Autor original: Maria Eduarda Mattar
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O candidato à Presidência Ciro Gomes, da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT), expõe, na quarta entrevista exclusiva com os presidenciáveis, suas idéias a respeito da relação entre Estado e sociedade civil organizada, brecha digital, entre outros assuntos vitais para o terceiro setor.
Perguntas iguais foram enviadas a todos os candidatos, na mesma data, por e-mail. As entrevistas estão sendo publicadas na ordem em que chegaram à nossa redação e começaram a ser veiculadas na edição da Rets de 30 de agosto.
A Rets formulou sete perguntas. O candidato Ciro Gomes optou por “aglutinar” algumas dessas perguntas – oferecendo, no total, cinco respostas em vez de sete. Estamos apresentando as perguntas ordenadas de acordo com a lógica das respostas do candidato - e não conforme a ordem em que foram enviadas.
Rets - Na sua opinião, de que modo o fortalecimento do Terceiro Setor - especialmente nos últimos dez anos - transformou as relações do Estado com a Sociedade Civil?
Rets - Como a relação entre o Estado e a sociedade civil organizada está prevista em seu programa de governo?
Ciro Gomes - A responsabilidade social das empresas é um grande avanço para a sociedade brasileira. O pressuposto fundamental é o de que à empresa não basta buscar somente aumentar sua eficiência. É preciso também cuidar de seu entorno, da cidade e da comunidade em que a empresa está inserida. O dever de equacionar os problemas sociais pertence ao Estado. Mas, em um país de tantas carências sociais como o Brasil, a preocupação empresarial em agir com responsabilidade social é sempre desejável.
A importância do chamado Terceiro Setor para a sociedade brasileira transcende os gastos realizados em projetos de responsabilidade social. Há diversas ONGs que são importantes interlocutores da sociedade nos mais diversos assuntos: segurança, saúde, educação, meio ambiente, etc. São inequívocas as contribuições já dadas por essas entidades na conscientização da população e no aperfeiçoamento dos serviços oferecidos pelo Estado. Assim, a manutenção de um constante diálogo com as entidades representativas da sociedade civil é um dever de qualquer governo democrático.
Rets - Como o senhor avalia a reforma do marco legal que regula as relações entre Estado e Sociedade Civil no Brasil, em especial a Lei das Oscips - que criou um modelo de organização da sociedade civil e um formato novo na relação com o Estado (o Termo de Parceria)?
Rets - O senhor poderia citar exemplos de parceria já existente entre o poder público (federal, estadual ou municipal) e a sociedade civil em projetos sociais que o senhor considera um modelo a ser seguido?
Ciro Gomes - O direito à livre associação, garantido pela Constituição, é o princípio fundamental que determina a não-interferência do Estado nas organizações da sociedade civil. Sem embargo, é previsto na legislação e desejável que ocorra na prática a parceria entre o setor público e o Terceiro Setor. Essa parceria pode ser estabelecida através das Osips (Organizações Sociais de Interesse Público) (sic) ou de parcerias com ONGs e outras organizações sem fins lucrativos, em que estas operam com recursos públicos. Há diversas experiências bem sucedidas em que ONGs (a Pastoral da Criança e a Associação Saúde da Família de São Paulo) trabalham com recursos públicos para operacionalizar importantes programas, como os de saúde da família ou os de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis. Não se pretende que ONGs substituam o Estado naquilo que é o seu dever. Mas não há mal nenhum em aproveitar em certas situações a infra-estrutura e a capacidade de trabalho acumulada por uma ONG.
Rets - A busca de sustentabilidade é um grande desafio para as ONGs brasileiras. Os benefícios fiscais para doadores não são suficientes para estimular a maior participação de indivíduos e empresas no apoio financeiro às organizações. Na verdade, esta alternativa de sustentabilidade foi bastante reduzida pela política tributária no país: em 1995 foi cortada a dedução do imposto de renda para as doações de pessoas físicas e reduzida, de 5% para 2%, a dedução das doações das pessoas jurídicas. O senhor estaria disposto a apoiar mudanças na legislação (na área tributária) que garantissem a construção de um novo modelo de sustentabilidade das organizações da sociedade civil?
Ciro Gomes - Uma questão polêmica sempre lembrada quando se discute as entidades filantrópicas são os benefícios fiscais a elas concedidos. Esses benefícios estão previstos na legislação brasileira com o intuito de maximizar os efeitos da atuação dessas entidades. No entanto, é notório que muitos beneficiários dessas isenções usam a filantropia apenas como fachada. É preciso, portanto, combater a chamada “pilantropia”, que drena recursos dos contribuintes sem trazer benefícios para a sociedade. Evidentemente, isso não significa prejudicar as entidades verdadeiramente filantrópicas. Pelo contrário, separar o joio do trigo é fundamental para valorizar o trabalho de quem atua com seriedade.
Rets - Que políticas sociais terão prioridade em seu governo?
Ciro Gomes - Quanto às políticas sociais que serão priorizadas em meu governo, é preciso destacar de início que a principal prioridade refere-se à reorganização deste setor. Hoje, o programa Comunidade Solidária tem muitos bons projetos, que escapam da concepção assistencialista tradicional. O programa de incentivo ao artesanato, que funciona de maneira semelhante ao programa de agricultura familiar, é um exemplo disso. Ademais, em um país que ainda enfrenta sérios problemas de pobreza extrema, mesmo os programas assistencialistas tradicionais são importantes. O problema nessa área é falta de centralização do planejamento, que gera desperdícios de recursos e duplicação de esforços. O programa Comunidade Solidária não se articula adequadamente nem mesmo com o governo federal, com seus ministérios e até com a Secretaria Nacional de Ação Social. Essa desarticulação abre espaço para o uso fisiológico dos recursos públicos destinados à área social e torna muitas vezes o Comunidade Solidária uma simples peça de propaganda oficial. Essa situação será mudada em meu governo.
Rets - A "brecha digital" nos faz confrontar com um novo analfabetismo que amplia de maneira rápida e intensa as enormes desigualdades sociais que o Brasil já conhece. Quais são seus projetos (ou idéias) para ampliar o acesso da população brasileira às redes de comunicação e informação e combater a exclusão digital?
Ciro Gomes - Como bem foi definido na pergunta, a “brecha ou exclusão digital” é um fenômeno contemporâneo próximo ao do analfabetismo. Precisa, portanto, ser alvo de uma política “horizontal”, básica, transversal, que perpassa todos os setores, inserida em uma ampla estratégia de aprimoramento da escola pública. Nessa empreitada, pode-se contar com recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), que é constituído por 1% do faturamento das concessionárias do setor, para modernizar as escolas públicas. No entanto, o combate à exclusão digital é uma tarefa que exige primordialmente recursos humanos capacitados para fazer com que nossos jovens possam aprender a lidar com as ferramentas do novo século. É claro que o Terceiro Setor pode contribuir em muito nessa tarefa.
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