegre”, diz.


A primeira Ciranda reuniu 30 órgãos de comunicação independente e publicou, ao longo dos cinco dias do Fórum, cerca de 200 textos, que por sua vez renderam uma média de 23 mil page views por dia – número surpreendente, de acordo com os organizadores. Para Paulo Lima, coordenador da Rits e membro da organização da CIIn em 2001, “o número realmente é impressionante, pois é próximo de portais de entretenimento de grandes grupos de mídia, com investimentos muito altos e grandes campanhas publicitárias. A Ciranda virou sucesso de visitação sem qualquer investimento a não ser a idéia da informação livre”. A Ciranda foi criada pela coordenação do FSM, com apoio da RITS e da Fábrica Digital, empresa carioca que disponibilizou o programa Publique! para colocar textos e fotos na rede mundial de computadores.


A expectativa dos organizadores é pelo menos dobrar o número de publicações em 2002, mas sem deixar cair a qualidade. Afinal, o objetivo principal não é obter grandes números, mas manter a articulação e a discussão. Mais jornalistas experientes são esperados, assim como intelectuais de renome para aprofundar as discussões e análises das notícias. Entre as publicações que já confirmaram presença estão a Rits, o Correio da Cidadania, o italiano UniMondo e os franceses do Le Monde Diplomatique e do Attac.


Os recentes acontecimentos do mundo – como a crise argentina e a Guerra no Afeganistão – e o fato de esta ser a segunda edição do evento devem chamar mais a atenção da grande imprensa para Porto Alegre. Para Martins, o comportamento da mídia deve ser ambíguo: “Por um lado, o crescimento do Fórum obriga a grande imprensa a tocar mais no assunto. Por outro, a atual conjuntura acentuou o pensamento único nas mídias, por isso temo que a cobertura seja tanto ou mais folclorizada quanto da primeira vez”.


Além de informar, o objetivo da Ciranda é questionar a idéia de que a informação e o pensamento são mercadorias. O compartilhamento da produção se deu de acordo com uma nova perspectiva: ao invés do tradicional copyright, foi instituído o copyleft. O jogo de palavras vai além da gramática: left, em inglês, significa esquerda – uma oposição ao pensamento único da direita –, mas também é o particípio de leave, ou seja, deixar, autorizar.


A intenção dos organizadores é manter a Ciranda ativa mesmo depois de 5 de fevereiro. O ritmo de produção de textos após o término do Fórum deve ser menor, pois a pauta não será mais comum a todos como em Porto Alegre. Porém o compartilhamento de informações é importante para manter a integração entre os veículos. Além disso, como há jornalistas do mundo inteiro participando, os leitores podem se informar mais sobre a situação em outras regiões geralmente ignoradas pela grande mídia.


A Ciranda, por si só, como diz Martins, já é a “afirmação de um sonho e de uma alternativa, assim como o próprio Fórum Social Mundial”. O uso do conteúdo produzido na capital gaúcha pela mídia geral, como aconteceu durante o ano passado, mostra a qualidade do trabalho alternativo e desmascara a posição de defesa de controle da informação por parte dos grandes veículos.


Definitivamente, outro jornalismo é possível.


Inscrições


Os jornalistas interessados em participar podem se inscrever no site da Ciranda e passar por um rápido treinamento para utilizarem o Publique!. A participação é gratuita. Tanto naquela página quanto nos sites www.portoalegre2002.net e www.forumsocialmundial.org.br mais informações sobre a iniciativa podem ser encontradas.


Marcelo Medeiros

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