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Proposta contra a corrupção

Autor original: Julio Cesar Brazil

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O Brasil está passando por um período de mudanças na vida política e, como toda mudança, alimenta a intenção de ver as coisas melhorarem. E, num contexto governamental, isso quer dizer, entre outras coisas, combater a corrupção. Este ato criminoso faz o Brasil ser o menos confiável entre 16 países, de acordo com uma pesquisa feita pelo Consórcio Ibero-americano de Empresas de Investigação de Mercado, ficando atrás do Peru, Venezuela, Colômbia e Equador.


Tendo isto em vista, a Transparência Brasil enviou à equipe de Luis Inácio Lula da Silva um documento propondo a criação da Agência Nacional Anticorrupção. O objetivo é encontrar meios de conter com eficácia a corrupção. A Rets conversou com Cláudio Weber Abramo, secretário geral da instituição, que explicou que a meta principal da agência seria funcionar como um núcleo de implementação de ações anticorrupção, aprimorando os mecanismos governametais, em especial no âmbito do Executivo Federal.

Rets - Como surgiu a idéia da criação da Agência Nacional Anticorrupção? Como será a composição deste órgão?

Cláudio Weber Abramo - A idéia vem sendo desenvolvida e aplicada em alguns países há alguns anos. São exemplos Honk Kong, Coréia do Sul, Canadá, entre outros. A Agência seria formada por uma equipe fixa de no máximo 80 pessoas. Representantes temporários seriam convocados (se pertencentes ao Executivo) ou convidados (quando de outros poderes) para desenvolver tarefas específicas quando necessário. Representantes de organizações da sociedade civil seriam convidados a participar como observadores com direito a voz, mas não a tomar parte de deliberações. Organismos privados e públicos seriam convidados e/ou convocados por demanda, para realizar contribuições em suas respectivas áreas de interesse e atuação.


Rets - Quais são os seus objetivos práticos?


Cláudio Weber Abramo - O objetivo fundamental da agência é funcionar como núcleo de implementação de ações anticorrupção em especial no âmbito do Executivo federal. Alguns exemplos são: disseminação de opções de desenvolvimento e reforma administrativa, modelos de ouvidoria e outros mecanismos e o desenho dos instrumentos de monitoramento de sua aplicação; coordenação dos atores para a adoção de normas uniformes para o governo eletrônico, de maneira a maximizar a interconectividade, os instrumentos de sistematização, agregação e difusão de dados; coordenação dos estudos necessários para harmonizar alterações em normas administrativas e legais necessárias para maximizar a eficácia dos mecanismos de gestão, acompanhamento e controle; criação de indicadores numéricos que permitam aquilatar o grau de transparência e probidade em diferentes contextos e âmbitos. Para isto, poderiam ser empregados o grau de risco institucional inerente às atividades do Estado, confrontados com as medidas compensatórias concebidas para reduzi-los; medidas de fluxo de processos (na administração, no Ministério Público, no Judiciário, no TCU etc.); montagem de políticas de treinamento de pessoal para a transparência, a partir de articulações entre as diferentes escolas de governo; desenvolvimento de métodos e procedimentos padronizados para a comunicação intra- e interdepartamental.


Rets - Na proposta de criação da agência, a sociedade civil participa do conselho consultivo representada apenas por uma instituição. Demais representantes "podem" ser convidados como observadores, porém sem poder de deliberação. Não seria indicado uma maior participação da sociedade civil nas deliberações - a principal interessada em uma agência desta natureza?

Cláudio Weber Abramo - Eis aqui um equívoco bastante sério. A deliberação da sociedade civil se manifesta no ato de votar. Representações da sociedade civil não podem decidir nada no âmbito de qualquer estrutura de administração do Estado (exceto, limitadamente, nos Conselhos gestores de recursos repassados pela União a Estados e Municípios etc. em que representações da sociedade civil estão presentes paritariamente com os respectivos governos). A Agência seria um organismo montado no seio da administração, para abordar problemas da administração e montar soluções, indicadores de desempenho etc. Trata-se fundamentalmente de uma questão de gestão da estrutura do Estado. De toda forma, não haveria maiores problemas em ampliar ligeiramente a participação de entidades, mas sempre tomando o cuidado para não transformar o exercício numa espécie de assembléia geral.

Rets - De acordo com pesquisa realizada pela Transparência Brasil, 4% dos brasileiros revelam já terem sido sujeitos a pedidos de propina por parte de agentes públicos no período recente. A título de comparação, esse porcentual é de 1,4% em Portugal e de 0,1% na Suíça. Baseado nestes dados, é possível apontar os fatores que levam os funcionários públicos brasileiros a praticarem tantos atos de corrupção?

Cláudio Weber Abramo - Independentemente disso, a resposta para a pergunta "Por que a corrupção no Brasil é elevada" é respondida pela observação de que atos de corrupção só podem ocorrer porque há oportunidade concreta para sua ocorrência, e isso, por sua vez, se dá por falha dos mecanismos de controle do Estado e da sociedade. Logo, combate-se a corrupção perlo aperfeiçoamento desses mecanismos de controle e pela criação de condições para que os mecanismos funcionem melhor - como, por exemplo, entre vários outros fatores, aumentando-se a agilidade com que se dá o fluxo de informações provenientes do Estado.

Rets - Na proposta de criação da Agência, afirma-se que "a presença de controles adequados maximiza a prevenção e minimiza a necessidade de exercer repressão (...) Combater a corrupção, portanto, pressupõe aperfeiçoar os mecanismos de controle e sua articulação, entendidos estes como o conjunto dos procedimentos administrativos e de seus fluxos". Isto bastaria para combater efetivamente este tipo de prática? A disseminação de informações e a educação não seriam bons instrumentos para prevenir a corrupção?

Cláudio Weber Abramo - Não. Seriam, no máximo, iniciativas auxiliares. Ao contrário do que se imagina, a corrupção é sistematicamente condenada nos processos educacionais. Tomem-se, por exemplo, religiões. Não há uma só religião que não condene a corrupção. Como religiões "modernas" baseadas socialmente na edificação moral estão aí há séculos, caso essas exortações meramente verbais fossem suficientes, a corrupção seria muito menor do se observa. Nesse território, educa-se pelo exemplo, não pelas palavras.

Rets - A participação do Executivo é essencial para o sucesso da Agência Nacional Anticorrupção? Qual seria o seu poder de fato na Agência?

Cláudio Weber Abramo - A Agência é imaginada dentro do Executivo. Sem Executivo não há Agência. O poder de fato dependeria do efetivo comprometimento do presidente da República com o combate à corrupção.

Rets - Vocês enviaram a proposta à equipe do novo Governo Federal. Os assessores do presidente Luis Inácio Lula da Silva já acenaram com algum posicionamento favorável?


Cláudio Weber Abramo - Não, ainda não recebemos nenhuma resposta acerca do assunto.


 


Julio Cesar Brazil. Colaborou Viviane Gomes.

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