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Mães em ação

Autor original: Mariana Loiola

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor

Os mais de doze anos de aprovação do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) não têm sido suficientes para conscientizar toda a sociedade para a proteção dos direitos da criança e do adolescente. Uma iniciativa recente pretende ajudar a modificar este quadro. Trata-se da Associação de Mães com filhos em conflito com a Lei (Amães), que presta assistência às famílias que se encontram em situação de risco social e adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa nas unidades de internação no estado do Rio de Janeiro. A associação afirma que o Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase) não recupera, não reintegra e não ressocializa, de acordo com os termos do ECA, os 2.500 jovens em cumprimento de medidas de privação de liberdade e liberdade assistida no estado do Rio de Janeiro.


A Amães é resultado das histórias de lutas individuais de mães, pais e responsáveis por adolescentes pegos em prática de ato infracional. As primeiras reuniões aconteceram há dois anos nas casas das próprias mães, que sentiram a necessidade de se unir e trocar experiências, a fim de lutar contra a violência e as injustiças cometidas contra os seus filhos. O coordenador executivo e de gestão da Amães, o designer Roberto Girard, conta que ao conhecer essas mães e ouvir seus relatos, se sensibilizou e se prontificou a ajudar. "Elas iam às unidades para protestar, mas não tinham nenhuma estrutura de organização. Não sabiam como proceder para obter ajuda", diz Roberto, que ajudou-as a se organizarem, o que possibilitou a fundação da associação em agosto de 2002.


O trabalho da Amães é realizado através de serviços voluntários e gratuitos de assistência jurídica, social e psicológica às famílias e aos adolescentes. As atividades são baseadas em visitas periódicas às unidades de privação de liberdade, de semiliberdade e de liberdade assistida, do sistema Degase, e nas abordagens às mães pela equipe da associação nas portas das unidades, para saber sobre a situação dos adolescentes.


Para os atendimentos, a associação conta com a parceria da Associação Beneficente São Martinho, que fornece apoio institucional, estrutura e local para o atendimento às famílias; e da Organização de Direitos Humanos Projeto Legal, que garante o apoio jurídico no atendimento aos adolescentes. O atendimentos social e psicológico às famílias são feitos através de um convênio com o Fórum de Ação Social (FAS). "Em muitas dessas famílias, ao se voltarem totalmente para os problemas dos filhos, as mães acabam sendo demitidas e perdem a sua renda", diz Roberto.


Nos primeiros seis meses de atendimento, 90 famílias foram atendidas. A elas foram dadas orientações sobre como proceder nas visitas dentro das unidades, para verificar sinais de violações dos direitos dos adolescentes (como marcas de violência no corpo). Um informativo elaborado pela associação – o "Informeca" – é distribuído aos pais para ajudar a passar essas e outras orientações. Além disso, a equipe procura apurar as denúncias de maus tratos e violações dos direitos humanos dentro das instituições, acompanhar os casos e garantir que eles tenham assessoria jurídica. Dezesseis dessas famílias foram encaminhadas para o Projeto Legal, que trabalha pela aplicação de medidas judiciais cabíveis.


Atualmente, o trabalho da equipe está intensamente voltado para o caso de um adolescente que delatou agentes do Educandário Santo Expedito, foi torturado em diferentes unidades do Degase e continua sofrendo ameaças. (Veja mais no link "Luta por proteção" ao lado.)


Roberto explica que os diretores e agentes de disciplina dessas unidades geralmente vêm do Departamento do Sistema Penitenciário (Desipe) - sistema prisional de adultos - , onde a violência contra os detentos é muito maior. "Esses profissionais nem querem ouvir falar do ECA", afirma Roberto. Por este motivo, as investigações do Ministério Público sobre as práticas de violência por parte dos agentes nas unidades do sistema Degase são extremamente dificultadas pelo corporativismo. Roberto ressalta que o principal foco de trabalho é o Instituto Padre Severino, onde a situação é ainda mais grave: "Lá a violência é praxe instituída e continuada".


A expectativa para este ano é de solidificar a associação e aumentar o número de atendimentos. "A meta é atender 600 famílias ao longo do ano e encaminhar 10% para o Projeto Legal", diz o coordenador. Outra meta para 2003 é implantar o projeto "Educando para a renda", que vai oferecer cursos profissionalizantes para adolescentes internos nas unidades de privação de liberdade e encaminhá-los para o mercado de trabalho. Para realizar todas essas ações, a Amães já está procurando conquistar novas parcerias e apoios da iniciativa privada. A associação tem outros projetos para serem implantados no futuro, como o Artezamães, um projeto de geração de renda que funcionará através de cooperativas; o projeto cultural "Cantando, pintando e dançando o sistema"; e o "Alquimia social - seu lixo é benefício", outro projeto de geração de renda e suporte para manutenção da Amães.


"Queremos modificar o quadro dentro dessas unidades, onde hoje impera a lei do espancamento. Para isto, só reivindicamos que se cumpra a lei e que a privação de liberdade e a ressocialização do jovem seja pautada em educação", diz Roberto.


Mais informações sobre a Amães pelo telefone (21) 2242-2708, pelo correio eletrônico amaesrj@ieg.com.br ou amaes@ieg.com.br.


 


Mariana Loiola

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