Autor original: Marcelo Medeiros
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Esta semana, a Rets traz a entrevista exclusiva com o candidato à Presidência da República José Serra, do PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira. Essa é a segunda de uma série em que os presidenciáveis respondem como o papel das ONGs, o fortalecimento do terceiro setor, modelos de relação entre Estado e sociedade civil organizada, entre outras questões, estão previstos nos seus planos de governo.
Todos os candidatos receberam as mesmas perguntas, na mesma data, por e-mail. As entrevistas começaram a ser publicadas na semana passada, na mesma ordem em que chegaram à nossa redação.
Rets - Na sua opinião, de que modo o fortalecimento do Terceiro Setor - especialmente nos últimos dez anos - transformou as relações do Estado com a Sociedade Civil?
José Serra - As relações se aprofundaram e se tornaram mais transparentes, pela mudança de postura do Estado e das entidades do terceiro setor. O Estado passou a ser mais exigente na delegação de atribuições e as entidades se tornaram mais eficientes, mais preocupadas com a qualidade e sobretudo com o resultado dos serviços que prestam.
Rets - Como o senhor avalia a reforma do marco legal que regula as relações entre Estado e Sociedade Civil no Brasil, em especial a Lei das Oscips - que criou um modelo de organização da sociedade civil e um formato novo na relação com o Estado (o Termo de Parceria)?
José Serra - A Lei das Oscips foi importante. Foi uma evolução e abriu caminho para o aprofundamento das mudanças nesse setor, no sentido de ampliar e aprofundar a parceria e de se avaliar melhor os seus resultados. Os programas e ações federais na área social controlados por conselhos com participação da sociedade civil têm destinados R$ 7 bilhões no orçamento de 2002. Devemos aumentar esses recursos.
Rets - Como a relação entre o Estado e a sociedade civil organizada está prevista em seu programa de governo?
José Serra - Descentralização é a chave para a boa execução de políticas públicas, principalmente as políticas sociais, num país extenso e heterogêneo. A União deve cuidar da coordenação das políticas, deixando a execução para os estados, os municípios e entidades não-governamentais. Para que a descentralização funcione bem, é importante o controle social seja efetivo, com cidadãos atentos e organizados para cobrar.
Para aprofundar essa cooperação, devemos regulamentar a atividade. Por sua complexidade e pela diversidade, vamos buscar a regulamentação de cada segmento, de maneira democrática, avaliando as experiências já realizadas, ouvindo e envolvendo toda a sociedade. Formas transparentes e responsáveis de prestação de contas - ao governo e à própria sociedade -- do uso dos recursos públicos recebidos são igualmente importantes para fortalecer a confiança e a credibilidade desse segmento.
Rets - A busca de sustentabilidade é um grande desafio para as ONGs brasileiras. Os benefícios fiscais para doadores não são suficientes para estimular a maior participação de indivíduos e empresas no apoio financeiro às organizações. Na verdade, esta alternativa de sustentabilidade foi bastante reduzida pela política tributária no país: em 1995 foi cortada a dedução do imposto de renda para as doações de pessoas físicas e reduzida, de 5% para 2%, a dedução das doações das pessoas jurídicas. O senhor estaria disposto a apoiar mudanças na legislação (na área tributária) que garantissem a construção de um novo modelo de sustentabilidade das organizações da sociedade civil?
José Serra - Estamos abertos para analisar alternativas e sugestões. Acredito, no entanto, que o incentivo fiscal é um aspecto secundário da questão. Até porque, mesmo contando com a colaboração de empresas e da sociedade, meu governo não pretende se desobrigar das responsabilidades do Estado para com áreas essenciais como a educação, a saúde ou a cultura, destinando recursos orçamentários para o seu atendimento. Mais do que aporte de dinheiro, espero que as entidades da sociedade civil tenham atuação estratégica e insubstituível como mobilizadoras e provedoras de recursos humanos e, sobretudo, como geradoras de energia criativa na gestão social.
Rets - Que políticas sociais terão prioridade em seu governo?
José Serra - A política de emprego é a primeira e mais importante política social. Mas não basta dar oportunidade de trabalho. É preciso ampliar as políticas sociais. O segundo objetivo de nosso Plano Social será avançar mais na universalização dos serviços básicos de saúde, educação e previdência. Na saúde, vamos beneficiar todas as famílias com o atendimento domiciliar, reduzir as filas e humanizar o atendimento na rede pública. Aumentaremos a oferta de medicamentos gratuitos no SUS, subsidiaremos a compra de alguns remédios de uso continuado e estimularemos a produção de genéricos. Com isso, cairão as taxas de mortalidade infantil e o estado geral de saúde da população melhorará.
Na educação, vamos criar quatro milhões de vagas na pré-escola, melhoraremos a qualidade do ensino fundamental e do ensino médio. Dobraremos as vagas no ensino médio e nos cursos noturnos das universidades públicas, ampliando as oportunidades de acesso aos carentes.
Na previdência, queremos ampliar o número de contribuintes, hoje restrito a cerca de 40% da força de trabalho, criando um sistema especial para trabalhadores informais, estimulando a formalização das relações de trabalho e combatendo as fraudes. Aumentando as receitas do INSS, poderemos melhorar os serviços prestados e o valor das aposentadorias e pensões.
Igualmente importante será o combate à desigualdade entre pessoas e regiões. Para tanto, vamos aprimorar os programas de transferência de renda, melhorar a qualidade de vida nas grandes cidades, fortalecer a agricultura familiar, incentivar o desenvolvimento de localidades mais pobres e promover a integração das regiões Norte e Nordeste ao desenvolvimento nacional.
Rets - O senhor poderia citar exemplos de parceria já existente entre o poder público (federal, estadual ou municipal) e a sociedade civil em projetos sociais que o senhor considera um modelo a ser seguido?
José Serra - Uma parceria notável, do ponto de vista da importância dos resultados, é a que soma os recursos do Governo Federal à rede de voluntários da Pastoral da Criança. As 150 mil voluntárias da Pastoral visitam mensalmente 1,5 milhão de crianças até seis anos de idade nas áreas mais pobres do País. Deve-se a essa parceria, em boa parte, a aceleração da queda da mortalidade infantil no País nos últimos sete anos.
Rets - A "brecha digital" nos faz confrontar com um novo analfabetismo que amplia de maneira rápida e intensa as enormes desigualdades sociais que o Brasil já conhece. Quais são seus projetos (ou idéias) para ampliar o acesso da população brasileira às redes de comunicação e informação e combater a exclusão digital?
José Serra - As novas tecnologias de informação e comunicação já começam a revolucionar as relações governo-sociedade. No Brasil, onde o imposto de renda, as eleições, os serviços bancários e até os programas de distribuição de renda têm elevado grau de informatização, temos tudo para avançar ainda mais. O governo vai multiplicar as formas de acesso à Internet, com terminais em órgãos públicos, agências dos correios, bancos e empresas, escolas, sindicatos e associações comunitárias, para a grande maioria de brasileiros que não têm computador em casa. Todas as escolas com mais de 100 alunos terão computadores ligados à Internet e cursos de treinamento para os alunos, até 2006. O governo vai também apoiar entidades da sociedade civil que tiverem projetos relevantes de formação e treinamento de pessoas no uso da informática.
Em dois anos, vamos disponibilizar na Internet todos os serviços e informações de órgãos federais que sejam de interesse relevante para o cidadão. Queremos integrar progressivamente os serviços pela Internet e as rotinas administrativas que lhes dão suporte, disponibilizar informações sobre transferências e aplicação de recursos e financiamentos para cada região, estado ou município. Vamos integrar também todos os órgãos da administração federal a uma central de atendimento telefônico, que dará aos cidadãos ainda considerados excluídos digitais acesso aos serviços e informações disponibilizados na Internet.
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