Autor original: Maria Eduarda Mattar
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“Grite, cante, berre, faça um estardalhaço”. É assim, no grito, que a campanha Make Trade Fair – Comércio com Justiça, recém-lançada pela Oxfam International pretende chamar a atenção mundial para a necessidade se rever as regras dos acordos comerciais entre países ricos e países pobres ou em desenvolvimento, assim como as que norteiam as instituições financeiras internacionais. A campanha teve um lançamento de impacto, com ações simultâneas em todos os países onde a Oxfam mantém sedes: no último dia 11, às 11h, Brasil, África do Sul; Alemanha; Austrália; Bangladesh; Bélgica; Canadá; China; Espanha; Estados Unidos; Holanda; Gana; Índia; Inglaterra; Irlanda; México; Nova Zelândia; Suíça; Uganda e Senegal participaram do acontecimento.
Segundo Katia Maia, assessora para Mídia e Advocacy de Oxfam GB no Brasil e pessoa que responde pela iniciativa no país, a campanha nasceu da observação nas últimas duas décadas, principalmente dos fatos mais recentes, dos processos de liberalização comercial dos países em desenvolvimento. Essa observação gerou também o documento “Mudar as regras: comércio, globalização e luta contra a pobreza”, relatório global sobre o comércio internacional e suas implicações sobre as nações menos favorecidas, que funciona como um dos pilares e referência-base da campanha.
O objetivo principal dessa nova iniciativa é mudar as regras que regem a atuação das instituições financeiras internacionais, assim como os acordos comercias bi ou multilaterais. Para a Oxfam, são algumas destas regras que perpetuam a pobreza e a miséria nos países que lutam para se desenvolver. “Se África, leste asiático, sul da Ásia e América Latina tivessem sua participação nas exportações mundiais aumentada em um por cento, os ganhos de renda resultantes poderiam retirar 128 milhões de pessoas da pobreza”, diz o relatório Mudar as Regras.
O documento diz ainda que, se os países em desenvolvimento aumentassem sua participação nas exportações mundiais em apenas cinco por cento, US$ 350 bilhões seriam gerados, “isto é, sete vezes mais do que as verbas que esses países recebem em forma de ajuda. Os US$70 bilhões que a África geraria com o aumento de 1% na sua participação das exportações mundiais é aproximadamente cinco vezes a quantia concedida à região na forma de ajuda e alívio de dívida.” Mais do que ver no comécio uma fonte de benefícios financeiros, o relatório e a campanha procuram mostrar que, se forem oferecidas as oportunidades e condições justas para que eses países passem a competir no mercado internacional, o crescimento das exportações pode ser um motor mais eficiente na redução da pobreza do que a ajuda em espécie, podendo trazer vantagens em outras áreas, como educação, saúde etc.
Outro ponto importante identificado pela Oxfam é o que eles chamam de duplo padrão: “Os países ricos querem que os mercados estejam abertos aos seus produtos, mas tomam medidas protecionistas para não deixar que produtos estrangeiros entrem em seus mercados”, explica Katia. Segundo ela, um dos indícios disso é o fato de os países ricos gastarem U$ 1 bilhão por dia em subsídios para suas indústrias agrícolas. Além disso, quando os países em desenvolvimento exportam para os mercados dos países ricos, enfrentam barreiras tarifárias quatro vezes maiores do que as enfrentadas pelos países ricos. Essas barreiras lhes custam US$ 100 bilhões ao ano – o dobro do que recebem como ajuda. Estas informações também estão no relatório Mudar as Regras.
O Brasil teve algumas experiências recentes que comprovam a afirmação. Uma delas foi a crise causada pelo Canadá em concorrência com o Brasil para a fabricação de aeronaves. Outra mais recente ainda é a decisão tomada pelos EUA para proteger os fabricantes de aço norte-americanos, atingindo diretamente as exportações brasileiras.
Atuar para que práticas injustas como estas não sejam mais executadas é a função da Comércio com Justiça. E, para isso, o instrumento mais eficaz identificado é a mobilização e a participação popular. Por isso o lema “Grite, cante, berre, faça um estardalhaço”. É ele que dá o tom dos dois sites criados – um em inglês e outro em espanhol – para articular a campanha. Estão previstos realização de abaixo-assinados, mobilizações públicas - inclusive em encontros de instituições importantes, pressões junto aos governos dos países, entre outras atividades.
Quando perguntamos sobre qual é a resposta que se espera da OMC, do FMI e do Banco Mundial para as reivindiações da campanha, Katia afirmou que “não se pode esperar uma resposta em função desta campanha, dessa iniciativa em particular. Mas, sim, de uma conjunção, da mobilização da sociedade e que essa faça pressão”. Essa participação de todas as pessoas possíveis é importante para quebrar um ciclo vicioso que os países pobres por si próprios não conseguem mudar. A única alternativa que eles têm em relação às organizações financeiras internacionais é a de não aceitar as pressões e condicionalidades impostas. No entanto, aceitam-nas porque não têm opção, eles têm pouco espaço, pouco peso dentro das instiuições representativas internacionais, tais como OMC e FMI. Esse é um dos motivos pelos quais a campanha terá força maior nos países do hemisfério norte: são eles que têm mais poder dentro das instituições cujas regras se quer mudar.
A campanha Comércio com Justiça tem previsão de duração de três anos. Em cada um deles será trabalhado um assunto-chave. No momento, o assunto na berlinda é a queda brusca nos preços de commodities (ver box ao lado), provocada pelos subsídios praticados pelos países ricos, que destroem a produção local dos países pobres. “Às vezes, o consumidor prefere comprar produtos importados aos produzidos no seu próprio país, pois, em função do subsídio, o produto de fora chega mais barato.”
No Brasil, a campanha ainda está começando a ser articulada. “Tudo ainda está muito novo e as formas de ação em cada país estão sendo definidas. Por isso estamos em processo de diálogo com outras organizações, construindo parcerias nacionais, para tocar a campanha no Brasil”, explica Katia. Para entrar em contato e saber mais informações sobre a campanha, basta ligar para (61) 225-2979 ou escreva para kmaia@oxfam.org.br.
Quem quiser ler o relatório “Mudar as Regras - comércio, globalização e luta contra a pobreza”, clique aqui para fazer o download do relatório completo ou do resumo executivo.
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