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Voluntários: ação, participação e consciência

Autor original: Fausto Rêgo

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Cinco mil participantes é a meta dos organizadores, mas a expectativa é de uma adesão ainda maior da juventude brasileira ao Dia Global do Voluntariado Jovem deste ano. O "dia" é, na verdade, um fim de semana inteiro de atividades como coleta seletiva de lixo, mutirões de limpeza, doação de sangue, campanhas de conscientização e arrecadação de alimentos.

A idéia surgiu nos Estados Unidos, há 12 anos, por iniciativa de duas organizações: a Youth Service America e a Global Youth Action Network. No Brasil, a data está sendo comemorada pelo quarto ano consecutivo – sempre no primeiro semestre. Desta vez o Dia Global está marcado para o fim de semana de 11 a 13 de abril, mobilizando jovens de cerca de 150 países. A organização Natal Voluntários é uma das responsáveis pela coordenação nacional do evento, que tem o objetivo de incentivar ações sociais, beneficiar comunidades, despertar o interesse dos jovens pelas práticas solidárias e, sobretudo, mostrar a importância da participação de cada um para a construção de uma sociedade mais justa.

Na última quinta-feira, 27 de março, a entidade comandou a primeira de uma série de videoconferências para decidir estratégias nacionais de articulação. Esse primeiro encontro contou com a participação de representantes do Instituto SIFE, do Grupo Interagir, do Portal do Voluntário, da Federação das Bandeirantes e do RioVoluntário. Algumas idéias surgiram, como a realização de uma gincana na Internet e a montagem de um painel de fotos das ações realizadas em todo o Brasil.

Nesta entrevista, a diretora-presidente da Natal Voluntários, Mônica Mac Dowell, fala sobre o evento deste ano e destaca a importância do trabalho de conscientização para a formação da cidadania. Recentemente, a organização apresentou ao governo do estado do Rio Grande do Norte a proposta de criação do Certificado de Estudante Voluntário, a ser oferecido aos alunos das escolas públicas. O decreto vai ser assinado durante a semana do evento, mas a idéia é que os certificados sejam adotados também em toda a rede pública de ensino do país.

Rets - Uma curiosidade: por que o evento chama-se Dia Global do Voluntariado Jovem, se são três dias de atividades?

Mônica Mac Dowell - Há 12 anos, foi criado nos Estados Unidos o Dia Nacional do Voluntariado Jovem. Era, realmente, um único dia. Depois de algum tempo, o evento foi ampliado para todo o mundo, passando a se chamar Dia Global do Voluntariado Jovem. Em 2001, ele foi realizado no dia 26 de abril. Ocorre que aquele foi justamente o Ano Internacional do Voluntariado, o que acabou provocando uma adesão maciça no mundo inteiro. Por causa disso, a partir do ano seguinte, o evento passou a ser realizado ao longo de um fim de semana, embora o nome tenha sido mantido.

Rets - Que análise a senhora faz da participação das organizações brasileiras e dos resultados obtidos por essa iniciativa nos anos anteriores?

Mônica Mac Dowell - Até o ano passado, nossa atuação havia sido apenas local. Participamos dos eventos de 2001 e 2002. No primeiro, nos concentramos nas atividades de arrecadação. A partir de 2002, no entanto, começamos um trabalho mais efetivo nas escolas, com palestras e investimento em conscientização. Tivemos um avanço muito grande em termos de participação. Até mantemos ações de arrecadação atualmente, não temos nada contra, mas preferimos incentivar a conscientização. Procuramos promover palestras em escolas sobre prevenção da dengue, coleta seletiva de lixo, sexualidade... e há um interesse muito grande, muitos jovens interessados em participar.

Este ano assumimos a coordenação nacional e, pelo que a gente percebe, há diversas organizações fazendo ótimos trabalhos. Um exemplo é o Centro de Voluntariado de Rio Claro, no estado de São Paulo. Eles estão finalizando uma conferência que tem como objetivo estimular os jovens a darem sugestões para solução de problemas do município. E os jovens têm muito a contribuir.

Rets - De que forma?

Mônica Mac Dowell - Pra você ter idéia, em uma das oficinas que fizemos aqui, com jovens de escolas de comunidades de baixa renda, eles tiveram a iniciativa de ir atrás de estudantes universitários para criar grupos de estudo. Criaram um projeto, o Projeto dos Tutores, conseguiram uma adesão maciça dos universitários e formaram várias duplas de trabalho. No segundo ano o projeto mudou de nome, passou a se chamar Elo Universitário. E nós atuamos simplesmente como facilitadores. Hoje em dia, quando a gente pergunta se eles precisam de alguma coisa, eles dizem que não precisam de nada. Estão cuidando de tudo sozinhos. Não é maravilhoso?

Temos também um trabalho com crianças, e muitas delas já demonstram uma consciência impressionante do que é ser voluntário, de qual o papel do voluntariado. Se apenas com uma ação pontual elas já adquiriram essa noção, imagine o que seria possível com um trabalho mais intenso! Elas, no futuro, vão poder tomar a iniciativa, cobrar soluções do poder público.

Enfim, o que a gente acredita é nisso. Se o jovem tiver oportunidade, mesmo nas coisas mais simples, ele vai querer participar, vai se dispor a contribuir. E foi por esse motivo que nos reunimos recentemente com a governadora do estado e conseguimos que ela apoiasse a idéia de criar o Certificado de Estudante Voluntário, que não tem caráter obrigatório, será apenas uma forma de estimular a ação voluntária. O decreto deve ser assinado durante os dias do evento.

Rets - Houve também um encontro com o ministro da Educação, não foi?

Mônica Mac Dowell - Sim, também estivemos com o ministro da Educação, Cristovam Buarque, e sugerimos a ele a criação do Dia Nacional do Voluntariado. Propusemos que fosse no dia 15 de setembro, pois é uma data vazia, em que não se comemora nada. Assim, teríamos o Dia Global no primeiro semestre e o Dia Nacional no segundo. O ministro gostou, mas ainda não há nada decidido. Ele também achou bastante interessante a idéia do Certificado de Estudante Voluntário. Nós estamos sugerindo que ele seja adotado em todas as escolas públicas do país.

Rets - Qual a expectativa de vocês para o evento deste ano e que atividades serão realizadas? O foco vai ser no combate à dengue e na preservação do meio ambiente?

Mônica Mac Dowell - Principalmente meio ambiente, limpeza e conservação. A dengue continua em pauta, mas não tanto quanto no ano passado. Isso tudo localmente. Para os comitês locais em outros estados, estamos cedendo o material que produzimos e conversando com várias organizações que poderão aderir ao evento.

Em Natal, já temos mais de mil inscritos. A expectativa é chegar a dois mil. Em termos nacionais, a meta estabelecida pela Global Youth Service Day para o Brasil é de cinco mil participantes. Eu acredito que esse número vai ser superado.

Rets - A participação é sempre por intermédio das escolas?

Mônica Mac Dowell - A gente sempre incentiva que a participação se dê por intermédio da escola, que é uma forma de garantir a continuidade do trabalho. A idéia é dar oportunidade para a mobilização dos jovens, e a escola tem um papel fundamental. Mas as pessoas podem se organizar em suas ruas, em suas comunidades. Basta entrar no site, ligar para a gente ou procurar um comitê local. Se um grupo quiser fazer mutirão de limpeza, a gente tem uma parceria com o órgão de limpeza pública. Quem quer plantar mudas vai ser encaminhado para o horto botânico. E por aí vai. Este ano, acredito que um dos nossos pontos fortes será a doação de sangue.

Rets - A Natal Voluntários é a única responsável pela coordenação nacional do evento?

Mônica Mac Dowell - A Natal Voluntários foi a primeira a ser chamada para a coordenação nacional. Nossa organização é pequena, mas estamos convocando outras para formar um comitê nacional. Independentemente disso, já convidamos vários centros de voluntariado e estamos realizando todas as atividades de preparação.

Rets - O que é oferecido a esses jovens após os três dias de atividades? Existe alguma perspectiva real de aproveitamento posterior do trabalho desses rapazes e moças em alguma entidade ou mesmo alguma atividade regular que busque estimulá-los a contribuir com o processo de transformação social?

Mônica Mac Dowell - Em nível local, temos exemplos de grupos e escolas que participam de oficinas sobre ética, cidadania e voluntariado. Quando passa o Dia Global, enviamos a cada um o relatório do que aconteceu e chamamos para as oficinas.

Em âmbito nacional, vamos fazer um mapeamento dos jovens que estão praticando o voluntariado e encaminhar esse trabalho para organizações como a Faça Parte e outras organizações locais, para que elas façam o acompanhamento necessário. Não existe nenhum compromisso de que qualquer ação seja feita. Nós vamos mapear e enviar para eles como subsídio. E também estaremos mandando para os centros de voluntariado.

Outra coisa que considero muito importante, nesse aspecto, é o certificado. Ele tem o papel de incentivar o jovem a se voltar para as questões práticas do dia-a-dia. É um reconhecimento e um diferencial para quem estiver procurando emprego. Nós fomos ao Ministério do Trabalho para estudar como poderíamos articular as ações voluntárias como facilitadoras do primeiro emprego. O certificado não seria uma forma de excluir quem não tem, mas sim um diferencial, uma qualificação a mais.

Rets - Hoje, com a profissionalização cada vez maior do terceiro setor, qual é o espaço do voluntariado?

Mônica Mac Dowell - Acho que a profissionalização do terceiro setor não exclui o trabalho voluntário. Ele continua sendo essencial e também está cada vez mais profissional. Nós acreditamos que os nossos profissionais podem começar como voluntários para depois serem contratados. Temos, por exemplo, cinco casos desses aqui, na nossa organização. Embora haja organizações que hoje prefiram abrir mão do voluntariado, acho que ele continua sendo a base e é fundamental. É um trabalho que só tende a se expandir.

Fausto Rêgo

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