Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
![]() Luis Felipe Araujo Florez | ![]() |
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O exercício da cidadania tem mais um lugar para se fortalecer, agora no mundo dos bits e bytes: o Portal Cidadania na Internet (www.cidadania.org.br), lançado na quinta-feira, 27 de março. O projeto foi um dos 38 selecionados entre os 2.244 que concorreram ao concurso de projetos do Programa Petrobras Social e contou com o apoio da empresa para ser concretizado. Idealizado pela RITS, o portal é um espaço suprainstitucional. É das pessoas interessadas, de todos e todas. O desenvolvimento diário vai ser possibilitado e alimentado pelas organizações parceiras, que incluirão conteúdo e, colaborativamente, ajudarão na condução e no desenrolar do portal. Até agora, existem 20 entidades parceiras, mas a intenção é arrebanhar sempre mais. Prioritariamente, cada parceiro irá inserir conteúdo na editoria que mais tiver relação com sua área de atuação (veja box ao lado para saber quais são as editorias). “Articulação é a palavra-chave”, diz Paulo Lima, diretor executivo da RITS, destacando que o Portal Cidadania na Internet sintetiza um importante êxito de seis anos de trabalho da entidade para o fortalecimento da sociedade civil.
O Cidadania na Internet é um lugar de convergência, de troca e de construção. Convergência, pois diferentes instituições de uma mesma área de atuação estarão se voltando para um mesmo lugar, divulgando, colhendo e, principalmente, refletindo sobre informações. O que leva à troca: de experiências, de conhecimento, de expectativas, de know-how, de sonhos e de realidades. A construção de um mundo e de pessoas mais cidadãs, mais conscientes; a construção de conhecimentos, de projetos, de novas propostas e linhas de trabalho é justamente resultado daquelas trocas. E assim, baseado nos pilares informação, tecnologia e parcerias, o Cidadania na Internet pretende ser instrumento virtual para mudanças reais. É o que enfatiza Luiz Antônio, diretor da FASE, uma das parceiras do portal: “Nós estamos descobrindo no Brasil que a construção da democracia é uma coisa difícil. Um elemento fundamental é que os atores que constroem a democracia precisam ter, cada um, compromisso com o outro. Se mudanças não acontecem sem partidos, não acontecem sem sindicatos, também não acontecem sem movimentos sociais, sem organizações não-governamentais. Há uma interdependência nesse sentido. E espaços na Internet que permitam que todas organizações e todos os cidadãos interessados na construção da democracia veiculem as descobertas, as ações e as opiniões são fundamentais tanto para as ONGs, quanto para os movimentos populares, os movimentos sociais”, diz.
Autonomia e liberdade
Uma das características principais, e talvez a maior contribuição do Portal, é representar uma possibilidade a mais de as organizações difundirem informações sobre seus trabalhos – de forma nova, livre e sem crivos ou censuras. Como lembra Luciano Rocco, da Revista Ocas, parceira do portal, “a importância de um projeto como esse é você poder dar acesso para as organizações divulgarem o conteúdo dos seus trabalhos de uma forma autônoma, sem que isso dependa de uma outra organização que tenha poder sobre a edição deste material. Ou seja, isso permite que as organizações tenham muito maior liberdade e autonomia. É como se se estivesse dando voz àquelas instituições que normalmente não têm voz. Além disso, permite às pessoas que não têm muita familiaridade com o terceiro setor adquirirem maior conhecimento, maior visão sobre o que é esse setor. Vão poder, através desse portal, ter uma visão mais clara sobre o que é essa pluralidade”.
Francis Bossaert, do Campo – Centro de Assessoria ao Movimento Popular, outra organização parceira, é da mesma opinião. Ele acredita que, mais do que para o Campo, é muito interessante para os grupos que o Campo assessora estarem na iniciativa. ”Pela primeira vez, grupos como estes poderão se colocar no ar sem filtros. Normalmente o jornalista trabalha de forma inversa: é ele quem decide o que é notícia, o que quer colocar na notícia. Pela primeira vez, que eu saiba, vão ser os grupos que vão definir. Isso, para mim, é revolucionário”. Luiz Antônio, da Fase, complementa: “Assim como nós brigamos anos pela liberdade de imprensa, hoje é importante a grande imprensa encontrar um espaço onde elas possam encontrar o que as ONGs estão verdadeiramente tratando”.
Assim, o Cidadania na Internet pretende se consolidar como um veículo alternativo, leitura obrigatória para todos aqueles que desejam saber o que pensam e o que fazem as organizações do terceiro setor. O público-alvo são todas as pessoas interessadas, quer sejam ligadas a alguma organização não-governamental, quer sejam apenas curiosas e interessadas pelo terceiro setor. “Neste espaço, as questões ligadas à construção e à defesa da cidadania podem ser trabalhadas de forma integrada e contextualizada. Além disso, o leitor poderá encontrar no portal opiniões diversas sobre um mesmo tema, o que possibilita a percepção mais apurada do que é o universo complexo das ONGs e demais instituições que compõem o terceiro setor”, afirma Graciela Selaimen, diretora de Informações da RITS.
“Esse portal é de grande importância para as ONGs, pois elas têm mais um instrumento para divulgarem seus trabalhos e também para se auto-estruturarem na questão da informação. Pois hoje vivemos em um globalizado. Tudo está voltado à Internet; tudo é muito rápido, muito ágil. Esperamos que o Brasil e o mundo estejam conectados, para que a gente tenha conhecimento de projetos como os executados pelos parceiros do Portal, e que estimule que outras ONGs sejam criadas no Brasil – para que o desempenho delas seja cada vez melhor, cada vez com mais qualidade”, avalia Marco Antônio de Jesus, o Doutor Zé Gotinha do grupo Doutores da Folia, que atua em hospitais da Baixada Santista.
Transversalidade, fusões e casamento
Já Cláudia Werneck – da ONG Escola de Gente, que trabalha pela construção de uma sociedade inclusiva – lembra a possibilidade da transversalidade: “Nós, do terceiro setor, somos ainda muito solitários. Defendemos causas que raramente se encontram. E é isso que poderemos trabalhar no Portal, na minha opinião. A Escola de Gente quer estar presente em todas as causas e saber como nós podemos ser úteis aos parceiros. Acho que o Portal, além de fundir causas, pode nos ajudar para que consigamos ter uma reflexão nova, que acho que nenhum de nós tem, que é a reflexão sobre a sociedade realmente inclusiva”. Além disso, Cláudia acredita ainda que o Cidadania na Internet pode proporcionar uma reflexão mais crítica por parte da grande mídia, ao ajudá-la a compreender questões complexas trabalhadas pelas ONGs e perante as quais os jornalistas normalmente – segundo ela – são ingênuos. A Escola de Gente também é parceira do portal.
Madalena Guilhon – do Cemina - Comunicação, Educação e Informação em Gênero e da Redeh - Rede de Desenvolvimento Humano – também acredita na possibilidade de complementação de trabalhos e causas. Segundo ela, “no campo do Cemina e da Redeh, temos o diferencial da questão de gênero, que trazemos para o portal, e teremos muito o que trocar com as outras editorias. Além do fato de irmos buscar no portal muitos outros temas que nos interessam e outras experiências de outros setores”. Ela destaca também a possibilidade de concretizar novas parcerias: “Sem dúvida, o fato de que teremos muitas organizações vai permitir que, mesmo sem conhecer inicialmente outros atores, a gente abra novas frentes de trabalho de parceiros. O mais interessante é que essas coisas todas vão estar à disposição.”
A Andi - Agência de Notícias dos Direitos da Infância é outra instituição parceira. Para Marcus Fuchs, diretor de desenvolvimento da entidade, o Portal tem muito a ver com o que a Andi acredita que é o papel dela como ONG de comunicação. “Ele favorece que informações sobre cidadania se disseminem mais integradamente para promoção dos direitos humanos. Com o portal vamos poder congregar, reunir. Será mais um canal de comunicação e troca de experiências”, diz ele, completando: “Para nós, vai ser a mão na luva, o casamento perfeito: fortalece a missão da Andi de valorizar informações que apontem soluções para as questões relativas à infância à adolescência”.
Possibilidades na tecnologia
No cerne da ideologia do portal está a utilização das novas tecnologias da informação e da comunicação (TICs) e suas várias possibilidades para ajudar no exercício da cidadania que se pretende estimular. Como correntemente é dito e notado, os avanços tecnológicos são crescentes e a cada dia tomam mais lugar na vida das pessoas. Assim foi com o rádio, com a televisão, com o telefone celular, e assim está sendo com a Internet, que para muitos já é realidade familiar. A transmissão instantânea de dados; a possibilidade de interagir on-line com pessoas do outro lado do mundo, através de salas de bate-papo, de fóruns de correio eletrônico; de utilizar a rede mundial de computadores para fazer denúncias que a grande mídia ignora; de articular redes, campanhas, projetos e pressão sobre o poder público só com o uso da Internet. Tudo isso faz parte deste admirável mundo novo, cada vez mais dominado pelas ONGs e movimentos sociais cientes de seu potencial.
Para o atleta e medalhista olímpico Zequinha Barbosa, o importante, agora, é direcionar bem o uso destas tecnologias. “É fundamental colocar informações num portal como esse. Hoje, o mundo da tecnologia da informação tem que ser bem usado, bem explorado e bem trabalhado. Esse é um caminho fundamental para nós, que trabalhamos no terceiro setor, organizações civis”. Zequinha refere-se ao Instituto Zequinha Barbosa Correndo pela Vida que ele idealizou e fundou no ano passado, para utilizar o esporte na educação de crianças de até 14 anos. “Temos que ter acesso às informações da forma mais rápida. Até para poder conter um pouco essa escalada da violência no Brasil – e eu não me refiro só à violência física, mas à violência contra os direitos das pessoas, a violência da exclusão social, da fome etc. Nós não podemos ficar passos atrás, e este portal é uma boa ferramenta para ficarmos passos à frente”. Palavra de corredor.
Já Luiz Antônio, da Fase, alerta para a necessidade de utilizar devidamente as novas possibilidades. “A Internet pode ser uma faca de dois gumes. Pode-se criar uma falsa impressão de difusão de informação pelo fato de se colocar um site de uma instituição no ar. Isso, simplesmente, não significa que a informação esteja circulando. O que eu acho interessante em portais como o Cidadania na Internet é que eles não competem com os sites de cada um, mas concentram informação e criam a possibilidade de que a sociedade, através deles, obtenha informação, inclusive de outro sites. Ou seja, são uma pista, uma porta para as ações de cidadania.
Cidadania no Portal ou repórteres por um dia
E a construção de uma cidadania mais forte já começou na construção do próprio portal. Meninos e meninas da Associação São Martinho – que trabalha junto a crianças e adolescentes em situação de rua ou moradores de comunidades de baixa renda – foram treinados e capacitados para atuarem inserindo informação no Cidadania na Internet, o que aconteceu antes e durante o lançamento do portal. Assim, no processo de aprendizagem, produziram textos sobre seu cotidiano, relatando com suas próprias palavras percepções sobre como o portal poderá atuar para benefício deles e, principalmente, utilizando a palavra e o espaço oferecido para fazerem críticas, contarem como é seu dia-a-dia, as injustiças e os momentos bons. Na noite da quinta-feira, 27 de março, eles e elas se familiarizaram ainda mais com gravadores e com a palavra, passando por cima da vergonha e entrevistando as pessoas presentes ao evento de lançamento da iniciativa.
“O Portal é, para nós, uma oportunidade de utilizar a mídia alternativa – que nos é muito mais eficiente – para fazer ecoar as questões relativas a crianças e adolescentes e da própria instituição. Além disso, será interessante que grupos diversos espalhados pelo Brasil se conheçam, construam pontes de conhecimento. Que possam debater e dar consistência a algum assunto de uma forma mais democrática, menos formal”, diz Mauro Gaspar Filho, responsável pela área de Comunicação da São Martinho.
Segundo ele, a função mais importante da participação da entidade no portal, no entanto, é a capacitação dos meninos e meninas para atuarem como jornalistas, criar neles uma massa crítica. No futuro, a intenção é que eles e elas sejam responsáveis pela própria atualização de notícias do site da São Martinho e também pela inserção de conteúdo no Cidadania na Internet. “Meu sonho dourado é ver algum dos meninos, no futuro, assumir meu lugar aqui na São Martinho”, afirma. Se, como diz o dito popular, sonho que se sonha junto é realidade, Mauro vai ter a companhia de todos os participantes do Portal.
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