Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
Mesmo com tantos fatores a serem analisados e estudados quando se fala em transgênicos, o fato é que uma grande parcela da produção de soja no Brasil este ano é comprovadamente de sementes transgênicas, apesar de as suspeitas já existirem há tempos. “Para nós, isso não é novidade. Viemos avisando o governo anterior e cobrando ação, mas a gestão era conivente com os fabricantes de transgênicos e estava inclusive junto com eles em uma ação na Justiça para liberar a plantação”, afirma Flávia Londres.
A não comercialização dos grãos tem conseqüências não só econômicas como políticas e sociais muito grandes. As econômicas talvez estejam pesando mais na balança: são milhares de agricultores – muitos deles familiares, pequenos e médios, sem terra – que dependem da produção para sobreviver. Quanto aos aspectos políticos, não se pode ignorar que a diretriz prioritária do governo Lula é o combate à fome, e queimar ou jogar no lixo toneladas e toneladas de soja é, no mínimo, incongruente. No campo social, gera divergências que podem afastar o agricultor do governo e, talvez, aproximá-lo das grandes empresas produtoras da semente geneticamente modificada, que estão “do lado” dos trabalhadores rurais nesta questão.
Diante dessa realidade, o que fazer? Encontrar a solução é a tarefa da Comissão Interministerial de Alimentos Transgênicos, instituída pelo Governo Federal. Segundo Flávia Londres, a campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos vinha tentando fazer contato com o presidente Lula desde que ele foi eleito, para discutir essa comissão: “Tentamos várias vezes, porém não conseguimos nos encontrar com o então presidente eleito para marcar a posição das entidades da campanha e propor a criação da Comissão com a presença de representantes da sociedade civil. Mas foi isso que aconteceu”.
No entanto, a campanha e as instituições interessadas no tema não desistiram de ver seu posicionamento contemplado e, para isso, realizaram Brasília de 18 a 20 de março o seminário “Ameaça dos Transgênicos - Propostas da Sociedade”, organizado pelas seguintes entidades: ANA – Articulação Nacional pela Agroecologia, campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos, CONTAC – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria da Alimentação e Assalariados Rurais, CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, CUT Nacional, FETRAF-SUL/CUT – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar - Região Sul, MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra e Núcleo Agrário do Partido dos Trabalhadores.
“Nossa intenção é marcar o nosso posicionamento político e mostrar o que nós, preocupados e acompanhando esta questão, consideramos necessário que seja feito”, explica Londres. O seminário rendeu três documentos oficiais: um com as propostas da sociedade civil organizada acerca do assunto; uma carta ao presidente Lula, assinada por 85 organizações e já protocolada no Palácio do Planalto; e uma moçao de censura ao ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, também já protocolada. Todos os documentos podem ser acessados no site do seminário (veja a coluna Links Relacionados, ao lado).
Até agora, nada foi decidido oficialmente pela Comissão Interministerial. Somente foram divulgadas as principais tendências para a tal saída jurídica que se espera. A que tem se mostrado mais razoável – e que, por isso, tem conseguido o maior número de adeptos – é a exportação para países que permitem a comercialização de transgênicos. “É a única saída que vemos como mais adequada”, Andrea. Flávia Londres também concorda e pondera: essa decisão deve ser tomada com algumas ressalvas. “O governo atual tem que deixar claro que está adotando esta medida em caráter de emergência, se comprometer a garantir formas de acesso dos agricultores a sementes não transgênicas e informar que a partir da próxima safra deve e vai haver punição”, diz Londres.
Aparentemente não receosos das possíveis punições, os agricultores gaúchos ligados à Fetag-RS decidiram comercializar a safra de soja que terminará de ser colhida nos próximos dias no estado. “Acabamos de fazer um ato público aqui em Não Me Toque (RS) que reuniu mais de cinco mil trabalhadores e decidimos comercializar a safra de soja que está sendo colhida. Não podíamos mais permanecer com o clima de angústia e desespero em que estavam os agricultores”, diz Ezídio. Segundo ele, a Fetag-RS – que congrega 356 sindicatos e 527 mil associados – havia dado um prazo para o governo até o dia 20, às 10 horas. Como nenhuma decisão oficial foi tomada até então, a decisão dos agricultores era comercializar. “Devido à inércia do governo, à falta de decisão, vamos comercializar”, diz ele.
Segundo o presidente da Fetag-RS, a instituição recomenda a pesquisa sobre os transgênicos. Ele afirma ainda que todos os segmentos de agricultores plantaram as sementes geneticamente modificadas – pequenos, médios e grandes (portanto a não comercialização afetaria todas as camadas) – e muitos deles teriam feito isso sem saber das reais implicações jurídicas. De acordo com Ezídio, o próximo passo é o encaminhamento da decisão para a Presidência da República e para a Comissão Interministerial que está cuidando do assunto.
Ao saber da decisão da Fetag-RS, Flávia Londres reafirmou a necessidade de punição: “É importante ressaltar que ações como essa não podem passar sem ser punidas, pois são uma abertura de caminho para a legalização dos transgênicos”.
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