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Na linha de frente

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets







Mas se a produção de informação e conhecimento é importante para a formulação de políticas, a militância na comunidade, ali onde a violência ocorre com maior intensidade, é fundamental. "No Espírito Santo não tem nem Lei nem Justiça, a gente luta pela misericórdia de Deus", diz Maria das Graças Nascimento Nacorte, de 52 anos, que teve seu filho assassinado por policiais militares e hoje preside a Associação de Mães e Familiares de Vítimas da Violência (AMFAVV), do Espírito Santo, razão pela qual sofre constantes ameaças de morte. A Associação foi fundada em junho de 2001 por Maria, que queria levar os assassinos de seu filho Pedro Nacorte Filho (de 26 anos, sem antecedentes criminais, morto com 5 tiros no rosto no centro de Vitória após uma revista policial) à Justiça. Atualmente a associação reúne 80 mães - a maioria teve filhos mortos por PMs. A associação tem apenas uma linha de telefone e depende do trabalho voluntário de psicólogos e advogados - que fornecem seus serviços para acompanhar as famílias ao IML (Instituto Médico Legal, para pegar laudos cadavéricos), encaminhamento de processos no Fórum, idas à delegacia. No ano passado, um dos advogados da associação foi assassinado. "O crime organizado tomou conta do Espírito Santo", diz Maria das Graças. "Sou uma mulher marcada para morrer. Aqui a PM mata e o governo apóia", diz.

Segundo ela, os crimes praticados pela polícia e organizações paramilitares como a escuderia Lê Coq, são acobertados pelo medo e pela conivência das autoridades. "Eles dizem para as mães que nos procuram que se elas denunciarem eles voltam e matam a família toda. Eu digo uma coisa para elas: onde jorra o sangue do seu filho, jorra o seu sangue também", diz.

A associação, segundo sua presidente, recebe mais apoios de fora do país do que de dentro. Há dois meses ela entregou um dossiê ao representante da Anistia Internacional Tim Cahil e fornece informações à Corte Interamericana de Direitos Humanos. Apesar das dificuldades, ela avalia que o trabalho tem dado frutos: "Uma luz no fim do túnel começou a aparecer. Salvamos muitas vidas de jovens marcados para morrer". A associação vem seguidamente denunciando a prática de tortura por parte de policias. Há casos em que a entidade, após muita pressão, consegue fazer com que um pedido de prisão saia da delegacia, mas aí pára no Ministério Público. "O promotor alega que não tem tempo para olhar o processo", diz.

Educação

Se não enfrentam a situação de desespero do Espírito Santo, em Pernambuco, entidades buscam o trabalho educativo na comunidade para reduzir o problema da violência.

O Movimento Tortura Nunca Mais, de Recife, aposta na formação e educação, de adultos e crianças, como forma de diminuir a violência nas áreas em que vivem. Desde o ano passado, a instituição realiza o Ciranda da Paz, concretizado em duas escolas municipais, em cada uma das 14 cidades atendidas pelo projeto. As escolas foram escolhidas pelas prefeituras que tiveram como critério a localização em áreas violentas. São envolvidos nas ações policiais, professores, alunos e pais, que participam de capacitações e mini-fóruns. Segudo Veridiana Gouveia, coordenadora do projeto, um grupo de música formado por rapazes entre 14 e 18 anos, o Maracatu Nação da Paz, foi formado na primeira edição do projeto, em 2001, e participa dessa segunda edição ajudando nos encontros a passar a mensagem de paz pretendida.

Paralamente às ações, é realizada uma pesquisa com todos que participam do projeto. O levantamento feito ao final das atividades de 2001 revelou que houve diminuição dos atos infracionais dentro da escola e no seu entorno. "Isso já é um dos nossos objetivos", afirma Veridiana. Perguntada sobre o que falta para que as ações de combate à violência sejam mais eficientes, ela respondeu: "As idéias com relação a projetos vêm de cima para baixo. Não deve ser assim. Você tem que conhecer a realidade do seu público, falta envolver o público".

 


Maria Eduarda Mattar e Rogério Pacheco Jordão.

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