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Crianças e adolescentes nas ruas: trajetórias inevitáveis?

Autor original: Maria Eduarda Mattar

Seção original: Artigos de opinião

Irene Rizzini*

Recentemente, coordenei uma pesquisa que estudou e tomou como base as histórias de vida relatadas por 67 por crianças e adolescentes que se encontram nas ruas da cidade do Rio de Janeiro. Suas trajetórias estão interligadas ao atual momento histórico de rápidas transformações, de transições e reordenamento político-espacial do mundo. São os chamados “meninos e meninas de rua”, “street kids”, niños de la calle”, “enfants de la rue”.... denominação comum para um fenômeno que se tornou ampla e dolorosamente visível por volta dos anos 80, tendo custado as vidas de muitas crianças e jovens, que simplesmente lutavam para sobreviver.

A pesquisa deu origem ao livro Vida nas Ruas**, cujo texto – assim como o estudo - funda-se na preocupação com as vidas destas crianças e adolescentes. Visa a captar em suas palavras e em suas formas de expressão, os sentidos que eles dão ao seu destino e aos caminhos que antevêem para si. Ao lançar um olhar sobre esse assunto, pretendemos subsidiar ações, antecedendo a criação de uma rede de organizações que articulasse suas iniciativas de atendimento à população infantil e juvenil em situação de rua na cidade do Rio de Janeiro, a Rede Rio-Criança.

As trajetórias que estudamos e discutimos representam as vidas de milhões de crianças e adolescentes no mundo. Seriam suas trajetórias de vida inevitáveis? Esta é a pergunta norteadora de nossa análise. Ressaltamos que, apesar de não existirem soluções simples a um problema tão interligado ao quadro de desigualdade sócio-econômica do Brasil, procuramos mostrar que as vidas das crianças e adolescentes que retratamos poderiam ter seguido outros cursos. E indagamos: O que fazer para garantir que estas crianças e adolescentes tenham chance de desenvolver seus potenciais? Como apoiar aqueles que estão à sua volta para que tenham condições para cuidar de forma adequada das crianças?

Com estas perguntas em mente, sugerimos alguns caminhos de reflexão e ação, que podem contribuir para avançarmos coletivamente na busca de alternativas. Entre eles, destacamos: (a) a importância de colocar a questão na pauta de prioridades da agenda política nacional com medidas claras que visem a ampliar as oportunidades para crianças e jovens em comunidades de baixa renda; ao mesmo tempo, mecanismos de apoio aos adultos que têm nas mãos a responsabilidade de zelar pelas crianças e adolescentes devem ser estipulados, criando-se as condições necessárias para sua implantação; (b) Participação efetiva na busca de soluções, envolvendo e escutando os vários atores na identificação e priorização dos problemas e na busca de soluções; (c) Uso da pesquisa e da experiência acumuladas para subsidiar a ação, não subestimando o que já se sabe e levando em consideração toda a experiência acumulada historicamente no país para decidir como enfrentar os problemas considerados prioritários; (d) Formulação e implementação de políticas e práticas com base em pesquisa aplicada, envolvendo a participação de múltiplos agentes, o que amplia em muito a possibilidade de formulação e implementação de políticas e práticas que efetivamente respondam aos problemas identificados.

Sejam quais forem as perguntas e que formas se escolha para respondê-las, não há como fugir da necessidade de estabelecer as diretrizes de uma política ampla que promova o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.

*Irene Rizzini é professora do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio e diretora do Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (Ciespi).

**O livro Vida nas Ruas foi lançado em outubro e contou com o apoio da fundação suíça Terre des Hommes para sua concretização.






A Rets não se responsabiliza pelos conceitos e opiniões emitidos nos artigos assinados.

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