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Cidadania em cena <i>(continuação)</i>

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets

Em termos de levantamento de auto-estima de comunidades, a Associação Imagem Comunitária - AIC, de Belo Horizonte, também é digna de Oscar. A AIC aposta no uso de meios audiovisuais para conscientizar e incluir. O início das atividades se deu com a TV Sala de Espera, TV comunitária realizada de 1993 a 1997 nos bairros Paulo VI e Ribeiro de Abreu, nordeste da capital mineira. A programação englobava saúde e qualidade de vida e era veiculada nas salas de espera dos postos de saúde dos dois bairros. As atividades da AIC se desenrolaram em direção à realização de capacitações e produção de vídeos educativos e comunitários. Hoje em dia, cerca de 10 jovens entre 10 e 18 anos, moradores do Alto de Vera Cruz participam de oficinas uma vez por semana, onde aprendem todo o processo para produção em vídeo.


Segundo a coordenadora da AIC, Rafaela Lima, a organização passou a atuar no Alto de Vera Cruz por demanda da própria comunidade. Atualmente, depois de ensinados pela Associação e de posse do equipamento de filmagem, os jovens estão produzindo dois documentários: um sobre a comunidade e outro sobre futebol. "Acontece uma coisa muito legal de valorização das pessoas. Eles chegam para a gente e dizem: 'antes o nosso bairro era notícia só por causa de tragédias, agora ele aparece pelas coisas que fazemos'. Isso dá motivação a eles, aumenta a auto-estima, eles vêem que têm potencial e, o que é mais interessante, estimula o debate público", afirma Rafaela. Os vídeos produzidos por essa turma já foram exibidos em lugares diversos, incluindo o Centro de Cultura de Belo Horizonte e o Ciame (Centro Integrado de Atendimento ao Menor).


Nós, no cinema


No Rio, outros jovens também estão tomando as rédeas de produções próprias. Trata-se do grupo Nós do Cinema, surgido durante as filmagens do filme Cidade de Deus, a ser lançado no Brasil em 30 de agosto. Selcionado para a mostra oficial de Cannes, o longa começou a sua história na própria Cidade de Deus, comunidade pobre da capital carioca, que dá nome ao filme. Em 2000, o diretor Fernando Meirelles e a co-diretora Katia Lund optaram por utilizar atores não-profissionais para compor o elenco de 100 jovens necessários para o filme. Assim, fizeram testes na Cidade de Deus e no Vidigal. Durante as gravações, perceberam que os meninos e meninas apresentavam interesse no por trás das câmeras, além de atuar. Perceberam aí o potencial de novos diretores, produtores e editores. Era o início do Nós do Cinema.


Dos jovens que participaram do longa, hoje 30 freqüentam as reuniões semanais do grupo. Muitos deles estão estagiando em produtoras badaladas como Vídeo Filmes, dos irmãos Salles, a TV Zero e a O2 Filmes (produtora do filme Cidade de Deus). É o caso de Shirley Cruz, de 26 anos. Ela conta que o grupo está produzindo atualmente um clipe do músico Adão (morador da Cidade de Deus que também participou do filme, fazendo papel de Exú), além de participar da produção de capítulos para uma minissérie de TV. "Nossa intenção é virar uma ONG, termos uma sede própria e formar profissionais técnicos e de atuação", afirma Shirley, no estágio na O2. Ela conta também que toda a produção do Nós do Cinema é coletiva, tudo é decidido por todos, usando-se a votação quando há impasse. "Aprendemos tudo fazendo. Alguns profissionais especializados nos orientam, mas não interferem no processo produtivo". Muitas destes orientadores são chamados pela diretora "ausente" (como ela mesma se define) do grupo, Katia Lund. Ela mesma segue a linha de não interferir. Apenas comparece a algumas reuniões, joga idéias no ar e deixa que os jovens decidam como concretizar.


"Sabe-se que nesse campo de cinema ou se vem de uma família de cineastas ou se tem padrinhos. Nós não temos padrinhos, temos uma mãe. A Katia diz que não deixamos nada a dever para nenhuma produtora boa. Diz que é só abrir a porta, que podemos entrar e caminhar. E é isso que o Nós do Cinema faz pela gente", diz Shirley. E conclui: "O grupo mudou minha vida totalmente e se você perguntar para cada integrante do Nós do Cinema, todos responderão a mesma coisa. A questão é ter chance de mostrar, e é isso que acontece".


Corta.
Fim.


 


Maria Eduarda Mattar

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