Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Artigos de opinião
Jorge Márcio Pereira de Andrade*
Dia 01, 03, 10 e 25 de dezembro, afinal o que estas datas tem em comum? Para que serem lembradas?
Os tempos modernos onde hoje a beleza poderá ser efêmera e descartável, tornando-se a feiura e o horror de amanhã, o tempo passa a ser mais que líquido, passa a ser também volátil...
Nossas memórias são tornadas também voláteis e pouco duradouras. A avalanche de dados, informações, comemorações, eventos, acontecimentos, notícias nos entopem todos os poros do cérebro e do coração.
As datas comemorativas ou de afirmação vêm sendo utilizadas para nos "lembrar" de fatos, situações ou pessoas que se destacam. Há porém datas que se aglutinam, como as do mês de dezembro - os dias 01, 03, 10 e 25 - que me parecem estar imbricadas, muito além do que aparentemente possamos constatar, mas que não são associadas ou conectadas a fios comuns de interesse ou de gênese.
Você(s) sabem o que é para ser lembrado nestes dias? Morte/saúde, diferença, segregação/poder ou redenção? Quem sabe todas estas palavras juntas quando olhamos apenas a superfície preconceituosa dos eventos associados a estas datas. Nelas podemos ver mundialmente a comemoração de combates contra discriminações ou em favor de uma Paz mundial, mas não vemos aí o verso sem o reverso de nossos medos do Outro, da diversidade, da heterogeneidade e da multiplicidade.
Há em todos estes dias alguma coisa de sofrimento do corpo do Sujeito, como um sujeito virtuoso que deve vencer seu medo, inclusive o medo de morrer das diferentes formas de violência do Mundo. O exemplo máximo seria daquele que nasceu excluído, numa manjedoura, perseguido e ameaçado de morte, tornou-se multiplicador de peixes para matar a fome de pobres e oprimidos, arrebanhador de esperanças e de milagres, defensor de "Genis" e de leprosos, que termina sendo o diferente, o proto-comunista subversivo, o pária social, o profeta maldito, enfim, o torturado de forma cruel e pública, obrigado a suportar a dor física para provar sua divindade humana, tornando-se, à moda espartana, um exemplo crucificado de que é aprendendo a suportar a dor do nosso corpo que poderemos esperar alcançar a transcendência de uma alma ou outra vida...
Enquanto isso continuamos comemorando datas, nos regozijando no corpo e na alma com nossas "bondades e benevolências", sem questionar nossa longa aprendizagem de uma submissão voluntária e de uma cumplicidade com os que exercem as diferentes violências, hoje oriundos de Novas Romas, Novas Espartas, Novas York, Novas Capitais e Capitalismos.
Por isso estou indagando o que há de comum entre estes dias de dezembro. Por isso insisto em lembrar estas datas, seu universalismo e suas formas de comemoração, para que não esqueçamos que a chamada "maioria" ou "massa", muitas vezes denominada de povo, continuará vivendo nestes dias como se fosse apenas mais um dia de abandono, miséria humana, pobreza, humilhação, desprezo, escárnio, ridicularização, ou simples banalização das violências como desigualdade social, portanto muito justificável e natural.
No 1º dia um homem oferece a humanidade seu sangue recusado e considerado impuro, no terceiro seu sangue é considerado deficiente, no décimo seu sangue é arrancado pelo açoite, para no 25º seu sangue ser considerado novamente puro e salvador.
Enfim o que deveria atravessar todas estas datas é a presença de um desejo que, na essência, no nosso sangue, nas nossas veias humanas latejassem menos preconceitos, menos estigmatização, menos violentação de direitos, e corresse livre e libertária uma nova pulsão de vida...
Dia 1º - Dia Mundial de Combate à Aids
Dia 3 - Dia Internacional da Pessoa com Deficiência
Dia 10 - Dia Internacional dos Direitos Humanos
Dia 25 - Dia do Nascimento de Jesus Cristo
Lembrete final: Nas viradas de século os homens costumam buscar Messias e salvadores da pátria e dos homens. Como nossos heróis sempre têm seus pontos de Aquiles, na desilusão costumamos e naturalizamos, após seu fracasso, crucificá-los para torná-los apenas a lembrança de nosso próprio fracasso... A construção de um mundo melhor não pode ser tarefa hercúlea de apenas um ou de poucos homens, é dever e possibilidade de todos.
*Jorge Márcio Pereira Andrade é fundador e presidente do DefNet - Centro de Informática e Informações sobre Paralisias Cerebrais.
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