Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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O Dia Mundial da Água está aí de novo. Em 22 de março próximo a data é celebrada pela décima vez - foi instituída na Eco 92. Desta vez, há pequenos avanços a se comemorar e muito sobre o que se refletir. Um divisor de águas na gestão de recursos hídricos no país aconteceu agora, às vésperas da efeméride: na quinta-feira, 14 de março, foi deferida pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) a solicitação de cobrança pelo uso da água retirada do rio federal Paraíba do Sul, que passa pelos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. O pedido havia sido feito pelo Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (Ceivap), uma das entidades participantes da gestão dos recursos hídricos do Paraíba do Sul. "A aprovação da solicitação aconteceu sem problemas, apenas com alguns protestos de representantes ligados à agricultura, pois para eles não é nada interessante essa decisão", comentou Cláudio Serricchio, coordenador do escritório de Resende do Ceivap. A entidade prevê começar a efetuar a cobrança no segundo semestre de 2002, depois de cadastrar os usuários dos recursos da bacia. A decisão do CNRH é a primeira no país envolvendo um rio federal (em uma bacia estadual no Ceará já está acontecendo o pagamento pela utilização da água e há informações de que um comitê de bacia paranaense também já entrou com pedido).
A possibilidade de cobrança pelo uso da água - assim como os comitês de bacia hidrográfica - foi criada pela Lei 9.433, de 1997, também conhecida como a Lei da Água. Segundo o documento, compete aos Comitês de Bacia Hidrográfica promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos; articular a atuação das entidades, aprovar e executar o Plano de Recursos Hídricos da bacia e estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos, entre outras coisas. Essa medida - cobrar uma taxa das empresas, indústrias, concessionárias de esgoto e distribuição de água, fazendas - é o principal instrumento previsto em lei para ajudar na gestão dos recursos hídricos e conta com a aprovação de representantes de organizações da sociedade civil. Com os usuários de recursos tendo que pagar pelo uso da água e pela devolução da água com poluição aos rios, a expectativa é lógica: uso cada vez mais racional da água. "Se a pessoa paga pelas besteiras que faz com o meio-ambiente, vai pensar duas vezes antes de fazer de novo", destaca José Chacon de Assis, um dos articuladores do Movimento Cidadania pelas Águas. As empresas, por exemplo, tendem a fazer uso múltiplo da água. Além disso, "em atividades como a agricultura, onde a irrigação consome muita água e o desperdício é muito grande, a busca por formas racionais de uso se fará necessária", ressalta Maria do Carmo Zinato, pesquisadora do Florida Center for Environmental Studies, membro da Comissão Organizadora das Cúpulas de Informação sobre Água e criadora e coordenadora do Fonte d’Água.
No ano passado, o mau uso da água já mostrou o que é capaz de provocar. O racionamento de energia atingiu quem queria - ou não - ver o problema. O fato recebeu diversas explicações possíveis. Mas, o que não se pode negar é que, considerando-se que a matriz energética brasileira baseia-se em hidrelétricas, é necessário reconhecer que a falta de água, teve, sim, papel no racionamento, apesar dos recursos hídricos superficiais gerados no Brasil representam 50% do total dos recursos da América do Sul e 11% dos recursos mundiais, totalizando 168.870 m3/s. (Fonte: Estudo “A gestão da água no Brasil: Uma primeira avaliação da situação atual e das Perspectivas para 2025”, realizado pelos professores e pesquisadores Carlos E. M. Tucci, Ivanildo Hespanhol e Oscar de M. Cordeiro Netto). A falta d'água não se deu exclusivamente pela deficiência de chuvas (que também teve sua parcela de participação), mas pela má gestão e pela falta de planejamento por parte dos órgãos e autoridades competentes. A ONG Ilumina, que denuncia os problemas relacionados ao modelo energético brasileiro, diz em nota oficial sobre o fim do racionamento: "Ainda persiste a falta de investimentos em geração e transmissão de energia elétrica, causando o descompasso entre oferta e demanda que não resistiu nem a uma seca moderada, como esta dos últimos anos." A respeito disso, Maria do Carmo Zinato afirmou: "O que acontece é que as pessoas estavam retirando e retirando a água da natureza. Chegou uma hora em que não deu vazão." Mas, o que investimento e planejamento hidrelétrico têm a ver com uso da água fluvial por empresas e concessionárias de serviços? São todos parte de um mesmo objetivo-desafio: o manejo integrado de recursos hídricos, ou em termos simples, o uso respeitoso e consciente da água do planeta.
Atuação das organizações nos comitês
Os Comitês de Bacia Hidrográfica são formados por representantes dos governos federal, estadual e municipal, dos usuários das águas e das organizações da sociedade civil. É neste âmbito que as ONGs e cidadãos podem fazer a diferença, atuando diretamente na deliberação e gestão dos recursos de cada bacia. Nascido em Brasília, em 1996, o Movimento da Cidadania pelas Águas é grande aliado dos comitês de bacia. Primeiro, porque atua em âmbito nacional, contando com mais 130 centros de referência em todo o país. Segundo, porque tem a proposta de transformar estes centros em embriões de comitês de bacia hidrográfica. Essa proposta está sendo reafirmada no 4º fórum nacional do movimento, que está sendo realizado de 14 a 17 de março, em Petrópolis, RJ.
No entanto, apesar do resultado já gerado pela iniciativa exemplar do Ceivap, muito ainda falta ser feito pelos Comitês de Bacia hidrográfica. A começar pela constituição dos próprios, que depois de cinco anos desde sua criação pela Lei das Águas, continuam raros e pouco articulados. Alguns acreditam que falta mobilização e articulação tanto por parte das ONGs quanto por parte dos governos regionais. Essa é a opinião, por exemplo, de José Chacon: "Eles não estão alertas para ter esta participação". Maria do Carmo Zinato acredita que, além disso, a disseminação de informação é fator crucial para que a articulação das organizações cresça. Além disso, a pesquisadora defende que os cidadãos também se comprometam, pessoalmente: "O cidadão precisa participar em suas casas, regulando banhos longos, goteiras e todo tipo de desperdício." Nesse sentido, a Cúpula Mundial de Informação sobre Água vem discutindo formas de mobilizar os veículos de comunicação - principalmente os existentes na Internet - para que passem a dar mais destaque às questões relacionadas à água, levando, assim, as discussões a uma parcela maior da população. Esse vai ser de novo o mote do encontro deste ano, previsto para outubro.
Outra iniciativa que chama as pessoas a participarem das discussões sobre a água é o projeto “Voz da Água”, lançado com o intuito de coletar opiniões e comentários sobre esta temática, de pessoas de todo o mundo. O objetivo do projeto é criar um banco de dados de opiniões, comentários e idéias que serão apresentados no III Fórum Mundial da Água, que acontecerá entre 16 e 23 de março de 2003 em Kyoto, Shiga e Osaka.
Quem quiser saber um pouco mais sobre o Dia Mundial da Água e sua história pode acessar www.worldwaterday.org.
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