Autor original: Mariana Loiola
Seção original: Os mais interessantes e ativos projetos do Terceiro Setor
Para comemorar os seus 30 anos de trabalho, a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese) realiza, no próximo dia 13 de junho, em Salvador, um debate público sobre segurança alimentar e superação da violência. O evento – com o nome de "Pão e Paz" - dará destaque a alguns dos temas que há três décadas preocupam a entidade, nos seus esforços de proporcionar melhores condições de vida para a população.
Pouco conhecida pelo público em geral, a Cese já apoiou mais de seis mil projetos e beneficiou cerca de seis milhões de pessoas, em diversas regiões do país. Constituída por igrejas cristãs, em 1973 a organização foi criada com a missão de fortalecer ações de grupos de movimento popular, empenhados nas lutas por transformações políticas, econômicas e sociais. O objetivo é que essas transformações conduzam a estruturas e relações em que prevaleça democracia com justiça. Ao longo dos seus anos de atuação, a Cese construiu parcerias com entidades como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (Ceris), Associação Brasileira de Organizações Não-governamentais (Abong), Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), entre outras. Com uma intensa atuação na área de direitos humanos, a Cese participou, inclusive, da criação do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Direitos - entendimento mais amplo
Há 30 anos, em plena ditadura militar, a preocupação da organização era lutar pelos direitos civis e políticos dos cidadãos. Devido ao contexto atual, a entidade atua, hoje, baseada num entendimento mais amplo de direitos humanos - a luta é para fortalecer as intervenções das organizações da sociedade civil, pela garantia de direitos civis e políticos, mas também econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Uma das principais linhas de atuação da entidade é o apoio a projetos que envolvam a participação popular, nas áreas de desenvolvimento institucional, saúde, educação, comunicação, cultura, meio ambiente, entre outras. São apoiados, por ano, cerca de 450 projetos, em áreas rurais e urbanas.
Segundo Eliana Rolenberg, diretora-executiva, a Cese foi pioneira no apoio a pequenos projetos. "Antes só os grandes projetos ganhavam apoio das instituições. A Cese começou a questionar isso e constatou que esses projetos não beneficiavam diretamente a população", diz. A entidade definiu, então, que a sua forma de apoio seria voltada para "projetos-sementes", complementar aos próprios esforços desses pequenos grupos e que não criasse dependência. O perfil desses projetos abrange o combate à pobreza, à marginalização ou à exclusão; a conscientização das comunidades envolvidas quanto à realidade social e a organização comunitária, para intervenção nas políticas públicas (através de formulação e fiscalização).
Exemplo e autonomiaUma iniciativa apoiada pela Cese, no Piauí, chamou a atenção do poder público local e serviu de modelo para a realização de outros projetos. A iniciativa foi do Centro Educacional São Francisco de Assis (Cefas), que oferece capacitação a trabalhadores rurais na comunidade de Alegre, próxima ao município de Floriano. A Cese, que apóia o processo produtivo de alguns trabalhadores atendidos pelo Cefas, financiou em 2000 a construção de um poço artesiano para a produção de hortaliças. Segundo Eliana, o prefeito tentou identificar o poço como trabalho da prefeitura - e a comunidade colocou uma placa com o nome da Cese. "Após esse incidente, a prefeitura passou a ter outra postura e a liberar recursos para projetos populares na região", conta. Para Cláudia Patrícia, do Cefas, o apoio da Cese foi determinante na vida dos trabalhadores. "Agora, através da melhoria da renda, eles têm como melhorar também as suas condições de vida", diz.
Além de contribuir com recursos financeiros - provenientes, em sua maioria, de instituições internacionais -, a Cese promove encontros regionais e temáticos, para articulação entre os projetos e desenvolvimento de soluções para os seus trabalhos. A prioridade é dada a iniciativas das regiões Norte e Nordeste (onde existe maior concentração de pobreza), mas a abrangência é nacional.
Eliana, que está na direção da entidade desde 1983, nota que existe um grande aumento de demandas. "A mobilização da sociedade civil é crescente. A Cese tem acompanhado a evolução dessas organizações, ajudando-as na definição e avaliação de seus objetivos, planejamento e gestão", afirma a diretora.
Um exemplo de "semente que germinou" foi o da Associação de Pequenos Agricultores do Estado da Bahia (Apaeb). "A Apaeb nasceu muito pequena, conquistou sua autonomia e hoje é auto-sustentável", diz Eliana. Desde a década de 80, a Cese acompanha a Associação, que oferece orientação técnica e capacitação para pequenos agricultores de 15 municípios baianos, na produção e comercialização de sisal, pele e leite de cabra, entre outros. "A Cese tem sido uma parceira-irmã ao longo desses anos, promovendo reflexões e intercâmbio entre os agricultores", diz Ismael Ferreira, diretor-executivo da Apaeb.
Novas sementesCom o propósito de intensificar a articulação entre grupos da sociedade civil com preocupações similares, a Cese iniciou, recentemente, um programa de apoio a redes, do qual já participam dez projetos inovadores. "Nós acreditamos muito no potencial de articulação das redes no papel de interferência nas políticas públicas", diz a diretora. Além das redes, a Cese está atenta, também, ao crescimento da organização e articulação de outros segmentos, como as populações tradicionais (indígenas, quilombolas, extrativistas, pescadores etc.), as que vivem nas ruas (como catadores de materiais recicláveis) e jovens líderes. São novas sementes que - com a água, o sol e o arado da Cese - começam a germinar.
Mariana Loiola
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