Autor original: Rogério Pacheco Jordão
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
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De um novo modelo de desenvolvimento, passando pelo aprofundamento da democracia no país, até a proibição de participação em licitações públicas de pessoas jurídicas e físicas que tenham discriminado homossexuais, as plataformas elaboradas pelas ONGs para serem enviadas aos candidatos nas eleições de outubro, refletem o pensamento e anseios de milhares de pessoas e entidades. Sintetizadas em livros, mas também em enxutas cartas de apenas uma página, as organizações aproveitam o momento político para fazer avançar suas propostas. Plataforma Política Feminista, Plataforma de princípios básicos para a sustentabilidade que queremos, Compromissos Anticorrupção, Carta sobre Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais, Plataforma Homossexual, Carta do Fórum de ONGS/AIDS de São Paulo, do Conselho Nacional de Assistência Social, de Rede de ONGs, são alguns dos documentos já enviados, ou em vias de, aos diversos comitês eleitorais espalhados pelo país. De falta de propostas da sociedade civil, os candidatos à Presidência da República (e também os que concorrem a cargos proporcionais e aos governos estaduais) não podem reclamar. Democracia participativa, promoção da cidadania e inclusão social estão entre as principais reinvidicações.
"Temíamos que as redes ficassem restritas a seus temas particulares, mas isso não aconteceu", diz Sérgio Haddad, presidente da Associação Brasileira de ONGs (Abong), entidade que está elaborando, junto a 15 Fóruns e Redes de ONGs, um documento a ser enviado aos candidatos à Presidência da República. A idéia de escrever o documento surgiu a partir do encontro promovido pela Abong com o candidato Luis Inácio Lula da Silva (PT), em julho, na sede da entidade, em São Paulo. O documento conterá dezesseis itens, que sintetizarão os pontos de consenso existentes entre as diversas ONGs (e suas mais variadas plataformas).
Entre as propostas "consensuais", estão: a universalização da cidadania; o fortalecimento da esfera pública (no que diz respeito ao diálogo Estado-Sociedade Civil); a necessidade de as ONGs serem vistas como instrumento de democratização e não como mero braço operacional do setor público; participação da sociedade civil no encaminhamento de soluções sociais, mas também econômicas; ampliação de espaços públicos participativos. "O processo de elaboração do documento é importante, pelo debate que gera", opina Haddad.
No passado, candidatos recebiam propostas e não liam
É o caso, sem dúvida, da Plataforma Política Feminista, documento elaborado a partir 26 conferências estaduais de mulheres, realizadas entre março e maio deste ano, nas quais participaram mais de seis mil pessoas. Aprovado na Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras, no início de junho, em Brasília, o documento aponta os principais desafios a serem enfrentados pelos governos (Federal e estaduais), políticos e a sociedade, para o aprofundamento da democracia no país e a promoção da justiça social. A plataforma trata, também, de temas exclusivos de gênero, como liberdade sexual e reprodutiva e representação de mulheres candidatas nos partidos (defende-se a ampliação da cota de 40% para 50%) .
Com 64 páginas e 269 parágrafos, a Plataforma, não é, porém, uma lista de reivindicações. "Não são reivindicações específicas, mas questões mais abrangentes para a sociedade brasileira", diz Guacira César de Oliveira, socióloga e diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA).
O enfoque mais ‘macro’ tem razão de ser. "Nas eleições passadas percebemos que os candidatos recebiam nossas reivindicações e assinavam em baixo, muitas vezes, sem lê-las. Os políticos aproveitavam-se do nosso trabalho para ganhar espaço na mídia em época de campanha", diz ela. "O objetivo, agora, foi construir uma articulação política em torno da plataforma. Queríamos apresentar uma proposta de ação social, já que reivindicações específicas não dão conta do problema".
Para alcançar a abrangência pretendida, o documento foi dividido em 5 capítulos: da Democracia Política, Justiça Social, Inserção do Brasil no Comércio Internacional, Democratização da Vida Social, Da Liberdade Sexual e Reprodutiva. "Um ponto para nós muito importante, e que permeia a Plataforma como um todo, é o fortalecimento dos espaços para a democracia participativa, como um caminho para a superação do problema da exclusão social. A situação de exclusão reproduz-se na sociedade, chegando às mulheres", afirma ela.
A plataforma já foi enviada, pelo correio, a todos os presidenciáveis e a todos os partidos políticos.
FBOMS quer mudança "profunda" no modelo de desenvolvimento
O mesmo caminho deve trilhar, em breve, a ‘Plataforma de princípios básicos para a sustentabiliade que queremos’, documento de três páginas elaborado pelo Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais e Meio Ambiente (FBOMS). A Plataforma é uma síntese do livro "Brasil 2002: a sustentabilidade que queremos", lançado no último dia 15 de agosto, em São Paulo. O livro traduz as aspirações e reivindicações da FBOMS, debatidas a partir de sete grupos de trabalho, tendo em vista a Cúpula Mundial de Joanesburgo e também a campanha presidencial.
Com 23 pontos, a Plataforma é bastante ampla e propõe "uma mudança profunda no modelo de desenvolvimento dominante no país". Segundo o documento, o atual modelo gera "desigualdade, degradação do meio ambiente, dependência externa, reestruturação produtiva subordinada, enfraquecimento da democracia". A plataforma oferece, ainda, princípios básicos para a transição para um novo modelo de desenvolvimento sustentável. Conceitos como justiça ambiental, participação cidadã, luta pela qualidade de vida, fim dos desequilíbrios regionais, permeiam o texto.
"Oferecemos uma análise do cenário nacional e internacional", explica Tânia Pacheco, consultora do Projeto Brasil Sustentável e Democrático. Assim como a Plataforma Feminista, a da FBOMS também é um documento com análises voltadas para o "macro". "Partimos do pressuposto que não adianta querer mudar partes do modelo de desenvolvimento, se é o próprio modelo que determina a massa de problemas que vivemos, como o da injustiça social", analisa Tânia. A elaboração do documento foi feita a partir de sete grupos de trabalho: Agenda 21, Sócio-Biodiversidade, Clima, Floresta, Água, Energia, Comércio e Meio Ambiente.
Do ‘macro’ ao específico
Nem todas as plataformas e documentos têm, porém, a complexidade e o tamanho das elaboradas pelas mulheres e pela FBOMS. A Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (DhESC Brasil), por exemplo, produziu uma carta com treze artigos; a ONG Transparência Brasil elaborou um compromisso anticorrupão bastante sintético, com oito pontos; já a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis (ABGLT) resumiu suas propostas a dezoito itens. (Veja lista de documentos para download e sites)
Das plataformas, a Homossexual é uma das mais específicas. Apresentação de Projetos de Lei que proíbam e punam qualquer tipo de discriminação baseada na orientação sexual; proibição de participação em licitações públicas de pessoas jurídicas e físicas que tenham discriminado homossexuais; apoio à luta pela aprovação do Projeto de Lei do Contrato de União Civil Entre Pessoas do Mesmo sexo, estão entre os pontos destacados. "A idéa de ser bem específico faz parte de uma estratégia maior", comenta Oswaldo Braga, presidente do Movimento Gay de Minas (MGM). "A nossa experiência diz que a vitória vem mais rápido quando focamos mais. Se ficamos no específico sabemos pelo que estamos lutando", explica.
Como exemplo do resultado desta estratégia política, o presidente do MGM lembra que a aprovação da lei que pune discriminação por orientação sexual em 80 municípios brasileiros – e agora também nos estados de Minas, SP e Rio – foi conseguida "aos poucos". "Estamos entre aqueles grupos sociais classificados como ‘ vulneráveis’, ou seja, que precisam de ações afirmativas para serem incluídos socialmente. Daí a necessidade, também, de plataformas bem específicas", argumenta.
"As dezenas de plataformas e programas existentes, refletem o crescimento, nos últimos anos, do trabalho das ONGs em redes e fóruns. O fato político importante é que as propostas refletem o pensamento de muitas pessoas e organizações", observa Sérgio Haddad, da Abong. Cabe agora aos candidatos refletir sobre estas idéias e projetos – e, se possível, implementá-las quando chegarem ao Governo.
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