Autor original: Marcelo Medeiros
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Previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os Conselhos Tutelares têm como função zelar pelo cumprimento dos direitos dessa parcela da população. Treze anos depois da implementação do documento, eles ainda são pouco conhecidos pelos cidadãos, pela mídia e até por órgãos públicos. Pensando nesse problema, a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e a Secretaria Especial de Direitos Humanos lançaram em 10 de julho a campanha “Mídia e Conselhos: Aliança Estratégica na Prioridade Absoluta aos Direitos da Criança e do Adolescente”. Ela pretende dar mais visibilidade aos Conselhos Tutelares a partir de anúncios em jornais, rádios e canais de televisão e com capacitação de jornalistas e conselheiros de todo o país.
“Os Conselhos Tutelares são pouco conhecidos e têm mais contato com a população do que os demais conselhos. Para fazer nosso trabalho, utilizamos casos reais de pessoas que precisaram deles, mas nos focamos nos casos positivos”, diz Antônio Carlos Brito, um dos responsáveis pela produção das mensagens.
As peças publicitárias foram elaboradas por uma organização integrante da Rede Andi, a Rede Cipó, da qual Brito faz parte. São cinco spots de rádio, dois VTs e quatro anúncios impressos a serem veiculados em espaços cedidos por meios de comunicação. As versões radiofônicas e para impressão estão disponíveis na página da Andi. Em todas a intenção é mostrar que o conselho existe e esclarecer sua função.
Na pesquisa que fez para realizar as peças, Brito teve algumas surpresas. Visitou os conselhos de Salvador, onde vive, e percebeu a dedicação dos conselheiros. Em alguns casos, a relação chegava a ser pessoal. “As pessoas querem mais que serviços bem prestados. Esperam um bom atendimento, carinho. Vi situações que extrapolavam o lado burocrático e se aproximavam da amizade”, lembra. Há também casos negativos, nos quais famílias brigam com conselheiros por causa de suas decisões.
Segundo ele, apesar de toda emoção envolvida, a maior reclamação dos conselheiros da capital baiana é o desconhecimento de seu trabalho. Não se sabe para que ele serve e ainda por cima há uma associação entre seu trabalho e a de antigos órgãos responsáveis por crianças e adolescentes. “Temos que descaracterizar o conselho como aparelho de polícia. Nele nem tudo se resolve, seu papel é encaminhar soluções”, esclarece. Além disso, realça a necessidade de fortalecer a articulação entre os órgãos públicos.
Oficinas
Esses problemas, segundo Luiz Guilherme Gomes, coordenador da Oficina de Imagens, outra organização da Rede Andi, podem ser resolvidos com melhoria do relacionamento entre conselheiros e mídia. “É importante eles entenderem que jornalistas não são bichos-papões e os jornalistas conhecerem esses novos órgãos e seus papéis”, diz ele. O ECA, em seu artigo 88, instrui os conselhos a mobilizarem a opinião pública para que os cidadãos participem dos diversos segmentos da sociedade.
A ONG que Gomes coordena foi encarregada de redigir um guia sobre a relação entre mídia e conselheiros. Para tanto, realizou sete oficinas de fevereiro a junho para discutir o ECA, cobertura dos meios de comunicação em relação a crianças e adolescentes e formas de produção da notícia. A primeira foi feita com especialistas no estatuto e representantes da mídia, que elaboraram um roteiro para a publicação. Nas demais - uma realizada em cada região, sendo duas no nordeste - conselheiros e jornalistas se reuniram para trocar experiências e dar sugestões de conteúdos ao guia. Serão 15 mil exemplares a serem distribuídos em dezembro na quarta conferência do Conanda.
“Essa campanha é extremamente necessária para chegarmos ao grande público. Não só pelo aspecto da mídia, como também pelo seu viés prático, de esclarecer a população sobre como chegar aos conselhos”, afirma Paulo Kons, presidente da Associação de Conselhos Tutelares de Santa Catarina, primeiro estado a instalar Conselhos Tutelares e de direito em todos os municípios.
Para Kons, a participação de comunicadores nas oficinas é essencial devido à forma com que eles passam mensagens sobre direitos das crianças e adolescentes em todo o país. “Apesar dos avanços sentidos nos últimos tempos, principalmente na mídia impressa, é possível perceber que não há compromisso com os direitos humanos nem com a modificação social”, diz.
Conselhos
Os Conselhos Tutelares são responsáveis pelo atendimento direto à população, solicitação de serviços à comunidade e fiscalização de entidades em políticas voltadas para crianças e adolescentes. Além disso, devem assessorar os poderes Executivo e Legislativo na elaboração de orçamentos e políticas públicas voltadas para essa parcela da população. Não têm, entretanto, poder jurídico – podem apenas encaminhar casos para órgãos responsáveis.
Eles são de responsabilidade municipal e, de acordo com o ECA, toda cidade deve ter ao menos um, a ser financiado pela prefeitura. Os municípios decidem quantos devem ser instalados segundo critérios como extensão territorial, tamanho da população e realidade infanto-juvenil. Segundo dados de 2001 do IBGE – os mais recentes disponíveis - 3011 cidades possuem conselhos, ou seja, 55% do total. “É um número ainda insuficiente. Outro problema são cidades grandes com poucas unidades ou mal distribuídas, como em Salvador, onde há mais de um conselho no mesmo prédio”, diz José Fernando da Silva, membro do Conanda. O órgão recomenda que para cada 200 mil habitantes haja uma unidade, a ser localizada de acordo com as regiões administrativas ou outros critérios de distribuição populacional. O objetivo é ter sempre um órgão próximo das pessoas para quando for necessário.
Os conselhos devem ser formados por cinco pessoas escolhidas na comunidade para mandatos de três anos. Os critérios de escolha também são de responsabilidade de lei municipal, mas o Conanda recomenda votação aberta para estimular o envolvimento da população.
Uma dificuldade encontrada por conselheiros é a falta de estrutura para trabalhar. Brito, da Cipó, relata a ausência de material encontrada em suas visitas a conselhos. “É tudo muito precário. Os equipamentos são velhos, quando existem”. Consciente disso, no evento de lançamento da campanha, em Brasília, a Secretaria Especial de Direitos Humanos anunciou a compra de cinco mil computadores para os Conselhos Tutelares melhorarem sua performance.
Mais eficientes, eles tendem a ser mais bem vistos pela população. “Sabendo do Conselho, as pessoas acabam conhecendo o Estatuto, o que é mais importante ainda”, resume José Fernando.
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