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Acompanhamento de perto

Autor original: Fausto Rêgo

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Durante um ano e meio, a Fundação Luterana de Diaconia (FLD) e a Associação do Voluntariado e da Solidariedade (Avesol), com o apoio da Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa (Capina), estarão acompanhando bem de perto o desenvolvimento de dez projetos de geração de emprego e renda. O objetivo é contribuir para o fortalecimento dessas iniciativas, ajudando a superar as naturais dificuldades dos primeiros passos e promovendo encontros para estimular a troca de experiências entre cada projeto. O primeiro deles foi realizado nos dias 21 e 22 de junho, em Porto Alegre (RS), oportunidade em que foram diagnosticados alguns dos problemas enfrentados por grupos que tentam formar cooperativas. Nesse sentido, uma das propostas do programa de acompanhamento é formar agentes multiplicadores e preparar um material de orientação e apoio.

Nesta entrevista, Ana Cristina Kirchheim, assessora programática da FLD, explica melhor como funciona o programa, comenta suas possibilidades e perspectivas e fala sobre a elaboração de um guia para compartilhar o conhecimento resultante dessa experiência com outras iniciativas. “A FLD e a Avesol não têm necessariamente o know-how de como superar todas as dificuldades. A intenção é justamente buscá-lo em conjunto e estimular as iniciativas a fazerem isso apoiando-se umas nas outras. Pretendemos trabalhar parcerias e formar uma rede que pode contribuir para as cooperativas passarem por cima dos seus problemas”, afirma.

Rets – Qual foi a origem desse programa: as cooperativas procuraram vocês ou a fundação identificou essa possível demanda?

Ana Cristina Kirchheim – São duas as organizações que estão iniciando este projeto: a Fundação Luterana de Diaconia (FLD) e a Associação do Voluntariado e da Sociedade (Avesol). Ambas têm uma linha de atuação voltada para o apoio a projetos comunitários de geração de emprego e renda. As maiores dificuldades que elas têm não são nem tanto de recursos. Elas produzem bem, trabalham bem, têm boas idéias. Mas enfrentam problemas de gerenciamento, não sabem como montar preço dos seus produtos ou como colocá-los para sempre comercializados. Outra grande dificuldade é fazer a divulgação, a apresentação dos produtos. Assim, a FLD e a Avesol propuseram a algumas iniciativas esse programa, para ajudá-las a se fortalecer e a melhorar o gerenciamento de suas atividades.

Rets – Quais projetos estão participando do programa? Como será a dinâmica de acompanhamento dessas iniciativas?

Ana Cristina – Entre os grupos participantes estão o Mãos Unidas (padaria), Grife Morro da Cruz (confecção), Univens (confecção de camisetas), Cooperbom (confeitaria), Mãos Amigas (malharia), Alumifer (produção de panelas), Ecomorango (produção agroecológica) e Artesanato Marista Santa Isabel. Houve já um primeiro encontro com os participantes, que serviu como uma abertura e no qual fizemos um mapeamento das iniciativas, para fazermos a programação da dinâmica de acompanhamento. Acontecerão encontros em conjunto, unindo as cooperativas que atuem em áreas relacionadas. Por exemplo, as que tiverem mais a ver com agroecologia vão se unir e discutir as questões em conjunto. Temos duas confecções, duas grifes participando também. Elas vão compartilhar suas experiências uma com a outra, desde aspectos de contabilidade até formas de reaproveitar tecido.

Rets – Quais as principais dificuldades para quem decide formar uma cooperativa e como o programa vai ajudar a superá-las?

Ana Cristina – As dificuldades vão desde como fazer a contabilidade até dúvidas de legislação, passando por obstáculos na colocação dos produtos no mercado. A FLD e a Avesol não têm necessariamente o know-how de como superar todas as dificuldades. A intenção é justamente buscá-lo em conjunto e estimular as iniciativas a fazerem isso apoiando-se umas nas outras. Pretendemos trabalhar parcerias e formar uma rede que pode contribuir para as cooperativas passarem por cima dos problemas. Já temos parceria com a Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa (Capina), do Rio de Janeiro. Essa é uma das entidades que poderão ajudar trazendo conhecimento e experiência para o projeto. Queremos multiplicar os agentes que podem ajudar no fortalecimento.

Rets – A partir do conhecimento das dificuldades, o que vai gerar, de fato, o fortalecimento das iniciativas?

Ana Cristina – É a troca, o fazer em conjunto. O encontro conjunto de soluções, a troca de experiências, é fundamental. Não apenas uma dizer à outra como solucionou determinado problema, mas ajudar, a partir dos caminhos já conhecidos, uma determinada iniciativa a encontrar ou construir o que precisa, a partir de suas necessidades e situação reais. Outra coisa que a Fundação Luterana de Diaconia e a Avesol vão fazer é trabalhar novos mercados, para as iniciativas crescerem. Isso é uma coisa que temos em mente. Em Porto Alegre, há feiras acontecendo, por iniciativa da Prefeitura, baseadas no conceito e no estímulo à economia solidária, que é o caso das cooperativas envolvidas no projeto. Inserir os grupos comunitários nessas feiras e em outros mercados é também muito importante para que possam se fortalecer institucionalmente.

Rets – Um dos problemas constatados no primeiro encontro realizado pelo programa foi o de que nem todos conseguem perceber que são donos do próprio negócio. De que forma se pode preparar o trabalhador para aceitar também os ônus, os deveres desse papel?

Ana Cristina – Muitas vezes, as pessoas têm boas idéias de produto, produzem bem, mas esquecem o resto. É preciso, antes de tudo, um estudo de viabilidade econômica da iniciativa. Além disso, como são iniciativas localizadas, se não tiverem apoio (e digo apoio me referindo não só a recursos financeiros ou a materiais, mas também apoio no sentido de força para continuarem), parcerias, articulação, fica difícil crescer. A lógica de trabalho de que todos devem estar envolvidos e à frente do processo não é totalmente compreendida. Além disso, esse tipo de iniciativa leva tempo para dar retorno financeiro, e as pessoas têm necessidades, precisam se manter. Assim, acabam saindo. Então, grupos iniciais de 30, 25 pessoas, acabam ficando com apenas cinco a dez indivíduos. Tudo isso foge à visão, na maioria das vezes. As pessoas deixam de entender o real significado da iniciativa.

Então, é fundamental o estudo de viabilidade – que leva em consideração o que vai ser feito, onde, com que recursos, como o produto poderá ser inserido no mercado etc. Ou seja, o planejamento é essencial. Os atores têm que ser, todos, protagonistas desde o início. Têm que se preparar bem, realizando encontros, cursos, discutindo o que querem e como devem fazer.

É importante ressaltar que eles devem fazer isso e entender a necessidade desse envolvimento completo. No caso do projeto que estamos iniciando, a FLD e a Avesol atuarão somente como facilitadoras, criando algumas pontes. Os protagonistas são os grupos.

Rets – O conhecimento gerado pelo programa será colocado à disposição de outras iniciativas semelhantes?

Ana Cristina – Os debates travados nos encontros dos grupos serão transformados em um guia que poderá ajudar iniciativas locais e comunitárias parecidas. Tudo será aproveitado na produção do material: a visita dos grupos aos locais de trabalho dos outros, as soluções encontradas para determinadas questões... Por exemplo: no estudo de viabilidade, o projeto deve fazer perguntas que deve ter condições de responder antes de ser posto em prática. Então, com o relato dos estudos produzidos pelas cooperativas participantes do projeto, outras que tenham problemas semelhantes poderão ter idéias de soluções ou saber modos que não dão certo. E isso é muito importante para iniciativas que, apesar de ricas em idéias e potencialidades, surgem em contextos de pobreza de todo tipo: financeira, de recursos materiais, pouca qualificação escolar, ausência de instalações apropriadas, poucas políticas e linhas de crédito direcionadas etc.

O guia deverá ficar pronto no ano que vem. Será difundido, inicialmente, entre os próprios grupos participantes e, posteriormente, para as iniciativas que se interessarem. Basta entrar em contato com a FLD [telefone (51) 3221-3433] ou com a Avesol [telefone (51) 3221-2318].


Maria Eduarda Mattar (colaborou Fausto Rêgo)

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