Autor original: Mariana Loiola
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Lançada em março, em uma parceria entre o Núcleo de Pesquisa da Secretaria de Estado de Segurança Pública, o Viva Rio e o ISER, a Pesquisa de Vitimização 2002 vai mostrar dados sobre a incidência de crimes na região metropolitana do Rio de Janeiro. A pesquisa está mobilizando cerca de 30 jovens do projeto Zeladores Comunitários da Cidadania, que receberam qualificação profissional para atuarem como pesquisadores. Eles vão às ruas perguntar a 4 mil moradores do Rio se foram vítimas de algum crime ou algum tipo de violência no ano passado. Em entrevista à Rets, Michel Misse, um dos coordenadores da pesquisa, fala sobre a contribuição desse trabalho para os jovens pesquisadores e para a questão da segurança pública.
Rets – O que é o projeto Zeladores Comunitários da Cidadania?
Michel Misse – O projeto Zeladores Comunitários da Cidadania é uma iniciativa do movimento Viva Rio e da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, com a interveniência do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro – Rio Segurança – e o apoio do Plano Nacional de Segurança Pública, através do Ministério da Justiça. Envolve cerca de 400 jovens de várias comunidades carentes do Grande Rio, que recebem bolsas de estudo para concluírem o primeiro grau, curso de informática e que se envolvem na prestação de serviços à comunidade carioca através de diversos subprojetos que recolhem demandas e reclamações da população em várias áreas (transportes, meio-ambiente, saneamento etc.). Um dos subprojetos é a Pesquisa de Vitimização 2002, que envolve cerca de 10 por cento dos bolsistas, selecionados entre os melhores de cada turma.
Rets – Como surgiu a idéia de elaborar a Pesquisa de Vitimização 2002?
Michel Misse – Em vários países, são realizadas regularmente pesquisas de vitimização. No Brasil, só foi realizada uma vez, em 1988, pelo IBGE. No Grande Rio, foi realizada uma em 1996, pela Fundação Getúlio Vargas e pelo ISER. Estava na hora de uma nova pesquisa e pensamos em aproveitar o projeto Zeladores para realizá-la. Assim, formávamos recursos humanos para pesquisa entre jovens carentes de trabalho qualificado, dando-lhes treinamento como entrevistadores, e ao mesmo tempo realizávamos uma pesquisa indispensável para a orientação de políticas de segurança na região metropolitana do Rio de Janeiro.
Rets – Quais são os objetivos da pesquisa?
Michel Misse – A pesquisa pretende saber, através de uma amostra qualificada da população do Grande Rio, na faixa etária de 10 a 65 anos, quantos foram vítimas de furto, roubo, agressão física ou outras violências, e caracterizar o perfil social das vítimas de crimes e violência na cidade. Os resultados poderão ser comparados com a pesquisa realizada em 1996 e permitirão compreender melhor o problema da violência em nossa cidade. Permitirão comparação também com as estatísticas oficiais, que contabilizam apenas os crimes registrados pela polícia, mas não os crimes que não chegaram a ser registrados.
Rets – Quais são as principais questões que norteiam a pesquisa?
Michel Misse – Queremos saber, entre outras coisas, se o estilo de vida da vítima pode ou não torná-la mais vulnerável aos criminosos, se os agressores são conhecidos ou não da vítima (muito da violência doméstica não chega a ser registrado na polícia), se existe alguma relação entre nível de renda e vulnerabilidade a crimes contra patrimônio (furto e roubo), as razões que as pessoas dão para não registrar determinados crimes na polícia, a relação da população com a polícia e outros órgãos da administração da Justiça, a diferença entre a percepção e o medo da violência entre as pessoas e a violência realmente existente etc.
Rets – Qual é a importância da participação dos jovens zeladores nessa pesquisa?
Michel Misse – A importância é dupla: eles sairão da pesquisa preparados para trabalharem em pesquisas semelhantes daqui para a frente, terão uma profissão nova como opção de vida; além disso, estão contribuindo concretamente para a cidadania ao realizarem uma pesquisa como essa e devolverão o que aprenderam à sua comunidade: direitos humanos, necessidade de associar-se para defender o bem comum, o direito à reivindicação de melhores condições de vida, a compreensão dos problemas que afetam as pessoas em sua cidade, o que o Estado vem fazendo e o que ainda pode fazer etc. O projeto forma cidadãos, forma profissionais e oferece à sociedade uma pesquisa importante que lhe permitirá refletir sobre sua real situação atual.
Rets – Como os dados apontados poderão contribuir para a questão da segurança pública no Rio de Janeiro?
Michel Misse – De muitas maneiras. Eles servem aos pesquisadores, que poderão comparar com os dados de 1988 e 1996 e tirar conclusões científicas importantes; eles servem aos formuladores de políticas de segurança, na medida em que oferecem um retrato mais fiel da situação atual de criminalidade na região metropolitana do Rio do que as estatísticas oficiais; servem também à polícia, que poderá identificar problemas na sua relação com a população ou contabilizar a diferença entre o que é registrado e o que não é, e as razões disso; serve, enfim, a qualquer cidadão interessado em saber como andam realmente as coisas – a pesquisa abrangerá nas entrevistas tudo o que for reportado como tendo acontecido durante todo o ano de 2001.
Rets – Quando serão divulgados os resultados da pesquisa?
Michel Misse – O trabalho de campo está começando e nosso cronograma prevê três meses de trabalho. É preciso que a população colabore e receba os jovens em suas casas, respondendo com sinceridade ao questionário, que é anônimo. Acredito que até o final de junho já estejamos em condições de divulgar os principais resultados. O relatório final, que será publicado, deve sair no início do segundo semestre deste ano.
Michel Misse é Doutor em Sociologia e professor do Departamento de Sociologia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Coordena o Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (NECVU) da UFRJ e o Núcleo de Pesquisas do Instituto de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro.
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