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Fé na própria escolha

Autor original: Mariana Loiola

Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor








Marta Baião

O movimento Católicas pelo Direito de Decidir (CDD) constituiu-se como organização não-governamental no Brasil 20 anos depois do seu surgimento nos Estados Unidos, em 1973. Apesar do nome, não é uma instituição religiosa. Ao lutar pela igualdade das relações de gênero e promover os direitos das mulheres, principalmente os sexuais e reprodutivos, o CDD busca sensibilizar a sociedade para a necessidade de mudar os padrões culturais e religiosos vigentes. Atualmente, está presente também em outros seis países da América Latina e na Espanha. Todas seguem a mesma carta de princípios e estão inteiramente integradas ao movimento feminista.


As Católicas buscam dentro da ideologia cristã os argumentos para justificar as suas idéias. O principal argumento é o fato de a própria Igreja estabelecer que, quando uma pessoa está em dúvida frente a uma questão moral, o melhor recurso que ela pode utilizar é a sua própria consciência. A partir desse princípio, o CDD defende a autonomia das mulheres, reconhecendo sua autoridade moral e sua capacidade ética de tomar decisões sobre seu próprio corpo e a sua vida, especialmente no campo da sexualidade e da reprodução humana, inclusive no caso de um aborto. O CDD Brasil luta pela descriminalização e legalização total do aborto – que, segundo a Lei do Aborto Legal, é permitido no país, em caso de gravidez decorrente de violência sexual e quando há risco à vida da mãe.


"Nossa posição não é contra a Igreja e sim de nos colocarmos de forma diferenciada em relação às suas idéias sobre sexualidade. Não queremos brigar com o Vaticano, mas fazer valer os direitos das mulheres fora e dentro da Igreja", afirma Regina Soares, diretora do CDD Brasil. Para a Igreja Católica, a relação sexual só deve ser praticada para o fim de procriação e depois do casamento. Por isso a Igreja é contra o planejamento familiar e se nega a propagar o uso da camisinha. Já para as Católicas, a sexualidade deve ser vivida de forma prazerosa, responsável e sem culpa.


Para Regina, a resistência da Igreja em dar abertura a esse tema se deve a diversos fatores. Entre eles, o incômodo provocado pela conquista da autonomia. "A estrutura da Igreja Católica é muito sexista; é toda elaborada por homens. A mulher é aceita apenas como consumidora da fé e colaboradora", diz.


Durante esses dez anos, as atividades do CDD Brasil tiveram um grande crescimento. Com apoio financeiro de fundações internacionais, intensificou a divulgação das suas idéias na mídia, entre profissionais de saúde e, principalmente, entre organizações de homens e mulheres que atuam em comunidades de base, através da produção de publicações, cartilhas e outros materiais educativos, vídeos e programas de rádio. Além disso, organiza oficinas e seminários sobre assuntos ligados à sexualidade, aos direitos reprodutivos, ao empoderamento das mulheres e à religião. Outro projeto recente é um levantamento de dados sobre casos de violência contra a mulher perpetrados por religiosos, com o propósito de contribuir para a mudança dos comportamentos em relação à violência exercida contra as mulheres, na sociedade e na Igreja.


Atualmente, o CDD Brasil atua intensamente pela expansão das suas idéias para outras regiões do país, além do Sul e do Sudeste, onde o seu trabalho é bastante disseminado. Está em andamento um projeto para capacitar mulheres de organizações para se tornarem multiplicadoras nas regiões Norte e Nordeste, onde existe uma grande carência de informação e o índice de violência sexual é muito grande, segundo Rosângela Talib, psicóloga e responsável pela área de Projetos da CDD Brasil. "A maioria das mulheres dessas regiões não sabe que pode recorrer a serviços de saúde. Nossa intenção é que elas usufruam do que já existe e é gratuito", afirma. Ela lembra que as Católicas defendem a possibilidade de a mulher decidir livremente sobre o seu corpo, desde que tenha informações e condições suficientes para isto.


Outro papel assumido pelas Católicas é o de cobrar do governo a implementação de programas de educação sexual, leis e políticas públicas relativos aos direitos sexuais e reprodutivos que possibilitem o acesso a serviços de saúde de qualidade por todas as mulheres (especialmente as mais pobres), métodos de planejamento familiar e distribuição gratuita de contraceptivos. Juntamente com outras organizações de mulheres, as Católicas têm uma grande inserção no Ministério da Saúde, levando propostas e participando sempre de reuniões para tomada de decisões sobre o assunto. Por esse importante papel – que, segundo Rosângela, é uma peculiaridade do CDD Brasil –, a organização contribui de maneira significativa para o avanço do movimento feminista no país. Completamente articuladas com o movimento de mulheres, as Católicas são referência em toda ocasião que envolva discussão religiosa sobre direitos sexuais.


De fato, a educação é a maior preocupação das Católicas hoje. Um dos principais desafios da organização, no momento, é como trabalhar a sexualidade e a prevenção com os jovens, devido aos altos índices de gravidez precoce, à Aids e à incidência de doenças sexualmente transmissíveis nesse grupo.


Fé no ser humano e na sua consciência é a fé das Católicas: não deve ser considerada pecado, mas uma virtude.


O contato com o CDD Brasil pode ser feito pelo telefone (11) 3107-9038 ou pelo correio eletrônico cddbr@uol.com.br.


Mariana Loiola

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