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A vitória do mogno

Autor original: Julio Cesar Brazil

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Greenpeace/ Daniel Beltra
O dia 13 de novembro de 2002 será lembrado para sempre pelos ambientalistas. Com 68 votos contra 30, o mogno foi incluído no Anexo II da Cites durante a 12ª Conferência das Partes (COP–12), realizada em Santiago, no Chile. Com esta decisão, a exportação desta madeira terá uma série de garantias técnicas e científicas, comprovando que o produto foi extraído de uma maneira sustentável e assim lutar contra a possibilidade de extinção da espécie. Além disso, o país importador também terá responsabilidade pela origem e qualidade do mogno. A proposta de inclusão da madeira no Anexo II foi formulada pela Nicarágua e pela Guatemala e contou com o apoio da União Européia e de países como Inglaterra, México, Costa Rica e Indonésia entre outros.

Apesar da posição contrária do Brasil, o mogno que for exportado pelo país será obrigado a ter um certificado do Ibama, além de um documento emitido por uma instituição escolhida pelo Governo Federal. O Itamaraty justificou o seu voto afirmando que com a implementação do Sistema Integrado de Controle e Monitoramento dos Recursos Florestais (Sisprof) e a regulamentação da exploração florestal pelo Ibama, seria possível realizar um controle mais rigoroso sobre a exploração do mogno.

Para conversar sobre a inclusão do mogno Anexo II, a Rets entrevistou Nilo D’Ávila, gerente de projeto do Greenpeace na Amazônia, que considerou a decisão da COP – 12 uma vitória histórica, pois foi a quarta vez que esta proposta foi apresentada em conferências da Cites. Ele explicou que a Campanha SOS Mogno é uma coalizão de ONGs brasileiras e que a luta contra a extinção da madeira não acabou. Em 2003 haverá a implementação das regras deste Anexo. Nilo disse também que a sociedade brasileira tem como participar da preservação da espécie mantendo-se informado e informar, além de participar de campanhas de ONGs que trabalham pelo uso sustentável dos recursos naturais.

Rets - Qual a importância da inclusão do mogno no Anexo II da Cites, decisão concretizada na reunião que terminou semana passada, no Chile? Qual a repercussão desta decisão entre os ambientalistas e na sociedade brasileira?

Nilo D’Ávila - Pela primeira vez os mecanismos de controle internacional do comércio vão ser testados com uma espécie de grande valor no mercado, em um Anexo intermediário ao referente às espécies em extinção. A listagem do mogno no Anexo II vai incluir mecanismos de proteção e análise científica.

A falta de diálogo entre os envolvidos pela decisão do voto brasileiro e a sociedade civil marcou negativamente este processo. Não foi feita nenhuma consulta oficial com organizações que, de alguma forma, trabalham com a questão do mogno. No entanto, várias personalidades brasileiras, como Gilberto Gil e Camila Pitanga, deram seu apoio à campanha pela listagem do mogno no Anexo II.

Entre os ambientalistas existia um consenso favorável à medida desde o início do processo, assim como a sociedade brasileira se mostrou favorável através do apoio dado à campanha. Esta foi a quarta vez que a proposta de incluir o mogno no Anexo II da Cites foi apresentada e finalmente foi aprovada. Foi uma vitória histórica.

Rets - Quantos países votaram a favor da inclusão do mogno no Anexo II da Cites e quais os mais importantes desta lista?

Nilo D’Ávila - A votação é secreta, mas a proposta de listar o mogno no Anexo II da Cites, apresentada pela Nicarágua e Guatemala, recebeu o apoio dos países da União Européia e da América Central, além da própria Cites. O resultado final da votação foi de: 68 votos a favor, 30 contra (incluindo o Brasil), 14 abstenções e 3 nulos.

Rets - O que é Campanha SOS Mogno e quais os seus principais pontos? Qual foi o seu papel e atividades para pressionar pela aprovação da inclusão do mogno no Anexo II?

Nilo D’Ávila - A Campanha SOS Mogno é uma coalizão de ONGs brasileiras que conseguiu reunir várias entidades com diferentes atuações em torno do mesmo objetivo: o aumento da proteção ao mogno, espécie ameaçada de extinção devido à exploração intensa e descontrolada verificada nas últimas décadas. Uma peculiaridade da campanha foi o envolvimento do público – todas as pessoas podiam participar da luta, enviando seu protesto diretamente aos tomadores de decisão através da Internet.

Durante o período da reunião, o Greenpeace realizou um intenso trabalho de lobby político, com ações de protesto em Brasília e em Santiago, no Chile, onde a reunião da Cites foi realizada. No Brasil, ativistas do Greenpeace montaram acampamento ao redor de uma árvore de mogno na Esplanada dos Ministérios como forma de pressionar o Brasil a adotar uma posição favorável à inclusão do mogno no Anexo II.

No dia 11 de novembro, ativistas do Greenpeace protestaram em frente ao Itamaraty contra a posição da delegação brasileira na Cites. Os ativistas reproduziram em caixas de som um trecho do programa "Palavra do Presidente" do dia 9 de abril deste ano, no qual o Presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que "o governo fará tudo para proteger o mogno, uma riqueza de nossas florestas que infelizmente, como alvo da cobiça dos madeireiros, está ameaçada de extinção". Além disso, os ativistas utilizaram o lago ao redor do Itamaraty para representar a exploração destrutiva e predatória realizada pela indústria madeireira na Amazônia: centenas de tubos amarrados formavam uma grande "jangada de toras de mogno", enquanto ativistas locomoviam-se em pequenos botes infláveis, simulando o trabalho desenvolvido pelo Greenpeace na região amazônica. Depois da votação que garantiu a inclusão da espécie no anexo II, o Greenpeace realizou uma série de projeções de slides na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF).

Rets - A campanha se opôs à proposta sustentada pelo Itamaraty que defendia um controle mais rigoroso sobre a exploração do mogno através do Sistema Integrado de Controle e Monitoramento dos Recursos Florestais (Sisprof) e a regulamentação da exploração florestal pelo Ibama, ao invés da inclusão do mogno do anexo II. Quais os problemas que vocês enxergavam nessa alternativa?

Nilo D’Ávila - N´so não somos contra um controle mais rigoroso sobre a exploração do mogno. Apenas protestamos contra os argumentos apresentados pela delegação brasileira para justificar sua posição contrária ao Anexo II, já que a nova legislação ainda está em discussão pelo Grupo de Trabalho estabelecido pelo Ministério do Meio Ambiente. Ainda não há uma proposta fechada e, depois de acordada, ela precisa ser aprovada. Já o Sisprof é um sistema que ainda não foi implementado e seu "co-irmão", SISMAD (referente ao controle de madeira serrada) é motivo de reclamações principalmente do time de fiscalização do Ibama.

Rets - Quais foram as ilegalidades comprovadas pelo Ibama em 2001, que suspenderam as autorizações de exploração, transporte e comercialização do mogno?

Nilo D’Ávila - Durante operação de fiscalização conduzida pelo Ibama em 2001, ocorrida na região conhecida como Terra do Meio, localizada entre os rios Xingu e Tapajós, 80 mil metros cúbicos de mogno foram apreendidos por exploração fora da área de manejo. Elas são áreas privadas, onde a extração de madeira deveria acontecer de uma forma sustentável. O nome correto é Plano de Manejo Florestal Sustentável e, no caso do mogno, PMFS com ocorrência de mogno. Os PMFS têm procedimentos próprios de manejo florestal definidos por lei e são fiscalizados anualmente pelo Ibama.

Rets - Hoje em dia, pode-se dizer que o mogno não corre risco de extinção após a sua inclusão no Anexo II da Cites?

Nilo D’Ávila - A inclusão pura e simplesmente no Anexo II da Cites não resolve o problema da exploração ilegal e predatória da espécie. É preciso definir regras para exploração sustentável e sua devida implantação, além de um sistema de controle e fiscalização efetivo. Também é importante o estabelecimento de uma política florestal para o País.

Rets - A Campanha SOS Mogno continuará existindo?

Nilo D’Ávila - A continuidade da campanha é uma questão a ser conversada, mas existe um campo de atuação que é a implementação das regras do Anexo II, que deve acontecer no ano de 2003. As entidades envolvidas na campanha SOS Mogno têm amplas possibilidade de contribuição, cada uma dentro do seu campo de atuação. A campanha SOS Mogno tinha como objetivo a inclusão do mogno no Anexo II da Cites, que foi alcançado.

Rets - Existe alguma forma do cidadão que não está ligado a nenhuma ONG ajudar na preservação do mogno?

Nilo D’Ávila - No momento, o cidadão que consumir madeira de mogno tem grandes probabilidades de estar comprando madeira ilegal, já que o mercado interno é completamente desconhecido do órgão controlador, o Ibama. Uma maneira de contribuir é não consumir mogno enquanto o governo brasileiro não sinalizar que existe sustentabilidade na exploração do mogno no País. Outra maneira de ajudar é manter-se informado e informar; e participar de campanhas de ONGs que visem promover o uso sustentável dos recursos florestais.

 


Julio Cesar Brazil

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