Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Escola da rua
O Projeto Excola nasceu no bairro da Lapa, Rio de Janeiro, em 1989, com a proposta inicial de prevenir e tratar o uso da cola por jovens da região. Daí o nome ex-cola. Segundo a coordenadora, Elizabeth Serra Oliveira, a ação principal é prevenir o consumo abusivo. “Mas, não dá para discutir tratamento e prevenção sem pensar na vida do indivíduo, sem considerar o ambiente em que vive”, afirma ela. Por isso, a iniciativa trabalha hoje com projetos integrados de educação popular, gênero e comunicação. As ações de Educação popular na rua incluem, além da ação direta com os meninos em situação de rua, as subdivisões “Jovens Mães em Situação de Risco” e a “Rádio Madame Satã”.
As atividades diretamente na rua eram realizadas no início durante a noite, com o objetivo de fazer os jovens refletirem sobre a sua situação: nas circunstâncias que a vida na rua produz, sobre a violência, as possibilidades de defesa, e, fundamentalmente, os efeitos sobre o corpo do consumo abusivo de drogas. Atividades esportivas e musicais balizaram o processo desde o início. Foi assim que surgiu a rádio Madame Satã, oportunidade de ligação e integração entre os jovens atendidos. A emissora é comunitária, gerida pelos próprios meninos, ex-usuários de cola. “A Rádio é uma nova linguagem, administradas pelos meninos, que serve de ligação entre eles”, afirma Elizabeth.
Já o programa Jovens Mães em Situação de Risco surgiu também a partir de uma necessidade observada nas ruas, onde várias meninas se tornavam mães sem orientação ou apoio. As oficinas de arte incluem música e teatro.
Finalmente, o Programa de Construção de Autonomia consiste no estímulo à manutenção de moradia, onde os meninos são os responsáveis por tomar conta, pagar as despesas e cuidar dos lares – pequenos apartamentos na região – conseguidos pelo projeto (que paga somente o aluguel). Segundo Elizabeth, a ajuda na obtenção de moradias começou a ser feito depois que a equipe do Excola percebeu que grande número de jovens, que estavam em abrigos iam para as ruas após os 18 anos, muito mais abandonados do que antes. Assim, tirando eles das ruas, o projeto procura afastá-los da possibilidade de entrarem em contato e virarem consumidores de drogas.
Experiência como arma
A Associação Brasileira de Dependentes Químicos (ADQR), foi fundada há seis meses e é uma das poucas ONGs do setor administrada por ex-usuários de drogas, pessoas que já passaram por tratamentos em clínicas diversas, e resolveram trazer para si a responsabilidade de falar sobre dependência química. E eles têm a experiência para isso. Um dos fundadores, Marcelo Rocha, conta que o principal objetivo da organização é “dar voz ao dependente químico, que sempre foi discriminado, sempre foi mostrado com tarjas pretas, como se fosse vergonhoso”. “Queremos desfazer essa imagem estigmatizada e lutar contra os maus-tratos nas clínicas de tratamento de dependentes químicos”, completa Marcelo, com a autoridade de quem é dependente químico (uma vez tendo a doença, ela é controlada, mas não extinta), começou tratamento há sete anos, passou por quatro clínicas e atualmente trabalha em uma instituiçao de tratamento.
Marcelo acompanhou e ajudou na execução da série de reportagens que o jornalista Tim Lopes, da TV Globo, assassinado em junho por traficantes no Rio, realizou nas clínicas de tratamento a deficientes químicos e resultaram em denúncias de trabalho forçado, desrespeito à integridade física e psíquica dos pacientes e muitas outras más práticas. Segundo ele, a maioria das clínicas realiza esses tipos de arbitrariedade. Como muitos dos integrantes da ADQR sofreram na pele esses maus-tratos, a denúncia e luta contra isso é uma das principais metas da instituição. “Além disso, existe muito preconceito, inclusive entre nós. O sujeito que passa por um tratamento, muitas vezes esconde isso depois. Assim, a imagem que fica é a do cara descompensado, desequilibrado. Precisamos mostrar que tem retorno, que isso pode mudar”, afirma ele.
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