Você está aqui

Mobilização decisiva contra armas de fogo

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Artigos de opinião

Eduardo Capobianco*







Há no Brasil cinco milhões de armas de fogo legais registradas e três milhões ilegais. A Polícia Civil estima que somente os traficantes dos morros do Rio de Janeiro tenham cerca de 60 mil. Contraponto: segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), num universo de 60 países de distintas regiões, o Brasil é o que registra o segundo maior índice de mortes por agressão (27 por 100 mil habitantes), atrás apenas da Colômbia (60 por 100 mil), nação que está há 30 anos em guerra civil.

Além disso, segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM/Datasus) do Ministério da Saúde, há cerca de 19 mil homicídios por ano nas capitais brasileiras, a maioria praticada com armas de fogo. As estatísticas não deixam dúvidas: entre as numerosas ações necessárias para reduzir a violência no país está a adoção urgente de medidas eficazes para coibir o porte de armas, que deve ser permitido em casos muito especiais. Assim, espera-se que o Congresso Nacional referende em plenário o projeto contido no relatório do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, aprovado em 17 de julho pela Comissão Especial Mista do Porte de Armas e cujo conteúdo, condensando propostas de 51 projetos e também sugestões do Ministério da Justiça, parece muito adequado.

É mesmo necessário, conforme consta da matéria, proibir o porte de arma de fogo em todo o país, com exceção dos integrantes das Forças Armadas, órgãos policiais, órgãos federais de inteligência, guardas municipais dos municípios com mais de um milhão de habitantes, empresas de segurança, guardas penitenciárias e entidades esportivas que demandem uso de armas, bem como particulares em situações excepcionais, por período determinado, no caso de efetiva necessidade, como real ameaça de morte. Outra proposta positiva é o endurecimento da pena para o porte ilegal de arma. Atualmente, a lei prevê um a dois anos de detenção. Como é um crime considerado de menor gravidade, o acusado paga fiança e é solto. O projeto aumenta a pena para dois a quatro anos de detenção, em caso de armas de circulação em geral, e de três a seis, para as de uso restrito. Isto, automaticamente, também tornaria o crime inafiançável. Ou seja, o portador ilegal ficaria mesmo detido.

Da mesma forma, é sensato restringir a fabricação, comercialização e a importação de brinquedos e réplicas de armas de fogo, que estimulam precocemente a violência. A proposta também é acertada ao vetar a compra de armas aos menores de 25 anos, ao limitar à Polícia Federal a prerrogativa de autorizar o porte e ao aumentar as exigências para o registro de armas, incluindo a necessidade de comprovar idoneidade, ocupação lícita, comprovante de residência, atestado de capacidade técnica para manuseio e atestado de aptidão psicológica, requisitos a serem comprovados no ato da solicitação e também periodicamente.

Também é preciso refletir sobre uma questão essencial: o cidadão de bem que, numa atitude de medo e pretensa prevenção em meio à escalada da violência, acabe se armando para se defender e à sua família, nunca está devidamente preparado para atirar. Esta prática não faz parte de sua rotina, de seus valores, de sua cultura. Além disso, é sempre pego de surpresa pelo assaltante, que acaba roubando também a arma, que engrossa o mercado ilegal. As estatísticas demonstram com clareza que as tentativas de reação armada a assaltos terminam, em sua maioria, com a vítima ferida ou morta.

Com certeza, a aprovação do projeto resultante do relatório da Comissão Especial seria de grande importância para coibir o uso de armas de fogo e reduzir os índices da violência a elas relacionados. Porém, é necessário que se adotem medidas rígidas capazes de garantir o cumprimento da lei. De nada adiantará uma legislação correta do ponto de vista normalizador, se seu acatamento pela sociedade não for rigidamente fiscalizado. Hoje, embora menos rígida, já há lei que coíbe o porte ilegal de armas. Nem por isso deixam de circular no país armamentos de alto poder de destruição, desde pistolas automáticas até granadas e fuzis de uso restrito das Forças Armadas. Assim, é preciso rigor no policiamento.

Também não se deve nutrir a falsa expectativa de que a necessária restrição ao porte e uso de armas de fogo seja a solução para a criminalidade. A medida representaria o ataque a uma das causas, que se alinha a numerosas outras, como o conjunto dos problemas socioeconômicos e o inadequado funcionamento das polícias, do sistema penitenciário e do Judiciário, exigindo a implementação de políticas públicas que quebrem o círculo vicioso da violência.

*Eduardo Capobianco é presidente do Instituto São Paulo contra a Violência, responsável pela implantação do Disque Denúncia e outros projetos para redução da criminalidade.


Estatuto do Desarmamento - No dia 23 de julho, foi aprovado no Senado o Estatuto do Desarmamento, projeto de lei a que se refere Capobianco. Agora, a proposta será analisada na Câmara dos Deputados.






A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.

Theme by Danetsoft and Danang Probo Sayekti inspired by Maksimer