Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Breves artigos com opiniões sobre temas relacionados com o Terceiro Setor
Fabio Feldmann*
Representantes de 191 países reuniram-se em Joanesburgo, África do Sul, para discutir os desafios ambientais do planeta e os instrumentos para enfrentá-los. Encerrada a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável em 4 de setembro, pergunta-se: era mesmo necessária a espetacular mobilização de Chefes de Estado e de Governo, representantes governamentais, de instituições multilaterais, organizações não-governamentais, empresários e ambientalistas para alcançar resultados tão pífios? A resposta é não, ainda que se possam encontrar pontos positivos no documento final aprovado na conferência, o Plano de Implementação.
A Conferência de Joanesburgo - conhecida como Rio+10 por visar à identificação dos avanços e dos problemas no período de dez anos que se seguiu à Conferência do Rio, em 1992 - deu-se num momento histórico bastante diferente do vivido naquele ano. Em 1992, estávamos no fim da Guerra Fria, após a queda do muro de Berlim. O clima era de otimismo e esperança. O esforço mundial realizado no Rio de Janeiro produziu resultados - particularmente a Agenda 21 e a Declaração do Rio - que definiram o contorno de políticas essenciais para alcançar um modelo de desenvolvimento que atendesse às necessidades das populações mais pobres, sem com isso ameaçar os recursos imprescindíveis à sobrevivência das futuras gerações.
Em 2002, apesar das propostas aprovadas na Rio-92, incerteza e insegurança se impõem tanto aos países ricos como às nações em desenvolvimento, aliadas ao agravamento da pobreza e ao aumento da desigualdade. A cúpula de Joanesburgo é um reflexo desse contexto histórico. Durante o processo preparatório da Conferência, conceitos e princípios aprovados em 1992 foram colocados em xeque. A simples manutenção desses princípios, agora, é considerada uma vitória - quando, na verdade, não constitui avanço algum. O verdadeiro objetivo da Cúpula de Joanesburgo, a discussão de medidas para implementar os acordos do Rio, não foi alcançado. Muita energia foi gasta para evitar retrocessos, e não para promover avanços. No entanto, o Brasil sai da conferência com a sensação de dever cumprido. Tanto na esfera nacional como internacional, o país promoveu avanços significativos, ratificou a maioria dos acordos e convenções resultantes da Rio-92 e formulou importantes propostas, emergindo como uma das principais lideranças da cúpula. Além de protagonizar acordos com os países megadiversos e encabeçar a Iniciativa Latino-Americana e Caribenha (ILAC), que unificou as reivindicações da região, o Brasil teve papel central com a apresentação da Iniciativa de Energia. A proposta, elaborada pelo Secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, José Goldemberg, visava o comprometimento de todos os países em aumentar para 10% o uso de fontes de energia renováveis até 2010. A proposta foi derrotada pela ação de países produtores de petróleo e países que utilizam combustíveis fósseis de maneira intensiva, como os Estados Unidos. Entretanto, apesar de ter não ter sido aceita, a iniciativa teve mérito inegável, já que tornou o tema da energia um dos grandes focos de discussão da conferência.
Reconhecido o fracasso da Conferência, cabe a nós um olhar crítico sobre esses resultados e sobre as perspectivas do planeta. A lição mais óbvia que se tira de Joanesburgo é a fragilidade da Organização das Nações Unidas, que não tem conseguido se mostrar efetiva nem na implementação de decisões, nem na indução desse processo. Sem força jurídica para cobrar a execução das diretrizes adotadas, o sistema multilateral da ONU - em que qualquer resolução exige consenso e em que todas as nações têm igual peso, independentemente do tamanho de suas populações - não apresenta resultados satisfatórios quando há interesses contraditórios em jogo. O que se vê então é a imposição das nações ricas sobre as pobres, mantendo-se o status quo em detrimento da saúde planetária. As dificuldades hoje avistadas evidenciam o esgotamento do ciclo de grandes conferências das Nações Unidas. Por isso, é fundamental que se promova, urgentemente, um novo desenho desse sistema, de forma a definir novos mecanismos políticos para tornar a governança mundial mais justa e eficaz.
* Fabio Feldmann é Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas e foi nomeado, pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, seu representante para as questões relacionadas à preparação e participação do Brasil na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, em Joanesburgo.
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