Autor original: Maria Eduarda Mattar
Seção original: Notícias exclusivas para a Rets
A agricultura familiar tem entre suas características mais elementares o uso de meios mais puros, menos tóxicos, na atividade agrícola e a utilização racional dos recursos, fazendo a reprodução das sementes a partir das próprias safras. Esses dois pilares, nos últimos anos, sofreram um golpe perigoso: a introdução de sementes geneticamente modificadas, os transgênicos, entre os agricultores.
Na maioria das vezes, os trabalhadores rurais recebem ofertas irrecusáveis de maior produtividade com custos menores, se usarem as sementes transgênicas. No entanto, o que muitos não sabem é que estes custos são menores apenas momentaneamente, pois, ao invés de poderem plantar suas próprias sementes, são obrigados a comprar mais da empresa vendedora. Isso porque os grãos são geneticamente modificados de modo a germinarem em um único plantio.
Ainda, além de provocar a cultura de sementes não puras – ao contrário do que seria a praxe na agricultura familiar –, têm uma prática de venda condenada pela maioria dos órgãos que avaliam as regras de comércio: a venda casada – as sementes que comercializam só são sensíveis aos seus próprios fertilizantes. Ou seja, para que o plantio tenha efeito, a pessoa tem que comprar a semente e o fertilizante da mesma empresa. A conseqüência mais direta é o aumento dos custos da produção agrícola. Logo, os agricultores que acreditavam que economizariam com essas sementes novas acabam gastando mais.
Além disso, justamente por terem de usar agrotóxicos específicos, que não se aplicam a outras sementes, os agricultores também acabam sendo induzidos a cultivar somente aquele grão específico, ou seja, a prática da monocultura – o que, também, degrada o solo. “Para valer a pena e para não comprometer outras sementes, os agricultores são obrigados a plantar somente aquele grão, e em larga escala. Mas, é sabido que a agricultura familiar ganha na diversificação e não na larga escala”, lembra Paulo Petersen, diretor executivo da Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA), que completa: “Os transgênicos trazem um problema muito sério de autonomia versus dependência”. Enfim, os transgênicos representam um conjunto de problemas por trás das promessas de prosperidade agrícola que revestem as primeiras boas safras.
Hilário Gottselig, secretário-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) esclarece que a posição dos movimentos de trabalhadores, especialmente da Contag, é e sempre foi contrária à utilização dos transgênicos. “A Contag tem uma posição definida contra a utilização dos OGMs.” Ele reconhece que, apesar dos esforços de conscientização, muitos agricultores aceitaram as ofertas tentadoras e utilizaram transgênicos. “Sabemos, por exemplo, que a safra de soja deste ano estava muito contaminada, chegando a níveis de 70% de contaminação, como no Rio Grande do Sul”, diz Gottselig.
Assim como a Contag, a AS-PTA é contra a utilização de OGMs na agricultura e, junto com diversas outras organizações, articula a campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos. A iniciativa tem obtido sucesso, já tendo lançado um guia sobre o tema e com ações junto aos poderes Legislativo e Executivo. No entanto, Petersen reconhece que a existência dos transgênicos entre os trabalhadores rurais é inegável, e lembra: "Se nós quisermos, ainda podemos salvar. Em outros países, na Europa, nos EUA, não se encontram mais sementes que não sejam transgênicas. Mas o Brasil ainda possui bastante, a Embrapa dispõe disso. Para mudar, é só querermos". Seu pensamento é compartilhado por Gottselig, que afirma: “Estamos na contramão da História. Em todos os lugares, as pessoas estão à procura de alimentos mais sadios, mais puros. E nós, ao contrário, estamos quase aceitando o uso dos transgênicos, indo por um caminho que não se sabe aonde vai dar”.
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