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Longa batalha pelos direitos humanos

Autor original: Mariana Loiola

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor

O lançamento do livro "Homicídios no Pará de 1996 - 2000: da visibilidade à construção de uma cultura sem violência", no último dia 8 de agosto, marcou as comemorações dos 25 anos de existência da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH). A publicação é produto de pesquisa realizada pela SPDDH sobre violência contra a vida, com base na coleta de informações registradas pelo Banco de Dados sobre Homicídios mantido em parceria com o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), articulação à qual é filiada. O livro sistematiza e analisa os homicídios no Pará e enumera propostas para que seja possível a mudança de uma cultura marcada pela violência (caracterizada pelo grande número de mortes violentas), destacando a formulação e implementação de políticas públicas nas áreas de segurança e justiça. Foram analisados homicídios envolvendo mulheres, crianças e adolescentes, afro-descendentes e agentes do sistema de Segurança Pública no Estado do Pará.


Fundada em 1977, no período da ditadura militar no Brasil, a SPDDH, através do trabalho voluntário, intervinha, neste período inicial, em todos os casos de violência e violação de direitos humanos. Atenção especial era dada aos direitos civis e políticos, como a liberdade de expressão, o direito de ir vir e a anistia política. Era o início da história da entidade sem fins lucrativos, criada com a missão de valorizar e defender os direitos humanos e a democracia.

Atuação na área rural

Na transição para a década de 1980, a SPDDH priorizou a atuação na zona rural. Ainda hoje, é uma das poucas entidades do Pará que prestam assessoria jurídica a entidades e articulações rurais e urbanas – combatendo a impunidade nos casos de mortes violentas, despejos arbitrários e mortes no campo. Já na década de 1990, a prioridade foi a intervenção na política de segurança pública.


Atualmente, a entidade foca sua atuação na garantia da participação da sociedade civil nas políticas públicas; na garantia da defesa de direitos humanos em casos de violação ou eminência de violação; e na participação na formação da cultura de direitos humanos. A SPDDH acompanha casos exemplares de violação de direitos humanos, como homicídio, tortura, racismo, violência sexual contra criança, despejos de ocupações urbanas e rurais e casos de indenização contra o Estado. A entidade trabalha ainda na capacitação de novos profissionais no acesso das organizações regionais aos organismos internacionais como Organização das Nações Unidas (ONU) e Organização dos Estados Americanos (OEA).


Segundo Vera Tavares, presidente da SPDDH, dos anos 70 para cá a conjuntura do país mudou, mas as violações dos direitos humanos permanecem. "O nível de intervenção também mudou: saímos do campo da denúncia para uma fase mais propositiva." Apesar de haver muito ainda a se fazer, a intervenção da SPDDH e de entidades parceiras na luta pelos direitos humanos possibilitou alguns avanços, entre eles a mudança no discurso em relação aos direitos humanos dos representantes de órgãos públicos. "Há bem pouco tempo e de forma pejorativa definiam (os governantes) os direitos humanos como ‘direito de bandido’."


Vera Tavares cita ainda como exemplo de "avanço" o reconhecimento do governo brasileiro da existência de violações de direitos humanos no país – fato que levou à implementação de políticas públicas, como a lei que indeniza brasileiros vítimas das arbitrariedades cometidas durante o regime militar. Outros exemplos de políticas públicas foram: a criação de uma Secretaria Nacional de Direitos Humanos (do Ministério da Justiça); a divulgação do Programa Nacional de Direitos Humanos e diversas campanhas nacionais; e o financiamento de algumas ações da sociedade civil como o Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas, estruturado pelo Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop). (No Pará, esse Programa é executado pela SPDDH.)

Longo caminho

Mas, segundo Tavares, apesar dessas ações, o Estado continua como principal violador dos direitos humanos no Brasil. "Não houve por parte do governo o enfrentamento às questões estruturais. Permanecem a não redistribuição de renda de forma eqüitativa; o agravamento da desigualdade e da pobreza no país; a não priorização de uma política de reforma agrária séria; a retirada da flexibilização dos direitos trabalhistas e sociais; o aumento do desemprego e do subemprego; o aumento da população de moradores de rua, entre eles crianças e adolescentes; sem mencionar a escalada da violência urbana", analisa.


Sem dúvida, o caminho para a efetivação da justiça no Brasil e no estado do Pará ainda é longo. Prova gritante disso foi o resultado do maior julgamento da história do país – o julgamento de Eldorado dos Carajás. Dos 142 policiais acusados, houve apenas duas condenações, o que evidenciou a inabilidade da investigação policial e do processo judicial em identificar individualmente os responsáveis criminais pelas mortes a tiros e golpes de facão de 19 ativistas rurais. Ao atuar na assistência de acusação do julgamento de Eldorado dos Carajás, através da participação de seus advogados, a SPDDH lutou por um julgamento isento e imparcial, mas ao constatar a falta de condições físicas para a sua realização, se retirou do julgamento. "O que se julga é o pacto do Brasil com a impunidade", diz Tavares.


Após 25 anos de atuação, a SPDDH ainda espera contribuir de maneira significativa para a erradicação ou, ao menos, o controle da violência. Sonho? "Talvez sim, mas entendemos que primeiro sonhamos para depois transformarmos nosso sonho em realidade, e para isso buscamos instrumentos, estratégias, parcerias e, principalmente, ação", afirma a presidente da SPDDH.


O livro "Homicídios no Pará de 1996 - 2000: da visibilidade à construção de uma cultura sem violência" pode ser adquirido e solicitado através do endereço da SPDDH - Trav. Dom Pedro I, 475, Umarizal, Belém, Pará, 66050-100, ou pelo correio eletrônico sddh@nautilus.com.br. Mais informações pelos telefones (91) 241-9931/5491.

Mariana Loiola

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