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Racismo na fita

Autor original: Marcelo Medeiros

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“Seu macaco”; “ô neguinho”; Essas são apenas duas expressões entre várias utilizadas por crianças em salas de aulas para se referir a seus colegas negros. Por mais que se alegue serem apenas brincadeiras ingênuas de crianças, são termos ofensivos e carregados de racismo. Para tentar acabar com seu uso e também com outras práticas racistas comuns em escolas, o Cecip (Centro de Criação de Imagem Popular) lançou em 21 de março – Dia Mundial Cont ra a Discriminação Racial - a campanha Direitos São pra Valer – Ação Contra a Discriminação Racial.


Foram produzidos uma série de artigos educativos que serão doados a escolas cariocas para orientar alunos, alunas e professores sobre como evitar ofensas raciais e ainda formar pessoas multiplicadoras de idéias anti-racistas, por meio de capacitações feitas nas instituições de ensino interessadas em participar da campanha. O Ciep Nação Mangueirense, na comunidade da Mangueira, zona norte do Rio, será sede do projeto-piloto. Lá, a metodologia será testada e espalhada para o resto da cidade após avaliação. “É um trabalho a médio prazo, pois não é uma questão que pode ser mudada de uma hora para outra”, ressalta Daniel Caetano, coordenador da campanha.


A primeira etapa consistiu na produção de material. Durante o ano passado foram feitos dois vídeos, um manual para os professores e vinhetas de rádio. Uma das fitas, chamada “Alguém Falou em Racismo?”, tem 20 minutos de ficção e foi dirigida por Daniel Caetano e Claudius Ceccon, secretário geral do Cecip. A história, como não poderia deixar de ser, é sobre a discriminação em sala de aula. A outra é uma vinheta de 30 segundos, dirigida por Ceccon, que conta com a participação da atriz Zezé Motta e já está sendo veiculada por algumas emissoras, assim como os spots radiofônicos.


O manual, intitulado "Pele Escura, Estrada Dura, Beleza Pura - Desconstruindo o racismo na escola e na comunidade" traz uma série de textos sobre a África, a questão racial hoje, uma avaliação da abolição da escravatura e análises de ações afirmativas, entre elas o sistema de cotas – implantado das universidades estaduais do Rio de Janeiro, gerando muita polêmica . Haverá ainda outdoors espalhados pela cidade e cartazes em estações de metrô para divulgar a mensagem anti-racismo.


Metodologia


Todos esses itens serão utilizados por 15 educadores, entre professores e animadores, que trabalham na escola da Mangueira onde será desenvolvido o projeto-piloto. A eles serão somados 15 alunos, que, juntos, estarão incumbidos de produzir um vídeo de aproximadamente 10 minutos sobre o conteúdo discutido durante os três meses de encontros semanais de capacitação. Assim o Cecip não só utiliza sua principal ferramenta de trabalho - os recursos audiovisuais - para conscientizar, como ensina e estimula que crianças e adolescentes, alvo da campanha, façam o mesmo.


As atividades teóricas começaram no início de abril e serão seguidas pela prática. De acordo com Daniel Caetano, a idéia é desconstruir a teoria racista. “Vamos discutir o conceito de raça e atitudes comuns de acordo com biólogos, que acreditam na existência de uma só raça – a humana -, e sociólogos, que afirmam que raça é um conceito socialmente elaborado e, por isso, pode variar”, explica.


Capacitados, os multiplicadores devem espalhar a informação pela comunidade. Em seguida serão enviados os materiais para outras escolas e formados novos multiplicadores. Ainda está em estudo a quantidade, que deve variar entre 200 e 500 kits (vídeos e manual).


Negligência de professores foi motivação


A idéia de fazer a campanha em escolas surgiu da constatação por parte de integrantes do Cecip de que os professores não coibiam as atitudes racistas dos alunos, que as tomavam por normais ou simples brincadeiras. Os mestres reclamavam de não ter meios interessantes de abordar o problema e alunos e alunas demonstravam desinteresse. O uso de vídeo, porém, parece resolver a questão, pois as crianças ficam mais curiosas e ainda mais motivadas ao fazerem um curta-metragem. Dificuldades iniciais para o uso dos equipamentos estão previstas, mas devem ser logo superadas, de acordo com Caetano, para quem o uso de imagens é muito mais atraente e familiar do que qualquer outra forma atual de aprendizado escolar. Além desta constatação, a campanha também foi motivada pela lei 10.639/2003, que recentemente foi aprovada no Congresso e obriga as escolas de ensino médio e fundamental a oferecerem a disciplina História e Cultura dos Afro-Brasileiros.


Assim, quem sabe, daqui a alguns anos haverá adultos sem preconceitos, que tratem seus colegas não com frases carregadas de heranças racistas, mas com respeito.


Os interessados em participar da campanha, devem entrar em contato com o Cecip pelo telefone (21) 2509-3812.


 


Marcelo Medeiros

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