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Ações que alimentam a esperança

Autor original: Graciela Baroni Selaimen

Seção original: Notícias exclusivas para a Rets








Além das medidas de longo prazo, as ONGs dedicam-se ao emergencial – como faz a FASE, em Duque de Caxias e São João do Meriti, no Estado do Rio.


Nos dois municípios da Baixada Fluminense, a FASE, com os apoios da Igreja Batista, da Casa da Cultura e do Conselho de Entidades Populares de São João de Meriti, mobilizou a população em torno do combate à desnutrição infantil. A campanha, iniciada em dezembro do ano passado, conta ainda com o apoio do Observatório de Políticas Urbanas e Gestão Municipal (FASE/IPPU-UFRJ), do Instituto de Pediatria e Puericultura Martagão Gesteira (UFRJ) e do Instituto de Nutrição da Unigran-Rio, além da ActionAid. Organizado em 52 mutirões, o projeto pesou, até o momento, mais de 20 mil crianças e constatou que em 20% dos casos havia uma situação de risco nutricional. Das seis mil crianças pesadas na primeira leva, 600 apresentavam estado de desnutrição.

Com os nomes e endereços das crianças desnutridas, as entidades passaram a pressionar os poderes públicos – Prefeitura, Ministério Público, Juizado da Infância e da Adolescência, entre outros – a tomarem providências. Um dos resultados já obtidos foi a contratação, pela prefeitura, de mais médicos para os postos de saúde. Deverá ser instalado em breve o Sistema Municipal de Vigilância Nutricional (previsto no SUS, Sistema Único de Saúde). Eles não se deram por satisfeitos: ao coletarem os nomes e endereços, as entidades descobriram que uma boa parte das famílias simplesmente “não existiam oficialmente”, ou seja, as crianças não tinham certidão de nascimento e os pais não tinham RG ou qualquer outro tipo de documento de identificação. Isso levou a OAB local e o Juizado da Infância e da Juventude a desenvolverem um esforço – ainda em andamento – de cadastramento destas pessoas, mostrando, na prática, que o combate à desnutrição é, também, um imperativo de cidadania.

“Se o Estado não consegue identificar os problemas, as ONGs podem indicar-lhe o caminho, cobrando, sempre. A questão de fundo da luta contra a fome é que trata-se de um direito de cidadania”, opina Alberto Gomes Silva, oficial de projetos da ActionAid.


O estômago









A fome afeta diretamente o estômago de quem sofre dela. Causa tonturas, fraqueza, desânimo, enjôos, doenças. E também vira o estômago de quem não passa fome – mas tem olhos. Foi o caso da musicista e compositora carioca Virgínia Adams, uma das idealizadoras, há 4 anos, do Click Fome – site inspirado no britânico The Hunger Site, em que se pode doar alimentos clicando nos ícones de empresas patrocinadoras. “Ao ver o site inglês percebi que havia a possibilidade de ajudar em larga escala, de interferir, de algum modo, na sociedade em que vivo”, diz.

Em parceria com a Ação da Cidadania, o Click Fome é uma idéia que deu certo. O site chegou a receber 10 mil visitas diárias, no ano passado, quando o endereço do site foi divulgado em matéria da TV Globo. O número de patrocinadores, porém, caiu de 12 para os atuais 2 (Rio Sul e Nova América). “Como tudo é feito em base voluntária, não houve um esforço suficiente e continuado de captação de novos patrocinadores”, lamenta Virgínia.

Para reverter a situação, o Click Fome lança em novembro próximo uma campanha para conseguir novos patrocinadores. “Já estamos trabalhando na peça publicitária”, diz Virgínia. Os interessados em ajudar podem entrar em contato com ela pelo e-mail virginia@discovoador.com.br.


Cara a cara com a realidade









Em São Paulo, o Centro de Recuperação e Educação Nutricional (CREN) trabalha com crianças desnutridas e suas famílias de baixa renda. “Os objetivos são promover a retomada do crescimento e desenvolvimento de crianças desnutridas através de intervenções junto à própria criança e à sua família; desenvolver métodos de tratamento; e formar recursos humanos especializados para o trabalho com a desnutrição primária”, aponta a coordenadora do CREN, Gisela Solymos. O projeto - que nasceu em 1993, a partir do trabalho realizado com comunidades carentes por profissionais da área de saúde e nutrição da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - atende mais de mil crianças por ano: 50 no semi-internato, 700 em ambulatório e 300 diretamente na comunidade.


A experiência do CREN parte de três grandes pilares metodológicos: o realismo, a racionalidade e a moralidade, explica Gisela. “Sinteticamente, o realismo procura privilegiar uma observação insistente e apaixonada do real; a racionalidade pede um olhar para todos os fatores envolvidos e a busca de metodologia adequada ao objeto em questão (na prática, valoriza o trabalho interdisciplinar); enquanto a moralidade (que não pode ser confundida com moralismo) privilegia o amor à realidade, sem preconceitos”, explica a coordenadora. Por que é importante essa preocupação metodológica? “A falta de conhecimento real da pessoa em situação de pobreza e dos fatores envolvidos é um grande vilão para a ineficiência das ações de combate à pobreza”, afirma Gisela. Ela lembra que a desnutrição é uma doença que pode levar a criança à morte e, se não for tratada, compromete todo o desenvolvimento – cognitivo e motor – da criança.

O CREN atende prioritariamente crianças de 0 a 6 anos incompletos e as suas atividades acontecem de segunda a sexta, das 7h30 às 17h30, em cinco âmbitos: atendimento à criança desnutrida em regime ambulatorial; semi-internato para lactentes e pré-escolares desnutridos; atendimento às famílias das crianças atendidas no CREN; supervisão e treinamento de profissionais e entidades para a prevenção e combate da desnutrição, assessoria de projetos; atendimento direto à comunidade através de visitas domiciliares e censos. “O aspecto mais importante é a mudança que ocorre na vida e na realidade das famílias. A recuperação do estado nutricional das crianças e o acompanhamento constante das famílias (que participam de oficinas, recebem atendimento de psicólogas e assistentes sociais) permitem que a auto-estima seja readquirida e a dignidade, restituída”, ressalta Gisela.

Recentemente, a instituição lançou a coleção “Vencendo a Desnutrição”, com publicações sobre prevenção e combate à desnutrição infantil voltado para famílias e entidades que trabalham com crianças. A coleção oferece cinco manuais nas áreas de pediatria/nutrição/enfermagem, serviço social, psicologia e pedagogia; dois manuais sobre saúde, alimentação e desnutrição; um livro de receitas para famílias e entidades que trabalham com crianças; 17 folhetos explicativos sobre saúde e um vídeo para mães e responsáveis.


Rogério Pacheco Jordão e Mariana Loiola

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