Autor original: Graciela Baroni Selaimen
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Um outro mundo é possível, isso já não se discute. É muito difícil transitar por Porto Alegre – principalmente nos espacos reservados para a realização da segunda edição do Fórum Social Mundial – e manter resquícios de ceticismo e dúvida sobre a possibilidade de alternativas ao neoliberalismo e aos aspectos mais perniciosos da globalização.
Quem veio no ano passado sente a diferença: este ano, o número de participantes triplicou: há 13 mil delegados inscritos, mais de 700 oficinas organizadas, mais de 100 seminários, 2.800 jornalistas cadastrados e cerca de 40 mil pessoas chegando à capital gaúcha para o evento, vindas de 120 países. No Acampamento da Juventude, são 10 mil jovens do mundo inteiro reunidos.
Na primeira entrevista coletiva, antes da abertura oficial, o Comitê Organizador fez questão de frisar que o Fórum Social Mundial não é apenas um evento, mas torna-se um processo – afinal, as manifestações da sociedade civil contra o modelo neoliberal começaram antes de Porto Alegre. Segundo Maria Luisa Mendonça, do Centro de Justiça Global, a atenção agora se volta para a continuidade deste processo. A primeira edição do Fórum Social Mundial firmou um espaço comum, percebido como necessário por organizações e movimentos sociais do mundo inteiro. A segunda edição do evento mostra a dimensão do impacto das propostas de alternativas, e surpreende os organizadores com a enorme adesão a essas propostas.
Este ano, o Fórum pretende mostrar como um outro mundo é possível. Para isso, prioriza a participação de redes de atores e movimentos sociais, para que nas conferências sejam apresentadas propostas concretas. Segundo Maria Luisa, "este ano, as experiências que as redes vão apresentar nas conferências, dentro dos quatro eixos principais do Fórum, trazem mais riqueza ao debate". Chico Whitaker, da Comissão Brasileira de Justiça e Paz, afirma que "este evento vai ser marcado por uma dinâmica própria, que se incorpora à perspectiva do Fórum Social Mundial como um processo".
A idéia de continuidade e descentralização foi a tônica da reunião do Conselho Internacional do Fórum, realizada nos dias 28 e 29 de janeiro. Ficou decidido que ao longo de 2002 serão realizados vários Fóruns Sociais pelo mundo: estão previstos o Fórum Mediterrâneo, o Fórum Africano e o Fórum Asiático, por exemplo. Cada um desses encontros terá a sua própria dinâmica e os diferentes eventos vão se articular entre si e com o Fórum Social Mundial de Porto Alegre, em janeiro de 2003. Whitaker explica que o Fórum de Porto Alegre em 2003 será um momento de convergência e continuará acontecendo na mesma data do Fórum Econômico Mundial.
Paz possível
Os membros do Comitê Organizador foram unânimes ao afirmarem que, depois dos atentados terroristas em Nova York, o Fórum Social Mundial não pode ser o mesmo. Este é o primeiro evento de movimentos sociais, de caráter internacional, realizado depois dos ataques ao World Trade Center. A questão da paz é central em todos os debates – e no contexto do Fórum Social Mundial, entende-se a paz como fruto do combate à opressão. Oded Grajew, do Cives, ressalta que o mundo só terá paz quando houver justiça social e desenvolvimento sustentável. Para ele, os acontecimentos de 11 de setembro servem para explicar o contraponto que o Fórum Social Mundial representa, ao buscar a mudança em escalas de valores, no mundo.
Os organizadores pretendem realizar um Fórum Social em Jerusalém. Já foi formado um grupo de trabalho para tentar realizar esta empreitada, mas Oded assume que a tarefa não é fácil: "Vai ser muito difícil, mas temos que dizer que o outro mundo que queremos é um mundo de paz. No segundo semestre será feita uma iniciativa mais efetiva para tentar levar o FSM para este espaço simbólico que é Jerusalém".
Resultados
Quanto à expectativa por uma declaração final ou por um documento com propostas, Carlos Tibúrcio, do Attac, é categórico: "O Fórum Social Mundial não fala pelos movimentos sociais do mundo. É um espaço para a construção de agendas e pontos de luta comuns. Não há obrigatoriedade de votar ou decidir ações comuns. O que se pretende aqui é mostrar que queremos quebrar a tentativa de imposição de um pensamento único, especialmente após os atentados de setembro, quando tenta-se criminalizar os que se opõem ao neoliberalismo. Queremos mostrar que os que estão aqui começam a construir um pólo de contra-poder no mundo. Cada dia mais, a sociedade civil está presente na influência sobre o futuro do mundo".
Em seu discurso durante a cerimônia de abertura do Fórum, Cândido Grzybowski, do Ibase, lembrou que este evento pode trazer mudanças sem efeitos práticos a curto prazo, mas altera as condições sociais e políticas de nossa geração. Para ele, o simples fato de imaginarmos que um outro mundo é possível já é um ato de criação deste mundo. "Queremos ser parte fundamental do processo de construção do novo mundo", diz. Segundo Cândido, o desafio que se apresenta é alargarmos a nossa visão deste momento histórico e perceber as possibilidades nele contidas.
Visibilidade
Sergio Haddad, da Abong, conta que o balanço final do FSM 2001 apresentou um número de pessoas muito acima do esperado, assim como uma grande quantidade de agendas e articulações pós-Fórum. Segundo ele, hoje há mais preocupação em dar uma maior visibilidade às propostas do Fórum Social Mundial. Haddad exemplifica citando o site do evento, onde há uma grande quantidade de documentos traduzidos, e a Ciranda da Informação Independente, que possibilita um olhar plural e alternativo sobre o que acontece em Porto Alegre. Sergio assegura que o site vai ser um espaço cada vez mais importante, sendo o ponto de convergência dos resultados dos debates nos diferentes Fóruns que acontecerão a partir de 2002. Haddad tem razão sobre a importância do site: antes mesmo da abertura oficial do Fórum, a Rits (que sedia o site do evento e o da Ciranda da Informação Independente) já registrava 500 mil page views por dia no endereço do Fórum Social Mundial – comparável aos números de visitação de grandes portais comerciais.
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